sábado, 7 de maio de 2022

A MÃE QUE ESCOLHEMOS PARA HOMENAGEAR: ZUZU ANGEL.

apollo natali     
A ANGÉLICA DA PRAÇA DE MARÇO
"
Quem é essa mulher
que canta sempre este estribilho:
Só queria embalar meu filho
que mora na escuridão do mar?"
 (Chico Buarque)
Mais um março chegou e todo março que chega reaviva o de 1964, de opressivas lembranças.

Até Chico Buarque lançar a canção Angélica, poucos conheciam a história que a memória deste março traz à tona, da mãe brasileira que teve seu filho torturado e morto pela ditadura de 64 e seu corpo jogado no mar.

Em 1971, em pleno regime militar, o filho da estilista Zuzu Angel, Stuart Angel, militante do MR-8, já muito debilitado pelas torturas, foi amarrado à traseira de um jipe da Aeronáutica e arrastado com a boca colada ao cano de descarga do veículo. O corpo foi atirado no mar.

Zuzu Angel denunciou incansavelmente o assassinato e a ocultação do cadáver de Stuart. Invadiu tribunal militar e lá gritou valentemente sua revolta de mãe. Foi vítima fatal de um acidente automobilístico suspeito, em 1976.

Chico Buarque, amigo a quem ela escrevera carta levantando a possibilidade de ser também assassinada pelos militares, homenageou-a com Angélica, lançada em 1981, quando o Brasil começava a desmontar a engrenagem repressiva dos chamados anos de chumbo.

Quantas mães não puderam embalar seus filhos torturados e mortos pelos EUA e seus acumpliciados planeta afora? 

Tantas mães e filhos, tidos como obstáculos à marcha dos legionários estadunidenses e seus cúmplices a varrer democracias do mapa e barrar tentativas de reformas sociais em favor dos oprimidos. Em troca do quê? Unicamente de deixar suas empresas firmemente no comando pelo mundo e garantir lucros e remessas para o exterior.

Foi num março, o de 1964, que começou a fascistização implacável do Brasil. Fascismo, teu nome é autismo social, indiferença aos clamores e direitos populares, enfermidade a se espalhar ainda hoje no sangue da nação. Passado meio século, este março de 2015 nos adverte que nossa democracia se chama restos mortais da ditadura.

A par da indignação e espanto com as torturas e mortes que todo março nos traz à memória, há uma lição a ser revista em todos os marços vindouros: entender que, em sua semeadura universal de ditaduras brutais e corruptas –em troca tão somente do lucro das empresas estadunidenses–, assassinos e torturadores, com seus métodos não muito agradáveis, eram sempre bem-vindos nos países cujos governos eram subservientes aos EUA. 
Família despedaçada: Zuzu Angel com
os filhos Hildegard, Ana e Stuart.

E bem-vindos foram, p, ex., no Brasil. Encontraram aqui terra fértil ao plantio do fascismo e aplicados aprendizes da tortura.


Quantos marços passarão até se aprender que terroristas são eles e não alguns poucos milhares de combatentes da liberdade, que lutaram contra o arbítrio por um ideal de justiça e por solidariedade para com os explorados e oprimidos –entre os quais Stuart Angel?

Todo março é mês de se lembrar que em El Salvador e na Guatemala, não houve apenas matança comum. O principal componente lá foi a tortura brutal e sádica, batendo bebês contra pedras, pendurando mulheres pelos pés com os seios cortados e pele do rosto escalpelada, para sangrarem até a morte, ou cortando cabeças e colocando-as em estacas.

Quantos marços vão chegar até se aprender que o objetivo dos EUA, com suas carnificinas, foi sempre o de esmagar qualquer verdadeira democracia e sufocar o mais leve suspiro de liberdade, em troca de alguns trocados que nem chegam a beneficiar a sua própria população pobre e oprimida?

Mães brasileiras não fizeram panelaços nas Praças de Março por seus filhos assassinados, como fizeram as mães argentinas na Plaza de Mayo 

Na ditadura brasileira houve torturas e mortes mais estripadoras do que no caso de Stuart Angel. Mas nenhuma outra mãe Zuzu gritou como ela, onde e por quê.

As Zuzus do mundo queriam apenas embalar seus filhos e tirá-los da escuridão do mar.

Como as próprias mães estadunidenses, que tiveram seus filhos mortos em guerras longínquas por pão e banana. 
(por Apollo Natali, companheiro, amigo, grande jornalista e excepcional cronista, falecido em 29/07/2018, a quem
também homenageamos, ao republicar o primeiro
de quase uma centena de textos que
criou para este blog)

Um comentário:

Fausto Neves disse...

'Estados Unidos sabiam de todos os crimes'
Darío Pignotti, para o Página/12 11/07/2015
.....Em fevereiro de 1976, cinco anos depois do assassinato de Angel Jones, sua mãe, a famosa estilista Zuzú Angel, abordou pessoalmente o secretário de Estado Henry Kissinger, que havia viajado ao Brasil para reforçar as relações “preferenciais” com o ditador de então, Ernesto Geisel.....

17 Agosto 1971
https://documentosrevelados.com.br/wp-content/uploads/2013/08/carta-zuzu.jpg
21 Fevereiro 1976
https://www.zuzuangel.com.br//images/upload/5961ac15-615d-4083-8d59-3cddcd594904.jpg

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