terça-feira, 1 de fevereiro de 2022

OS MORTOS NAS ENCHENTES SÃO, ISTO SIM, VÍTIMAS DO CAPITALISMO ASSASSINO!

dalton rosado
A TRAGÉDIA HABITACIONAL (E FUNDIÁRIA) BRASILEIRA
O Brasil possui cerca de 24,57 habitante para cada km², o que lhe confere a condição de país com baixa densidade demográfica. 

Para se ter uma ideia do que isto representa, a União Europeia tem cerca de 32 hab/km² e os Estados Unidos, 33,22 hab/km².

Somos um país continente e com longas extensões de terras inabitadas. Entretanto, o nosso povo não tem terra para plantar e, principalmente, faltam-lhe terras para morar. 

Como se admitir que a população amazonense precise morar em palafitas, às margens dos rios e em casas-barcos que sobem e descem à medida que ocorrem as enchentes sazonais na Amazônia?

Jamais fizemos a reforma agrária, que, vale lembrar, é uma bandeira capitalista: a lógica do capital implica o aumento da produção de mercadorias e as terras improdutivas não contribuem para o aumento da arrecadação de impostos e do próprio capital. 

Mas o pensamento conservador elitista do Brasil tradicional jamais compreendeu esta questão, tanto que nem sequer fizemos a reforma agrária (a deposição de Jango se deveu, entre outros motivos, à sua disposição de a realizar) e fomos um dos últimos países das Américas a dar fim à escravidão. 

A abolição dos escravos negros era bandeira capitalista: propunha a escravismo pelo salário como alternativa ao feudalismo escravista direto das senzalas.
O povo ajudando bombeiros a socorrerem vítimas de deslizamento em Franco da Rocha, SP
Assim é que se formaram núcleos habitacionais nos morros do Rio de Janeiro, cujas terras, no final do século 19, eram desprovidas de valor econômico; não serviam para plantar num país com terras abundantes nas mãos dos senhores feudais, e nem para morar, numa época em que até os animais de cargas teriam dificuldades de escalar suas encostas íngremes e o abastecimento de água seria precário. 

Canções como "Lata d'água", de Candeias Jota Jr. (“Lata d’agua na cabeça, lá vai Maria, lá vai Maria, sobe o morro e não se cansa, pela mão leva a criança, lá vai Maria..”) bem demonstram qual era e ainda é a realidade de uma mulher negra, mãe e morando num barraco mal construído nos morros brasileiros. 

A verdade é que o povo brasileiro de baixa renda, em sua grande maioria, mora em casas toscas, com precárias infraestruturas urbanas (de água, luz, vias pavimentadas, transporte, escolas e postos de saúde); e os que estão abaixo da linha da pobreza (cerca de 67,7 milhões em todo o país, ou 32,1% da população brasileira) se veem obrigados a improvisar moradias nas áreas de risco. 
Inundação ameaçando piorar em Natividade, RJ

Todas as pessoas que morreram nas recentes enchentes de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Bahia são vítimas do capitalismo assassino, que agride o meio ambiente e provoca as mudanças climáticas das quais decorreram os recentes incêndios, nevascas intensas e ciclones no sul, meio-oeste e nordeste dos EUA, bem como os incêndios no centro-oeste e enchentes no nordeste e sudeste do Brasil. 

E é esse mesmo capitalismo que torna a mercadoria terra urbana e rural inacessível à maioria dos brasileiros. 

A questão habitacional no Brasil revela quão perversa é a cisão social existente nas cidades brasileiras, nas quais se observa uma colossal disparidade de qualidade habitacional entre os bairros elegantes e providos de infraestrutura urbana e os bairros com ruas esburacadas e mal iluminadas, com casas construídas em terrenos acidentados e sem critérios urbanísticos de construções, não tendo sido projetados de modo a proporcionar segurança contra enchentes. 

A terra urbana é proibitivamente cara para a média salarial brasileira, e isto para quem ainda está empregado. Como temos uma das mais altas taxas de desemprego dos países em desenvolvimento, já se pode imaginar o porquê de tenta gente morando em áreas de risco de desabamentos e inundações quando vem a temporada de chuvas, que hoje estão cada vez mais intensas em breves períodos ou fracas e ausentes por longos tempos.
Machacalis, MG, foi um município fortemente atingido pelas águas de dezembro
Sofre-se com as enchentes; lamenta-se a redução de volume dos reservatórios num país no qual a energia hidráulica é fundamental; e tornam-se improdutivas as áreas degradadas pelas secas. Enquanto isso, segue o baile macabro da hipocrisia política...

Mas não é somente a terra que é proibitivamente cara para os trabalhadores assalariados; mais cara ainda é a construção confortável de uma casa e a infraestrutura ao seu redor. Calcula-se que o valor da terra urbana popular é apenas 20% do custo de uma habitação. 

Ora, se o trabalhador assalariado não pode comprar um lote de terra, mesmo pequeno, mas situado em área segura, e considerando que tal custo habitacional é de apenas 20% do total, como poderá adquirir uma casa construída com as condições de habitabilidade necessárias? 

Agora com a alta dos juros e da inflação, os programas de financiamentos habitacionais populares de longo prazo estão inviabilizados, ou seja, a cada dia que se passa a coisa piora, principalmente com um governo desvairado como  o que temos.  
Itabuna, BA:  quadro desolador com as chuvas de 2022
Não é difícil entendermos por que são os pobres e suas construções precárias são soterrados nos deslizamentos dos morros: trata-se de um retrato sem retoques da exclusão social étnica histórica. 

O poder público é elitista e seletivo quando às construções de infraestrutura urbanística de sua alçada na periferia das cidades. Os bairros ricos recebem tratamento vip, enquanto os bairros pobres são tratados a pontapés, com negligência amiúde assassina. 

O traçado urbanístico das cidades denuncia a cisão social existente, resultante da ordem segregacionista e desumana à qual estamos submetidos, e que é a responsável final por todas as vítimas que acabam de ser soterradas em São Paulo, a meca do capitalismo nacional. 

Até quando??? (por Dalton Rosado)

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