A CPI da Pandemia encerrou ontem (5ª feira, 20) sua terceira semana de depoimentos. ouvindo novamente o general Eduardo Pazuello, o único dos quatro ministros da Saúde do Governo Bolsonaro sem nenhum envolvimento anterior com a medicina.
Fujão, o general da ativa deveria ter feito seu depoimento na mesma semana de seus antecessores Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich, e do seu sucessor Marcelo Queiroga; mas, alegando ter mantido contato com contaminados pela Covid, conseguiu ter sua oitiva remarcada.
Coincidência ou não, foi visto naquela mesma semana a interagir normalmente com ministros do governo, embora devesse estar em completo isolamento.
Já no depoimento, mostrou a cara completa do que é a presença militar no governo Bolsonaro. Inquirido sobre possíveis ordens presidenciais para fazer ou deixar de fazer algo, garantiu taxativamente nunca ter havido qualquer determinação desse tipo.
Confrontado com a ordem presidencial, dada de público, no sentido de que não comprasse a produzida pelo Instituto Butantan – a vacina do Dória, segundo Bolsonaro –, Pazuello sustentou que nunca houve tal ordem porque, vejam vocês, não foi oficialmente comunicada ao ministério ou a ele.
Ora, bastaria aqui a coincidência entre a fala pública de Bolsonaro e o imediato recuo do Ministério da Saúde nas tratativas em torno da Coronavac para provar a falsidade do discurso do general.
No entanto, houve mais: o próprio Bolsonaro, à época, dirigiu-se à casa do então ministro, que se recuperava da covid, e em transmissão ao vivo via internet lhe ordenou a suspensão da compra, ao que o general, amuado, aquiesceu com a fatídica frase um manda e o outro obedece.
Para Pazuello, isto não era uma ordem direta, mas sim coisa da internet. Ou seja, a rigor, para o ex-ministro, a verdade factual não é verdade factual. A realidade não é realidade. Suas ações não eram ações.
O espírito de seu depoimento foi este: negar o negacionismo. Confrontado com fatos, documentos e vídeos, ele simplesmente negava sua importância, negava o elo causal ou simplesmente tergiversava.
Com a empáfia de quem se julga intocável, zombava, ria, distorcia e repetia clichês militares. Chegou mesmo a considerar seu trabalho no ministério como missão cumprida. Qual missão, a de matar centenas de milhares de seres humanos? De modo algum parecia ter a exata noção do quão sério foi e é o desastre sanitário no Brasil.
Muitos querem distinguir Pazuello do Exército nacional, como se o general de três estrelas não representasse a média do oficialato daquela arma. Ele mesmo declarou, contudo, ser o resultado de 44 anos de formação militar, desde a 5ª série do primário.
Ora, não é possível desvincular o general do resto da corporação, ainda mais quando sabemos existir no governo Bolsonaro mais de 6 mil militares em diversos cargos, não contando os generais-ministros e as dezenas de coronéis, capitães e outras quinquilharias que tomaram de assalto o Ministério da Saúde durante a gestão Pazuello e que ajudaram a produzir o desastre sanitário da Covid.
A negação da verdade, o desdém pela vida e a capacidade de mentir são marcas registradas de uma força militar que até hoje chama o golpe de 1964 de revolução e que se recusa a admitir os crimes da ditadura.
O negacionismo histórico dos fardados – que queriam até mesmo revisar livros didáticos para reestabelecer a verdade sobre o regime militar– é a base para o negacionismo sanitário e jurídico de Pazuello. A mentira enquanto ferramenta do poder é o que formou gente igual ao ex-ministro.
Quando os militares de 1964 saíram impunes da ditadura, deixaram uma mensagem aos novos oficiais: todo crime será perdoado e escondido. E foi imbuído deste credo que Pazuello, Bolsonaro e os demais militares do governo cresceram. Daí o general, dublê de ministro da Saúde, ter ousado zombar e mentir na CPI. O próprio coração do negacionismo bolsonarista reside nisto.
A grande pergunta que resta é: estará Pazuello certo em confiar arrogantemente na sua impunidade ou, desta vez, vai ser feita justiça aos militares criminosos? Só o tempo da CPI dirá. (por David Emanuel Coelho)
Nenhum comentário:
Postar um comentário