domingo, 1 de dezembro de 2019

JOSIAS DE SOUZA: "É O TINHOSO QUEM OCUPA A MENTE BALDIA DE BOLSONARO"

josias de souza
BOLSONARO EDITA ATO INSTITUCIONAL Nº 1: FOLHA NÃO!
As aparências não enganam: Quando você vê um presidente da República comportando-se de forma autoritária, provavelmente ele é autoritário. 

Desde que assumiu, o atual inquilino do Planalto tenta conciliar duas necessidades conflitantes: ser Jair Bolsonaro e manter a compostura exigida pelo cargo. 

Ao excluir a Folha de uma licitação governamental e incitar um boicote aos anunciantes do jornal, o presidente potencializou a impressão de que Bolsonaro e compostura são realmente coisas inconciliáveis. 

"Eu não quero ler a Folha mais. E ponto final. E nenhum ministro meu", disse Bolsonaro. "Recomendo a todo Brasil aqui que não compre o jornal Folha de S.Paulo. Até eles aprenderem que tem uma passagem bíblica, a João 8:32. A imprensa tem a obrigação de publicar a verdade. Só isso. E os anunciantes que anunciam na Folha também". 

Para Ayres Britto, ex-presidente do STF, o Planalto não realiza uma licitação, mas uma ilícita ação.
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Como leitor, Bolsonaro tem todo o direito de não gostar da Folha. Como consumidor, pode se abster de comprar o jornal. Como presidente, comete uma ilegalidade ao excluir um dos principais jornais do país de uma licitação pública para a aquisição de acesso digital ao noticiário de veículos de imprensa.

A decisão de Bolsonaro viola os "princípios constitucionais da impessoalidade, isonomia, motivação e moralidade", anotou o subprocurador-geral do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União, Lucas Furtado, em representação protocolada na última 6ª feira, 29. 

No trecho predileto de Bolsonaro, o Evangelho de João anota: "Conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará." O problema é que o capitão opera num mundo com duas verdades: a dele e a verdadeira. O defeito não está na liberdade de expressão da imprensa, mas na dificuldade do presidente de se exprimir. 

Bolsonaro chama a Folha de mentirosa e, na sequência, acusa Leonardo DiCaprio de financiar incêndios na selva amazônica.

Desmantela o aparato ambiental e confraterniza-se com desmatadores. Depois, diz que o problema são as ONGs, os cientistas do Inpe e as doações feitas pelos governos da Noruega e da Alemanha. 

Na sua concepção de verdade, Bolsonaro considera-se um político avesso à corrupção e aos maus costumes. Na versão verdadeira, convive doce e fraternalmente com ministros indiciados, denunciados e até um condenado. 

O presidente bate bumbo pela transparência, mas esconde o amigo Fabrício Queiroz e as relações dele, que vão da assessoria tóxica ao primogênito Flávio aos vínculos com milicianos. 

Alardeia que Luciano Bivar, do PSL, está "queimado pra caramba" e não repara nas pesquisas que o colocam na frigideira. 

Não é que Bolsonaro não goste da imprensa. A questão é que ele só aprecia três tipos de imprensa: a que não tem nada a dizer, a que prefere não dizer e a que deseja dizer coisas deliciosamente favoráveis. 

A imprensa que tem o incômodo hábito de imprensar não serve. Por uma razão simples: ajusta as aparências de Bolsonaro à realidade em vez adaptar a realidade às aparências do Brasil ficcional que o capitão escolheu para governar. 
Além do versículo bíblico, Bolsonaro guia-se na presidência por um slogan: Brasil acima de tudo, Deus acima de todos. Nem acima, nem à direita. O desapreço de Bolsonaro pela liturgia democrática joga o Brasil para baixo.

A julgar pela aversão do presidente à imprensa livre, embora Deus esteja em toda parte, é o Tinhoso quem ocupa a mente baldia de Bolsonaro. 

A escassez de reações ao desatino presidencial revela que o capitão pratica suas exorbitâncias num cenário em que o absurdo vai adquirindo uma doce e persuasiva naturalidade. 

Pouca gente se deu conta. Mas Bolsonaro acaba de editar o seu Ato Institucional nº 1: Folha não!. Fez isso num instante em que o AI-5 escorre tanto de lábios aloprados como os de Eduardo Bolsonaro quanto de bocas improváveis como a de Paulo Guedes. 

Com honrosas exceções, políticos, autoridades e personalidades não fizeram a concessão de uma surpresa. Aos pouquinhos, o país vai suprimindo dos seus hábitos o ponto de exclamação. 

Se Bolsonaro servir, num banquete, mentira desossada, a maioria engolirá com gosto. É mentira? Pois que seja mentira! E com abóbora...

Quando vier a indigestão, será tarde. (por Josias de Souza)

Um comentário:

Anônimo disse...

Isso aí é briga de sacripantas.

Acorda, meu povo, nada de arroz e feijão, que sobrou somente arrocho e repressão...

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