domingo, 15 de agosto de 2021

A VOLTA DOS QUE NÃO FORAM: O TALIBÃ RETOMA GOVERNO, EM NOVO FRACASSO MILITAR DOS EUA

Kabul, capital do Afeganistão, amanheceu tomada pelos combatentes do Talibã. 

Avançando país adentro no rastro da retirada de tropas dos EUA, ordenada por Trump e acelerada por Biden, a organização de extrema-direita não encontrou resistências para ocupar a cidade e colocar fim ao governo imposto pela Otan, tendo o presidente Ashraf Ghani fugido para o vizinho Ubezquistão. 

Encerra-se assim a mais longa guerra da história estadunidense, com 20 anos de combates e 170 mil mortes, das quais 2.300 foram de soldados dos EUA. A invasão foi a primeira resposta aos ataques terroristas às Torres Gêmeas em Nova York, fato acontecido a 11 de setembro de 2001.

Acreditava-se que Bin Laden, chefe da organização Al Quaeda e responsável por comandar o ataque, estaria refugiado no Afeganistão. Quando o Talibã negou-se a entregar o terrorista, Washington ganhou apoio para uma invasão ao país. Como se saberia mais tarde, o trabalho foi inútil, pois Osama estava, desde sempre, no vizinho Paquistão, à época aliado incondicional dos Estados Unidos. 

Na realidade, desde o começo, a atenção do então presidente Bush era com o Iraque e seus poços de petróleo. O árido e miserável Afeganistão serviu apenas para aplacar a fúria da opinião pública, insatisfeita por imaginar que o odiento regime de Kabul escondia o assassino em massa. 
Helicóptero dos EUA busca diplomatas em retirada de Kabul. Ecos de Saigon.
Não foi à toa, portanto, a continuidade do Talibã, entrincheirado nas inóspitas montanhas do país, enquanto os militares da Otan montavam guarda nas grandes cidades para propagandear ao mundo um Afeganistão moderno e laico. No entanto, a maior parte da população afegã estava nas zonas rurais e, para elas, pouco ou nada mudou com a presença dos EUA e seus aliados. 

Somadas a isso, as poucas incursões militares a estas regiões, por parte dos estadunidenses, eram sempre brutais, com ações de mercenários, execuções sumárias, torturas e todo tipo de atrocidade, a ponto de fazer a população local ter mais empatia pelos medievais jihadistas. O resultado não pode ser outro senão o crescente ódio da população à presença dos EUA e ao governo fantoche de Kabul. 

Deste modo, as fileiras talibãs foram crescendo, inclusive com aporte de homens e armamentos do exército afegão, o qual, ironicamente, era armado e treinado pelos EUA. 

Enquanto o Talibã crescia, a popularidade da guerra ia evaporando em um Estados Unidos arrasado pela crise econômica e que gastou, até o dia de hoje, cerca de 3 trilhões de dólares no conflito. Por isso, diante da força do grupo extremista e do desejo de retirada, o caminho foi tentar fazer negociações de paz entre os talibãs e o então governo instalado em Kabul.  
"Não havia nada de importante para ser assegurado"

No fim, contudo, ficou provado que o tal governo era o próprio EUA e o Talibã conseguiu, em semanas, dominar o país praticamente inteiro, entrando na capital com quase nenhuma resistência.

Poderíamos falar de um fracasso estadunidense? Em partes. O Afeganistão nunca foi de fato uma prioridade para o Império. Acabou sendo mais uma solução de marketing que se alongou demais e acabou virando uma armadilha. 

Começou enquanto uma forma de aplacar a opinião pública e logo virou um novelo intrinsecamente emaranhado. No fim, os EUA simplesmente jogam a toalha, deixando um rastro de destruição, mortes e dinheiro torrado. Podem até ter feito o Talibã mais forte, agora com um exército treinado e armamento mais moderno em mãos. 

Mas, quando olhamos o Iraque, podemos perceber este fracasso em perspectiva. Lá também os EUA não conseguiram estabelecer uma ocupação estável, tendo o próprio Estado Islâmico surgido no país. Mas, os poços de petróleo, os oleodutos, os portos e as rotas de comércio do óleo estão seguras por lá, com raras incursões rebeldes. Isto era o que, no fim, importava. 

O fracasso do Iraque, portanto, é relativo; o do Afeganistão meramente simbólico, pois não havia nada de economicamente importante para ser assegurado ali. (por David Emanuel Coelho)

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