dalton rosado
Série AS DETURPAÇÕES CONCEITUAIS E SEMÂNTICAS / parte b
É evidente que, quando tivermos alcançado uma forma de relação social que não seja escravista e segregacionista como a ordem capitalista (tanto nos seus modos ditatorial, liberal e social-democrata, quanto na versão capitalista de estado, muitas vezes confundida com socialismo ou comunismo), teremos uma ordem jurídico-constitucional que lhe seja consentânea.
Quando evoluirmos para uma ordem jurídico-constitucional popular e estruturada a partir da base, com modo de produção social voltado para a satisfação das necessidades de consumo coletivas e não para o objeto utilitário do lucro capitalista via produção e venda de mercadorias, cada manifestação de vontade (ainda que eventualmente errada) será de inteira responsabilidade de quem a formulou, e não do representante político que fica distante de quem lhe deu a outorga procuratória representativa.
Foi Karl Marx quem disse, corretamente, que é o modo de produção social que define o caráter da sociedade; bem como que a forma jurídica sempre obedece à forma social de produção.
Sobre a educação – A União Europeia, culta e sem analfabetos, padece hoje sob o desemprego estrutural causado pelo êxodo de suas empresas em busca de trabalho abstrato barato em outros países como forma de fazer face à concorrência de mercado.
Por conta do desemprego estrutural e da falência estatal, vê-se obrigada a emitir moeda sem lastro numa proporção incompatível mesmo para uma moeda forte como o euro. Isto está fazendo as taxas de inflação subirem tanto quanto as temperaturas impactadas pelo aquecimento global, num processo retroalimentado de causa e efeito.
São fenômenos econômicos e ecológicos próprios às contradições de uma lógica de relação social que atingiu o seu limite interno e externo de sociabilidade e se inviabiliza cada vez mais, tornando imperativa a adoção de um novo modelo de sociabilidade.
Neste particular o eficiente sistema educacional conservador europeu não consegue resolver os problemas surgidos justamente porque ensina que os pressupostos causadores da ruína de seu modo de relação social estão corretos quando, na verdade, caducaram e têm de ser alterados.
Não estou querendo dizer aqui que a educação básica, aquela que ensina a ler e escrever, bem como os saberes da matemática, da física, da geografia, dos idiomas, etc., sejam inúteis, para o desenvolvimento humano.
Contudo, uma parte da grade curricular da educação capitalista ensina que o modo de relação social vigente é virtuoso e eterno, embora não seja nem uma coisa, nem outra.
Ali se ensina, equivocadamente:
— que o trabalho, categoria capitalista (não confundir com atividade humana de produção), dignifica o homem quando, na verdade, o escraviza;
— que há como alcançarmos o equilíbrio econômico das finanças públicas e privadas quando, pelo contrário, estas concorrem para a geração de contradições insuperáveis, que conduzem ao colapso todo o conjunto econômico-financeiro sob o qual vivemos;
— que, nas ciências econômicas sob a forma-valor, há virtudes em comportamentos sociais que, ao invés disso, são absolutamente negativos (um claro exemplo disto é o conceito de que o mercado seria um instrumento autorregulador de lucros e custos de produção, quando o elogio a tal mecanismo social representa um desserviço à boa sociabilidade);
— que há virtude em se levar vantagem sobre os outros (conceito implicitamente contido na busca do lucro, em vez de sua criminalização), seja na competitividade fratricida, no direito ao gozo de privilégios em razão da competência, etc., etc., etc.
Não é a exclusão do sistema educacional ou sua deficiência que nos prejudica socialmente; a educação que endossa e reproduz pressupostos sociais negativos e que deve ser alterada profundamente.
Todos os políticos (e de todos os matizes) defendem a educação como modo de salvação social, mas omitem propositadamente que a educação que desejam ver ministrada com mais eficiência é a mesma que promove a deseducação.
A inversão dos conceitos curriculares equivocados não se dará, também, enquanto a educação for encarada como mercadoria, conforme defendem os liberais capitalistas; e nem mesmo sendo ela estatal e pública como está na (ainda que falaciosamente) na constituição burguesa, que é o pressuposto defendido pela esquerda institucional.
O que pode transformar a educação escravizadora do ser humano numa educação verdadeiramente virtuosa e libertadora será a dita cuja passar a contestar didaticamente a negatividade do modo de sociabilidade atual; e isto somente poderá ocorrer a partir de uma transformação do modo de relação social, com a superação da forma-valor (dinheiro e mercadorias).
O saber liberta, do mesmo modo que o saber pode ser instrumento da escravização social, ensinou o sábio educador Paulo Freire. (por Dalton Rosado – continua)
Hélio Rocha e o Dalton criaram esta versão de "In my life", dos Beatles
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AS DETURPAÇÕES CONCEITUAIS E SEMÂNTICAS:
Um comentário:
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Grande Dalton!
Seus textos deslindando as firulas do direito burguês e estes dois a respeito das deturpações conceituais e semânticas das palavras são um primor.
Daria um livro, um série de palestras ou um filme.
Imagine associar imagens e esquetes aos conceitos?
Talento não lhe falta!
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