josias de souza
NEGAR ABSORVENTE A MULHERES POBRES
FAZ DA PERVERSIDADE UMA POLÍTICA PÚBLICA
Durante o governo Bolsonaro, uma das principais atribuições do jornalismo é a de retratar a estupidez humana, convertendo notícia em testemunho da insensatez. É preciso imprimir na história todos os vestígios de desinformação e crueldade.
Há no trono de presidente um personagem capaz de vetar artigos de um projeto de lei que asseguravam a distribuição gratuita de absorventes para meninas pobres de escolas públicas, mulheres em situação de rua e presidiárias.
Pense só nisso por um instante. Esqueça todo o resto –o negacionismo da gripezinha, as rachadinhas, o orçamento secreto do centrão, os dólares do Posto Ipiranga no paraíso fiscal... Esqueça tudo isso.
Concentre-se no seguinte: em pleno século 21, há no Brasil algo como 6 milhões de adolescentes e mulheres que, sem dinheiro para o absorvente, são constrangidas a lidar com o sangramento menstrual na base do improviso. Usam de jornal velho a miolo de pão. E o presidente elevou o absurdo ao estágio de escárnio.
Sustenta que não foi indicada a fonte dos recursos. Lorota. O projeto anota que o dinheiro viria da rubrica orçamentária que banca a assistência primária no SUS e, no caso das detentas, do Fundo Penitenciário.
Nada que se equipare aos R$ 17 bilhões repassados secretamente à turma do centrão e seus assemelhados.
Nada que se assemelhe ao malabarismo fiscal que levou Bolsonaro a escorar o seu Auxílio Brasil na arrecadação inexistente de uma reforma do Imposto de renda pendente de apreciação no Senado.
Experimente colocar a decisão de sonegar absorventes a mulheres pobres nas suas circunstâncias. Imagine a discussão que antecedeu o veto. Não ocorreu a ninguém dizer a Bolsonaro quem sabe no absorvente a gente não mexe!.
Nenhuma voz se levantou para ponderar: Presidente, uma em cada quatro mulheres não tem R$ 15 por mês para lidar dignamente com o ciclo menstrual. Adolescentes perdem 45 dias de aula por ano.
O mais trágico não é a indignidade, mas a conversão da perversidade em política pública. A insensibilidade mostra que o principal déficit do governo é mental, não fiscal.
O grande déficit está localizado entre as orelhas do presidente da República. Não há alternativa senão derrubar o veto de Bolsonaro no Congresso.
(por Josias de Souza)
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