ruy castro
JOGOS NADA INOCENTES
Quando surgiram, nos anos 70, eu só conhecia o mundo letrado, racional e cartesiano em que nascera.
Nesse mundo, duas premissas levavam a uma conclusão e, mesmo que às vezes se bagunçasse a velha ordem do começo, meio e fim, só quem pensasse existia.
Os games pareciam dispensar a pessoa de pensar e, ainda assim, garantiam a sua existência. Era sedutor demais e não admira que muitos jovens se entregassem.
Como os jogos –perdão, games– existiam numa dimensão à parte, o mundo adulto não os via como ameaça. Afinal, que mal fazia um fliperama em que uma galinha atravessava a rua no meio do trânsito e o jogador tinha de fazê-la esgueirar-se entre os carros antes de ser achatada?
Mas os games perderam a inocência e, mesmo quando se tornaram incrivelmente violentos, tratando de invasões, confrontos e táticas de guerra, o mundo real não se tocou.
Segundo o sociólogo britânico Jamie Woodcock, talvez o primeiro a atentar para os games na política, a direita, mais afeita à cultura online, se apropriou deles para disseminar sua pregação, o que explica a súbita epidemia mundial de negacionismo, supremacismo e neonazismo.
Os games não são de direita, mas uma ativa facção de seus usuários, sim. E, nesse ponto, diz Woodcock, a direita está muito à frente da esquerda e dos liberais.
A torrente de fake news, disparos em massa e discursos de ódio são suas ferramentas, como bem sabemos no Brasil. Some-se agora a campanha suja contra o voto eletrônico.
Enquanto cochilamos, a direita conhece bem os botões a apertar. (por Ruy Castro)
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