terça-feira, 8 de março de 2022

É UMA GUERRA CAPITALISTA, COM CERTEZA!

dalton rosado
AS CONEXÕES DO CAPITAL GLOBALIZADO
Em 1917, Lênin e os bolcheviques tomaram o poder e terminaram com a participação na 1ª Guerra Mundial de uma Rússia que estava dilacerada diante da empáfia czarista e do prepotente ataque da Alemanha (que mesmo assim viria a ser derrotada).

Puderam, assim, determinar o encerramento intramuros de uma aventura desastrosa e garantir a sobrevivência da revolução marxista-leninista, mesmo diante da ferrenha oposição dos guardas brancos e antipatia dos países aliados capitalistas do ocidente.

Diante da penúria e da fome dos anos iniciais do pós-revolução russa, um Lenin já com a saúde debilitada implementou a Nova Política Econômica, que flexibilizava a exploração comercial capitalista privada em alguns setores como forma de sobrevivência do povo russo. Tratava-se, dizia, de uma concessão temporária ao capital (cuja continuidade sob Stalin ele não poderia prever).

A Rússia sobreviveu porque seus imensos territórios garantiam o sustento de seus povos, mesmo que de um modo rudimentar e rurícola, num mundo que ainda era distanciado territorialmente e no qual as comunicações internacionais estavam em estágios bem incipientes.
 
Com a adoção e aprofundamento de um capitalismo de Estado que terminou por descambar para a economia de mercado mundial (inevitavelmente, por força da lógica intrínseca de necessidade de expansão do capital, que precisa de velocidade e crescimento sem a qual não sobrevive), estes países estão, hoje, interconectados de modo irreversível enquanto prevalecer a lógica capitalista atual, que adotaram sem pestanejar.

Marx deve se contorcer no túmulo ao ver o que aconteceu em seu nome.    

Hoje tudo está profundamente diferente. O mundo, regido por uma lógica capitalista one world, tem tal grau de interdependência que a falência de um dos grandes pode representar o agravamento mundial da crise capitalista.

Com o abalo sísmico de 2008/2009, controlado com a emissão de moeda sem lastro, estava claro que em breve o remédio se mostraria ineficaz. Então, já em 2019, a crise do capital voltou a dar sinais claros de exaustão, agravada por dois fatores não previstos anteriormente: a crise ecológica causada pelo aquecimento global; e a pandemia do coronavírus, que obrigou as pessoas a permanecerem em casa e consumirem menos. 

O capital perdeu ainda mais a sua necessária velocidade; caminha para o cadafalso, e ameaça levar a todos nós para o buraco, caso não o superemos.

Este é o cenário sob o qual ocorre uma guerra imprudente, levada a cabo por um policial faixa preta de judô que, com sua compreensão precária da cena político-econômica mundial, caiu nos braços da China (sem perceber que vai terminar como um menino assustado correndo para o quarto dos pais, com paura de fantasma numa noite de ventos uivantes).

A China capitalista não quer saber de comunismo, satisfeitos que estão os seus oligarcas (iguaizinhos aos oligarcas russos) e os dirigentes do partido dito comunista. Então, já percebeu que pode tirar proveito dessa amizade à moda da neutralidade suíça, portando-se como um mediador que agrade ambos os lados. 
Não é por menos que retirou do ar na Rússia o seu sistema de comunicação por aplicativos Tik Tok e não condenou a invasão à Ucrânia (mas também não a aplaudiu), colocando-se em cima de um muro do tamanho da muralha chinesa. 

É claro que a China pretende consolidar uma hegemonia político-econômica global a partir do deslocamento do dólar dos EUA e do euro da UE como moedas dominantes do capitalismo mundial, para obter as vantagens próprias a quem detém força monetária emissora de uma moeda aceita no comércio internacional como meio de troca fiduciário acreditado como fidedigna representação do valor (mesmo que não o seja). Mas este jogo é duro, e vamos ter desdobramentos graves nos próximos anos.  

