segunda-feira, 13 de janeiro de 2020

BOZO ANO 1: AS BASES DA RECUPERAÇÃO ECONÔMICA FORAM MESMO ASSENTADAS OU ESTAMOS SENDO ILUDIDOS? (final)

(continuação deste post)
OUTROS ASPECTOS ECONÔMICOS E ECOLÓGICOS – O Brasil dos últimos anos foi o paraíso dos rentistas nacionais e estrangeiros. 

Em que pese a redução da taxa que serve como referência para a venda de títulos da dívida pública brasileira, A Selic, que terminou 2018 fixada em 4,5% ao ano, os juros cobrados aos correntistas endividados são absurdamente extorsivos e proibitivos para a realidade nacional: 60% dos brasileiros têm uma renda média mensal de R$ 928,00 e os 40% restantes, de R$ 2.234,00.

Os lucros dos principais bancos aqui atuantes, como Santander, Itaú, Bradesco e Banco do Brasil, são escandalosos, chegando a R$ 21,5 bilhões somente no 2º  trimestre de 2019  período, vele destacar, de crescimento pífio do PIB. 

É uma condição que se repete com acréscimos no desgoverno do capitão Boçalnaro, o ignaro, mas que também ocorria em todos as administrações anteriores (inclusive os dos socialistas Lula e Dilma) 
Se considerarmos os demais trimestres, cuja toada foi a mesma, o lucro da agiotagem legalizada totalizará cerca de R$ 100 bilhões .

Tais números refletem e bem explicam o entrave da produção industrial, obrigada a submeter-se aos humores do capital financeiro internacional, pois o processo de monopolização impulsionado pelo golpe de 1964 tornou impossível a sobrevivência autônoma dos pequenos bancos privados e também dos entes financeiros de administrações estaduais e municipais.

Observe-se que nos Estados Unidos a concorrência bancária propiciada pela diversidade de estabelecimentos bancários de pequeno porte ajuda na queda dos juros bancários. A eterna subserviência brasileira incondicional aos EUA é na linha do faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço.  

A inflação brasileira, que vinha se mantendo baixa nos últimos anos, ficou acima da meta governamental em 2019, atingindo 4,51%; além disto, foi de cerca de 10% para os gêneros alimentícios, que têm maior peso para os assalariados de baixa renda. 

Isto se deveu, em grande parte, à redução do consumo e oferta de mercadorias para uma economia com baixa circulação de moeda em face da depressão econômica e quase deflação (que somente não ocorre pela vinculação com moedas estrangeiras e importação de mercadorias com base nessas moedas).

Vai daí que a taxa Selic teria de ser reduzida obrigatoriamente, como foi, sob pena de se tornar insustentável no longo prazo. 

Mas, os efeitos colaterais da nossa redução oficial da taxa de juros Selic não são uma dorzinha de cabeça episódica, até porque tudo em economia tem efeitos colaterais (para cada benefício corresponde a um malefício na outra ponta).

Com a redução das taxas de juros oficiais da Selic, o dólar estadunidense especulativo e outras moedas estrangeiras têm saído do Brasil, e isto representou em 2019 uma evasão de US$ 44,7 bilhões. A crescente redução das nossas reservas internacionais preocupa o governo, temeroso das consequências que poderão advir de eventuais mudanças de cenários externos, embora ainda tenhamos uma reserva cambial internacional confortável (pouco menos de US$ 370 bilhões).  

Esta foi a razão da vertiginosa alta da Bolsa de valores no Brasil, de vez que o capital especulativo nacional migrou para a compra de ações (sem levar em conta o valor patrimonial e a relação investimento e lucro em dividendos e bonificações) e, por força da lei da oferta e da procura, o índice Bovespa apresentou um expressivo ganho de 31,5% no ano, bem acima das rendas fixas ofertadas aos rentistas. 

Da mesma forma o dólar estadunidense subiu 6,9% em relação ao real, somente nos oito primeiros meses de 2019; e continuou subindo durante o restante do ano.

O que parece positivo aos olhos desavisados representam a certidão com firma reconhecida da nossa fragilidade quando a questão se refere a economia mundial e riqueza abstrata e, principalmente, quando analisamos a situação do povo brasileiro diante desse quadro macroeconômico. 

A conclusão óbvia é que não há motivos para otimismo econômico com relação a 2020, tanto que, mal começou o ano, já tivemos um resultado negativo para a produção industrial (setor secundário da produção de mercadorias) no final de 2019, dados que podem comprometer a projeção do PIB do presente ano.

