sexta-feira, 15 de novembro de 2019

SOLUÇÃO FINAL (uma sátira política)

Paolo Guindaste atravessou correndo o corredor em direção à sala do presidente. Bateu à porta e nem aguardou a resposta, entrando ato contínuo. 

O presidente Bibo dormia profundamente no sofá, com o celular em cima do peito. Não acordou com a entrada do intruso e este precisou fazer um grande esforço para despertá-lo. 

— Presidente! Presidente! 

Lá pelo quinto grito, o presidente resolveu ouvir e abriu os olhos. 

— Pô, Guindaste, tô aqui tirando um ronco e você vem me encher o saco? Que que foi agora? Não se pode nem mais descansar, pô! Onze da madrugada e você aqui, pô!

— Desculpe, presidente, mas tenho uma notícia para solucionar nossos problemas! 

— Vão legalizar a milícia?

— Não, presidente, tô falando dos problemas do país! 

— Ah, isso aí não me interessa, Guindaste! 

— Mas precisa da sua autorização, presidente. Só assinar o documento...

— Me passa a porra aqui... ah, isso aqui! Vai demorar quanto tempo, pô?

— Em cinco meses vai estar tudo resolvido, presidente!

— Tá assinado aí, pô! Agora me deixa dormir, porra!

Guindaste pegou o documento assinado e saiu correndo de volta para a sua sala, tinha pressa de colocar o documento no Diário Oficial, edição extra. 

Não demorou muito para os celulares piscarem pelo país com as novidades do plano de Guindaste. A perplexidade foi tão grande que alguns juram ter sido possível ouvir em uníssono um grito de “ohhh” em todo lugar, até fora das fronteiras nacionais. 

Governo vai exterminar 100 milhões de pessoas em cinco meses, diziam as chamadas. No corpo da reportagem era esclarecido.
"Medida Provisória do governo, assinada esta tarde pelo presidente Atoaí Bibo, determina o extermínio de cem milhões de pessoas no prazo de cinco meses. O objetivo será economizar até R$ 1 trilhão em cinco anos e equilibrar as contas públicas. A MP não especifica como será feito o processo de extermínio, mas o ministro esclareceu que deverá começar pelos desempregados, criminosos e pessoas que atualmente estejam recebendo auxílio-doença. 
'Esse pessoal aí vai primeiro pro abate, porque atualmente não rendem nada ao país, só sugam! Então, precisamos começar a racionalização por aí. Eu conversei longamente com o presidente sobre isso e ele deu seu apoio completo ao projeto. Em breve vamos pensar em outros grupos da sociedade, pensando aí talvez em quem ganha até um salário mínimo'." 
Questionado sobre se isso não atrapalharia o mercado de trabalho, gerando baixa oferta de mão-de-obra, o ministro retrucou que atualmente existe um grave desequilíbrio. 

“Há mão-de-obra em excesso. Não precisamos de toda essa gente. A economia funciona bem só com metade disso tudo. Aí esse pessoal fica sobrando e acaba pressionando o Estado com serviços públicos, é desnecessário. Guerra seria o melhor, mas falei com o ministro do Exterior e ele disse que a invasão da Vuvuzela não vai pra frente. Então, é o melhor caminho é esse.” 

No Congresso, o presidente da Câmara, Ungido Mala, elogiou a proposta e disse que atualmente já teriam pelo menos 370 votos a favor do projeto. No Senado, as principais lideranças já se apressaram a colocar o máximo possível de ação para levar a cabo a proposta, considerada por eles como “essencial para destravar nossa economia”. 

Fontes ouvidas pela reportagem dizem que a preocupação de possível judicialização da medida fez agentes do governo sondarem o STF sobre o apoio a ela. Segundo estas fontes, a maioria do Supremo considera ser a medida constitucional e dizem não existir maiores problemas a ele. “No máximo, haveria problema sobre o meio para efetivar o extermínio. Precisa ser da forma mais indolor possível.”. A bolsa subiu após o anúncio da MP e o dólar caiu, em sinal de aceitação da medida pelo mercado.”

Na TV, analistas consideraram positiva medida, mas alguns viram exagero. Um comentarista da RedondoNews considerou exagerado o número de 100 milhões, “oitenta milhões já seria suficiente”, acrescentou ele ao final da sua fala.  
Outro concordou e fez ressalvas ao prazo estabelecido: “cinco meses é pouco provável. É um trabalho muito grande, precisaria de pelos menos um ano”.

“Mas aí, aumenta o custo do processo”, replicou o primeiro comentarista, “no caso do aperto financeiro que vivemos hoje, não dá pra ficar um ano operando isso”. 

Ainda debateram durante certo tempo sobre os prazos e no final não conseguiram concordar sobre isso. Apenas ficaram de acordo sobre a importância da medida e o quanto ela destravaria a economia. 

Já o líder da oposição repudiou a medida em post no twitter. “Esta medida é completamente absurda. Ao invés de dar emprego e renda ao povo, esse governo quer matar todo mundo.” 

Ele então gasta vária linhas falando de sua origem humilde e do que tinha feito no governo, para arrematar. “Matar esse tanto de gente deveria ser a última alternativa.”

Entre o povo a questão mais discutida era: “Mas, onde vão enterrar tanta gente?” (por David Emanuel de Souza Coelho)

Nenhum comentário:

Related Posts with Thumbnails