quinta-feira, 9 de junho de 2022

SOB O CAPITALISMO, AS CONSTITUIÇÕES DE TODOS OS PAÍSES SÃO INJUSTAS – 1

dalton rosado
SOBRE A IMUTABILIDADE DA CONSTITUIÇÃO
Todas as leis refletem o pensar (ou o não querer pensar crítico) de uma conjuntura determinada no espaço e no tempo.  Tentam combinar a dominação do poder instituído com um determinado (e mutante) conceito social vigente de moral de justiça.

Há leis que num determinado momento são tidas como aceitáveis e noutros momentos não o são. 

Já houve no Brasil um período no qual a lei assegurava a propriedade de um ser humano por outro, caso dos negros trazidos sob correntes em navios negreiros e que já desembarcavam (quando não morriam no trajeto) nos portos brasileiros como mercadorias a serem vendidas.

Entretanto, apesar de segregados em sua maioria ainda hoje (basta um senso demográfico nas prisões para se ver a desproporcionalidade de presos negros e pardos em relação aos brancos), os brasileiros da etnia africana já não são hoje propriedade de ninguém, e não se admitiria a volta de tal instituto jurídico feudal. 

A mutabilidade sociojurídica das leis obedece, portanto, à mediação entre o poder dominante instituído e aquilo que o senso comum social começa a entender como algo a ser necessariamente modificado. 

Neste sentido, é nocivo o endeusamento que se faz da permanência e respeito à imutabilidade da constituição numa era social na qual se observa a decadência de um modelo de relação social que se torna obsoleto pela contradição dos seus fundamentos. 

O sentido último de manutenção de um status quo resultante da mediação social escravista desde antanho está corporificado na própria constituição federal (também conhecida como carta magna e obedecida como se fosse o graal da santidade). 

Ela é elaborada por uma assembleia constituinte eleita pelo processo de representação político-partidária como expressão da vontade popular manipulada num processo eleitoral dominado pelo poder político-econômico, principalmente vigente nas oligarquias no Brasil profundo, e socialmente segregacionista).   

A constituição de cada país reflete, portanto, a realidade da mediação social vigente ao momento no qual ela foi instituída. 

Uma dedução lógica é a de que na constituição de uma sociedade capitalista, de forma explícita ou implícita, prevalecem juridicamente os interesses do capital; então, sendo o capitalismo uma relação social injusta, a constituição nele inspirada é igualmente injusta na sua essência, e aqueles dispositivos legais nela insculpidos que contrariem tal interesse se tornam letras mortas (e não são poucos os que têm tal destino). 

Há quem considere que o princípio do direito romano, expresso no brocado a lei é dura mas é lei, é melhor possível para dar um regramento à vida social, sem considerar que a lei é algo mutável. Os dominantes gostariam que a vida social pudesse ser paralisada como numa fotografia. 

Mas, para a infelicidade deles, as relações sociais são dinâmicas e estão em permanentes mutações. 
Agora, como consequência do desenvolvimento acelerado das ciências aplicadas à vida social, a obsolescência dos diplomas constitucionais obedece à mesma dinâmica, pois não é a lei que formata a sociedade (como querem muitos elitistas conservadores), mas é a sociedade que formata as leis. 

As imperfeições constitucionais burguesas são flagrantes. 

Como se admitir, p. ex., que os magistrados que vão decidir sobre a constitucionalidade dos atos políticos sejam indicados e escolhidos por aqueles cujos atos vão estar sob seu crivo? É evidente que a identidade ideológica dos escolhidos e a pretendida gratidão pela indicação compromete a isenção jurisdicional que deve nortear a ação jurisdicional!  

Mas a vida econômica dá ordens não apenas para a vida política, mas também, para a inviabilidade de preceitos constitucionais incompatíveis com a dinâmica da saturação de um modelo social capitalista que agora atingiu o ponto de dissociação inconciliável entre forma e conteúdo. (por Dalton Rosado – continua neste post)

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