SUPREMO USA SILVEIRA PARA INFORMAR QUE
BOLSONARISMO PETULANTE
DÁ CADEIA
Ao condenar Daniel Silveira, o Supremo Tribunal Federal fez um risco no chão. Demarcou a fronteira que separa a liberdade de expressão do crime.
"Está claro que o deputado não é um bom exemplo", disse à coluna um dos ministros da Corte. "Mas ele acabou servindo como um ótimo aviso."
Silveira foi usado pelo Supremo para informar aos seus semelhantes, inclusive ao presidente da República, que o bolsonarismo petulante, quando descamba para o ódio e passa a ameaçar a democracia, dá cadeia. O deputado recebeu quatro pauladas:
1. cana de oito anos e nove meses, em regime inicialmente fechado;
2. perda do mandato;
3. inelegibilidade, com o consequente sacrifício de sua candidatura ao Senado; e
4. multa estimada em cerca de R$ 192 mil.
Além de insultos e xingamentos, ardiam no caldeirão em que se formaram as culpas de Daniel Silveira:
1. ameaças de agressão física a ministros do Supremo;
2. incitação à invasão e ao fechamento do Congresso e da Suprema Corte; e
3. fabricação de animosidade entre as Forças Armadas e as instituições civis.
O aviso do Supremo foi extensivo ao Legislativo. O Conselho de Ética da Câmara já havia aprovado uma punição para Daniel Silveira: suspensão do mandato por seis meses. O castigo mixuruca depende do aval do plenário da Casa.
Cabe ao presidente da Câmara, o réu Arthur Lira, incluir a encrenca na pauta de votação. Mas Lira, movido à base de orçamento secreto e rendido às conveniências de Bolsonaro, mantém a parecer do Conselho de Ética na gaveta há nove meses.
Com sua decisão, os ministros do Supremo informaram a Lira e seus cúmplices que aqueles que dizem que alguma coisa não pode ser feita são geralmente surpreendidos por alguém fazendo a coisa. A cassação do mandato transformou em piada a ideia de premiar Silveira com uma folga hipertrofiada de seis meses.
Bolsonaro e seus devotos apostavam que o ministro André Mendonça pediria vista do processo, engavetando-o por tempo suficiente para que o réu chegasse até as urnas de outubro. Deu errado.
Além de não travar o julgamento, o terrivelmente evangélico Mendonça compôs a maioria de 10 votos favoráveis à condenação de Silveira. Ficou isolado na dosimetria da pena. Atribuiu culpa a Silveira apenas na imputação de estimular a violência ou grave ameaça contra autoridades para favorecimento próprio. Fixou a pena em 2 anos e 4 meses, em regime aberto.
Apenas o ministro Nunes Marques, descrito por Bolsonaro como 10% de mim dentro do Supremo, votou pela absolvição de Silveira. Considerou o comportamento e as declarações do deputado inaceitáveis. Mas sustentou que tudo não passou de ilações e conjecturas inverossímeis.
Nessa versão, Silveira teria pronunciado bravatas sem credibilidade. Coisas incapazes de intimidar quem quer que seja.
Carmen Lúcia ironizou o voto do colega. Disse que, se o Supremo aguardasse pela concretização das ameaças, o julgamento de Silveira não ocorreria, pois o deputado arguiu a suspeição de nove dos 11 ministros da Corte.
Para a defesa de Silveira, apenas André Mendonça e Nunes Marques teriam isenção para julgar o deputado. Se prevalecesse o entendimento de Nunes Marques, Silveira seria apenas um inofensivo neurótico que constrói castelos no ar. Ou um psicótico, que mora nos castelos de vento.
Para azar do bolsonarismo, a maioria do Supremo optou por se comportar como o psiquiatra, que cobra o aluguel do maluco.
A certa altura, o relator Alexandre de Moraes evocou um raciocínio de Albert Einstein:
"Duas coisas são infinitas: o universo e a estupidez humana. Mas, em relação ao universo, ainda não tenho certeza absoluta".
Por vias oblíquas, Moraes como que convidou o eleitor do Rio de Janeiro a refletir sobre as razões que levaram um pedação da sociedade fluminense a escolher a estupidez como sua representante na Câmara federal.
Daniel Silveira é um ex-PM. Passou seis anos na corporação. Nesse período, puxou 26 dias de xadrez. Colecionou 14 repreensões e duas advertências.
Um personagem assim podia ser enviado para muitos lugares, exceto para o Congresso. (por Josias de Souza)
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