Segundo o IBGE, a produção industrial brasileira caiu 1,2% em novembro, configurando o pior resultado para o mês de novembro desde 2015; e em dezembro não foi diferente.

Os dados, divulgados na última 5ª feira (9), interromperam uma sequência de três altas seguidas, em agosto, setembro e outubro, desfazendo a expectativa de que estava em curso uma recuperação, depois dos maus resultados nos meses anteriores. 

Com isto, a produção industrial acumula queda de 1,1% de janeiro a novembro; de 1,3% em 12 meses; e de 1,7% na comparação com novembro de 2018.

Mas não apenas na economia temos dados preocupantes. Os últimos resultados do Inpe, órgão oficial, registram que houve um aumento de 30% nas queimadas na região amazônica em 2019, com um total de 89.178 focos de incêndios detectados pelos satélites. 

O recorde de toda a série histórica foi registrado no mês de agosto, quando ocorreram cerca de 30 mil focos de incêndios. Os meses seguintes, embora com queda, são superiores aos números registrados no primeiro semestre, indicando uma tendência de alta. 

É que o desgoverno Boçalnaro promoveu um desmonte da política ambiental brasileira, único ponto positivo nas avaliações internacionais sobre o Brasil anteriores a 2019. Além de nada de positivo ser acrescentado, desmontou-se o que estava dando certo.

À seca no Rio Grande do Sul  e aos aguaceiros em São Paulo, Minas Gerais e Rio de janeiro, somam-se as tragédias ecológicas do exterior, como a destruição de grande parte da fauna australiana e de mansões na Califórnia. Mesmo assim, os energúmenos governantes continuam negando que haja aquecimento global, como se tal tragédia pudesse ser eclipsada por uma disputa ideológica fora de foco.

No balanço final, o que o governo tem afirmado como positivo é a reforma da Previdência Social, que reduziu direitos mas é apresentada como virtuosa (neste caso, a rima com falaciosa cai como uma luva...). 
Francamente, ser otimista diante de um quadro desses é passar recibo de desinformação ou desonestidade.

Devemos acreditar no futuro, mas sob outras premissas, bem diferentes, de produção e organização sociais. (por Dalton Rosado)

3 comentários:

Anônimo disse...

***
Oi Dalton,
Leio com interesse seus posts que são cheios de erudição e de ótimas informações sócio-econômicas, mas percebo um certo tom apocalíptico. Dando como certo o fim do reinado do capital.
Pois bem, não será tão fatídica a derrocada do capital e, por extensão, da exploração do homem pelo homem no que tem de ominoso.
Porém, há que se lembrar algo de bom já fez pela humanidade. Se hoje podemos sonhar com a superação das limitações materiais e, até, das morais dos povos deve-se, em grande parte, à pressão por eficiência e redução de custos que o mercado impôs, beneficiando até o anacrônico capitalismo estatal que, este sim, periclita.
***
No dia 28/07/2019 o The Economist publicou uma entrevista com um tal de Michel O1Sulivan com o seguinte título "Globalisation is dead and we need to invent a new world order" (A globalização está morta e nós precisamos uma nova ordem mundial), enfocando, principalmente, a morte do comércio mundial.
Entretanto, este jornal destaca apenas a visão ocidental e reflete, mesmo, é a queda da hegemonia americana no mundo, confrontada, e sucessivamente derrotada, pela China.
Pois é, o velho reino de Chin está colocando os gringos estadunidenses para escanteio em vários lugares do mundo.
Sem armas, mas dando empregos ao investir em países periféricos. Acredita que os chineses já estão com os dois pés no Iraque?
Um tal de Tyler Durden postou no site Zerohedge um interessante artigo sobre esta possibilidade ao escrever "Is Iraq About To Become A Chinese Client State?" (O Iraque está prestes a se tornar um estado cliente da China?).
O que salta aos olhos é que, enquanto o ocidente se debate em guerras, arrogância, militarismo, politicalha, corrupção e demagogia, os chineses estão entrando nos países asiáticos e na África levando empresas para construir e dar empregos nos setores de energia e infraestrutura.
Não por acaso, a gigante chinesa XCMG aportou aqui no Brasil, São Paulo, criando um banco para dar suporte aos futuros investimentos em infraestrutura no sofrido BR, conforme o artigo de Fernanda Guimarães publicado no Estado de São Paulo em 06/01/2020.
O que se observa, no momento, não é a derrocada do capitalismo em si, mas de Wall Street, Fed(e) e toda a gambiarra que eles montaram.
De outra sorte, o capital está servindo para a China expandir seu império por boa parte do globo levando, contudo, algo diversos dos estadunidenses.
Acresça-se a isso o fato de a população dos ditos países centrais está declinante e, segundo dizem por aí (pode ser feiquinius) já está abaixo da taxa de reposição, ou seja, as populações autóctones (da Europa, por exemplo) estarão indo para as cucuias em breve.
A França já é quase muçulmana...
***