Estabelece-se, portanto, com esta guerra da Ucrânia, uma tentativa de deslocamento do eixo de esfera de influência do capitalismo internacional combalido, e isto pode representar uma nova fase de tais relações.

Neste quadro, a esquerda institucional, vegetativamente democrático-burguesa, procura se aliar àqueles que julgam uns, e fingem outros, serem os herdeiros do precursor ideal humanista do comunismo (que desde o início foi falsificado). 

Não se dá conta de que tanto o ocidente capitalista como os capitalistas euroasiáticos travam uma luta encarniçada pela hegemonia político-econômica, tal qual um grupo de famintos desesperados disputa os poucos alimentos restantes. 

O problema é que a ultradireita nazifascista, avessa à socialdemocracia burguesa, tem seus pendores totalitários ao melhor estilo do policial lutador russo, e ficam todos constrangidos ao se verem lado a lado com os déspotas mundiais que dizem combater. Com Nicolás Maduro e Daniel Ortega ocorre o mesmo.

Tudo se passa no campo capitalista, tanto quanto:
— as bolhas financeiras que surgem como forma de dar vida ao capital desempregado, para em seguida esvaziarem tal qual uma bexiga de borracha furada por um alfinete, deixando os que delas participaram com as mãos vazias; 
— a inflação decorrente da emissão de moedas sem lastro na produção e venda de mercadorias que corrói o salários dos escravizados trabalhadores abstratos; 
— os recursos bancários carreados pelos rentistas de todo o mundo para pagamento de uma dívida pública cada vez maior e mais insolvável e que, num futuro próximo, provocará um abalo sísmico em todo o sistema bancário mundial;  
— a queda das bolsas de valores que fazem virar fumaça bilhões em segundos;
— uma emissão de gás carbônico baseada na produção de mercadorias e transporte a partir do combustível fóssil (muitos se vangloriam do lucro da Petrobrás em face do aumento da valor do petróleo, que anda em torno de U$ 140 o barril), causador principal do aquecimento global;
— o desemprego estrutural que provoca o desespero a uma grande parcela da população e que incita o aumento da criminalidade e do crime organizado, seja ele praticado por oligarcas governamentais e traficantes de drogas, ou mesmo por meninos pobres em seu aprendizado para o crime;  
— 
o racismo estrutural, da homofobia e da misoginia patriarcal;
— o empobrecimento cultural e apologia da má estética artística;
— as favelas de ruas esburacadas e sem infraestrutura urbana nas cidades cindidas entre bairros ricos e pobres, etc.
O capital é assassino. Uma vida social harmoniosa, na qual os indivíduos sociais se ajudem mutuamente e sejam responsáveis por seus erros e acertos na condução da via social, não degenera para a guerra. 

Todas as guerras havidas ao longo da história da humanidade sempre decorreram do desejo de dominação de uns sobre outros; esta que ora estarrece o mundo só trouxe o acréscimo de sua bestialidade vir sendo transmitida ao vivo por milhares de celulares, em tempo real. 

Uma morte presenciada nos mínimos e mais chocantes detalhes impacta mais do que uma estatística dando conta de que morreram alguns milhares de seres humanos. 

Não se enganem: parafraseando o  fado  nostálgico imortalizado por Amália Rodrigues, é uma guerra capitalista, com certeza/ é, com certeza, uma guerra capitalista!  

Ela apenas aprofunda a cisão entre blocos capitalistas que disputam a hegemonia geopolítica. Nela não há heróis e terá como consequência óbvia o agravamento da miséria mundial. 

Mas, quiçá conduza à formação de uma consciência social de superação do mal que está subjacente a tudo isto: a sociedade do capital. (por Dalton Rosado)
Já que a situação na Ucrânia está como o diabo (e o capitalismo)
gosta, esta é a composição do Dalton que cai bem no dia de hoje.

Nenhum comentário:

Related Posts with Thumbnails