domingo, 20 de dezembro de 2020

NÃO HÁ MOTIVO ALGUM PARA FESTAS NESTE DESGRAÇADO 2020, QUE JÁ VAI TARDE

marcelo leite
BRASIL TERÁ UM INFELIZ NATAL E UM PÉSSIMO 2021
Não é o que se possa desejar, e sim o que se deve constatar: nós, no Brasil, teremos um Natal infeliz e um péssimo Ano Novo. Com a chegada de 2021, o país roçará o limiar vergonhoso de 200 mil mortos por Covid.

Neste sábado (19), eram 186.205 os óbitos oficiais. Morreram mais brasileiros pelo coronavírus, em dez meses, do que morrem num ano inteiro por moléstias respiratórias. Em breve a Covid ultrapassará o câncer, segunda causa de morte no país.

Tamanha mortandade resulta da gripezinha de Jair Bolsonaro, Osmar Terra, Bia Kicis et caterva. Os responsáveis pelos óbitos em excesso têm nome e sobrenome. Não raro, o mesmo sobrenome.

A quadrilha de negacionistas locupletada em Brasília gosta de invocar a proporcionalidade pela população para dizer que nossa mortalidade covidiana é baixa. Com 88 óbitos por 100 mil habitantes, de fato nos saímos melhor que os 94/100 mil dos EUA e os pavorosos 115/100 mil do Peru ou os 112/100 mil da Itália.

A comparação correta, contudo, seria com quem fez a coisa certa. Nova Zelândia: 0,5/100 mil (isso mesmo, 25 mortes numa população de 4,9 milhões). Uruguai: 3. Alemanha: 30, e já partindo para lockdown.

A China, provável origem da pandemia, pisou na bola de início, mas reagiu como só as ditaduras conseguem —com restrições draconianas à liberdade individual. Embora não dê para confiar nos números de lá, a marca de 0,04/100 mil humilha qualquer candidato a autocrata abaixo do Equador.

Não há como se orgulhar por termos o terceiro maior número de casos no mundo, 7,2 milhões, atrás só dos EUA (17,2 milhões) e da Índia (10 milhões). 

Mas, de novo, pondo os números em proporção, a Copa da Infâmia coloca os estadunidenses no pódio: o país mais poderoso tem 4% da população do planeta e 23% das infecções pelo Sars-CoV-2.

O Brasil não faz feio no campeonato mórbido. Com menos de 3% da população mundial, ostentamos quase 10% dos casos de Covid. 

A diferença, claro, é que na terra dos corajosos e livres (metade deles desequilibrados o bastante para votar em Donald Trump) a vacinação já começou. Aqui, foi só sob muito aperto que o almoxarife-general do Ministério da Saúde cuspiu um plano meia-boca de imunização.

Se ele não der mais mostras de incompetência e subserviência, o que parece improvável diante do retrospecto, com sorte a vacinação começará em março. Mas não para todos os brasileiros: até julho de 2021, só estão garantidas doses para vacinar um terço da população.

Isso, decerto, se não houver mais percalços com o imunizante da AstraZeneca em que o governo Bolsonaro fez a única aposta de monta (100 milhões de doses até meados do ano). 

É verdade que, se o presidente não parar de lançar dúvida sobre as vacinas, pode não faltar produto —por falta de demanda, como diria o ministro Eduardo Pazuello.

Não há motivo algum para festas neste desgraçado 2020, que já vai tarde. Seria enorme imprudência realizá-las juntando mais de umas dez pessoas com quem já se está em contato.

Os brasileiros, porém, gostamos de nos arriscar. Nas ruas de São Paulo, veem-se cada vez mais pessoas caminhando sem máscaras, ou portando-as só sobre a boca, quando não apenas no queixo. Estão rindo do quê?

Talvez sejam paulistanos que já tiveram Covid. Talvez. Mas que direito têm eles de exibir os dentes ruins como troféus de uma imunidade duvidosa, de uma coragem besta, de uma indiferença agressiva com os outros?

Nenhum. Mas imitam o exemplo e o esgar do presidente da República. (por Marcelo Leite)

5 comentários:

Anônimo disse...

Esgar!
Tanto tempo que não leio essa palavra que diz tudo a respeito dos que ignoram Darwin. "É uma seleção natural", já dizia meu amigo Charles.
Mas, para quem não investiga o "primado ontológico do sentido do ser", todo castigo é pouco.

Martin.

Anônimo disse...

Hebert Oi Celso, tudo bem?!
Na cidade 021, as coisas estão mais ou menos assim:
https://www.youtube.com/watch?v=JABAiywrTY8

celsolungaretti disse...

Lamento, Hebert, mas numa música como essa eu não consigo entender patavina da letra. Tentei achar os versos no Google e não consegui. Gostaria de compreendê-loss, pois achei interessante ele ter recriado o sucesso do velho Elvis.

Um companheiro musicou uns versos que eu fiz sobre as batalhas de junho/2013 e ficou exatamente assim, com os instrumentos no mesmo plano do vocal. Resultado: não consigo entender aquilo que eu mesmo compus. Me lembrei do Beethoven.

Gostava muito do Macalé em fins dos '60 e início dos '70. Aquele compacto duplo com "Soluços" nós ouvíamos em nossa comunidade o tempo todo. Achávamos uma graça a censura não ter percebido que havia alusões ("uso lenços de papel/ eles se desfazem quando molham/ meus olhos ficam vermelhos, irritados/ eu ainda não comprei meus óculos escuros", etc.) a puxar fumo...

Anônimo disse...

Oi Celso!!!
A música é uma alusão, ao atual momento da A Pérola do Jardes ( de 1987 ),
da eternamente glamourizada, mas muitíssimo mal tratada cidade onde vivo.
Parte da letra no estilo mordaz de Jards: "Vamos a la playa,
pegar Conjuntivite, quem sabe uma Cistite, mas talvez uma Hepatite...",
se refere ao processo de degradação de cidade no fim da década de 80,
e que só veio a se acentuar na década seguinte.
Na década de 90 em diante, as perdas vem sendo significativas em todos
os aspectos, contando as recentes perdas daqueles que aqui residiam
e deixaram sua contribuição cultural.
Algumas delas vítimas do que é descrito como "gripezinha", ou "um bem,
que a natureza criou".
Que 2021 seja um ano de verdade!!

celsolungaretti disse...

Eu adorei os três meses e meio em que morei na Cidade Maravilhosa, em 1970. Achei um cantinho razoável, um dos quartos que uma senhora viúva alugava na casa dela, no Rio Comprido, com a vantagem de ficar praticamente invisível para a repressão (pois eu não tinha documentos de identidade críveis).

Ainda existiam os cariocas cordiais que ficavam lendo jornal em bares com mesas na calçada e puxavam papo com desconhecidos pelo simples prazer de papear, sem segundas intenções.

Certa vez machuquei o pé e tive de enfaixá-la. Pedestres com quem eu cruzava diziam frases carinhosas/brincalhonas, tipo "chutou a trave em vez da bola?".

Aí, num funesto 16 de abril, fui conhecer o outro lado da cidade (o DOI-Codi da Tijuca) e depois do Estado (a PE da Vila Militar).

Mas, nunca associei essas sucursais do inferno ao Rio. E fiquei muito decepcionado ao ver a decadência da Cinelândia, quando o Brizola governava. Estava matando uma memória que me era muito grata.


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