Anônimo disse...

Caro, DR

Se os istêits já são um império em decadência (Rússia--->mísseis nucleares hipersônicos/China em 2025--->líder absoluta em tecnologia (5G, inteligência artificial etc.), que dirá o nosso querido Brazil, que voltou a ser parasitado por mais um (des)governo terraplanista das trevas.

Só nos resta o "sorry, periferia".

celsolungaretti disse...

Caro Leitor,

o capital estatal ou privado tem regras de desenvolvimento ditadas pela concorrência de mercado. A principal delas é que ganha a concorrência de mercado quem tem maior nível de produtividade aliada a baixos salários. O nível de produtividade corresponde, obviamente, a produzir mais em menor tempo de trabalho abstrato, que é a categoria definidora do valor das mercadorias.

A China tem aliado um bom nível de produtividade (graças à importação de tecnologia com a abertura para empresas multinacionais que lá se instalam em busca de competitividade graças aos salários baixíssimos, tanto é assim que a renda per capita chinesa (que tem altos níveis de concentração de renda) tem paridade com a nossa renda per capita. Observe-se que renda per capita é a divisão do PIB pela população sem levar em conta os desníveis de renda proporcionados pela concentração desta (na China a concentração de renda é elevada).

Outro fator a se levar em conta é o alto endividamento público e privado chinês (já chegando a quase 300% do PIB) que tem preocupado os credores ameaçados de calote, com alerta do FMI, acaso não se mantenham os níveis de crescimento da economia, que apesar de ainda serem altos, vêm decrescendo paulatinamente em razão do limite da capacidade de consumo mundial e processo de desaceleração da economia como um todo.

Assim tenho dito que o crescimento chinês é como rabo de cavalo, para baixo, e não significa pujança do capitalismo, mas justamente o contrário, uma queda na massa global de extração de mais-valia e de produção de valor.

A invasão chinesa de mercados com suas mercadorias e, agora, de produção de mercadorias em solo estrangeiro a partir de instalação de empresas com tecnologia e capital chinês sublocado, ambos ligados à globalização da produção e de créditos bancários, tenta suprir a iminente paralisia do crescimento do seu PIB, buscando a produção de mercadorias em solo estrangeiro de baixos salários para fazer face à guerra de mercado em momento de limite interno de expansão.

O que a China está fazendo, portanto, não é produto da ascensão capitalista, mas resultado do processo de dessubstancialização capitalista global que somente pode ser analisado dentro de uma perspectiva macroeconômica, sob pena de termos uma visão distorcida da realidade (algo assim como se analisar São Paulo somente se considerando o Morumbi, sem levar em conta Paraisópoles e adjacências do mesmo porte).

A globalização do capital é o último estágio de um processo de expansão que atinge o seu limite e passa a definhar para dar lugar a outro tipo de globalização futura (se tivermos juízo): a produção de bens de forma ecologicamente sustentável, com intercâmbio continental; sem a perspectiva da mensuração pelo valor; e sob outra forma de organização social.

O apocalipse é a falta de perspectiva de vida, e eu acredito na vida, mas sob outros pressupostos que defendo como viáveis, e que nos livre desse apocalipse verdadeiro em curso, seja do ponto de vista social e, principalmente, ecológico.

Desculpe se pareço excessivamente verborrágico (que você educadamente chama de erudito), mas essa não é a intenção. O que quero é usar as palavras no seu sentido mais preciso dentro daquilo que quero afirmar, e como forma de me tornar mais explícito quanto ao conteúdo sempre complexo dos temas que abordo (as palavras têm vida e significado precisos que nos ajudam a firmar os conceitos que queremos formular).

Grato pela participação e comentário contributivo para o debate.

Dalton Rosado

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