"O teto sem parede de sustentação cai. Temos de aprofundar as reformas que são as paredes"
(Paulo Guedes, que só constrói castelos no ar)
A relação social mediada pela forma-valor (dinheiro e mercadorias) tem caráter reificado, coisificado, fetichista, na qual coisas inanimadas (as mercadorias) ganham vida e passam a comandar as nossas próprias existências, orientando e determinando negativamente o modo de ser do conjunto da sociedade, que assim se torna esquizofrênica porque comandada por uma voz externa que lhe dá ordens.
Os mais perfeitos serviçais dessa lógica destrutiva são encontrados nas pessoas do capitão Boçalnaro, o ignaro, e do seu serviçal incumbido de impor aos brasileiros o pacote de maldades governamental, qual seja o ministro Paulo Guedes, por uns apelidado carinhosamente de posto Ipiranga, por outros zoado como uma tchutchuca com os ricos e tigrão com os pobres.
O mais grave dos horrores por que estamos passando é a maldade nos parecer lógica, inevitável e até meritória. Querem nos convencer de que, com a arma apontada para nossa cabeça, é melhor entregarmos a carteira ao assaltante, nem sequer cogitando em revidar à ameaça. Reduzem o dilema a uma escolha entre a cruz e a caldeirinha, como se não tivéssemos opção melhor.
Mas existem, sim, alternativas a tal domínio fetichista do capital em processo de limite interno de expansão. Só que não se consubstanciam em proposições imanentes à sua lógica, mas, pelo contrário, transcendem a dita cuja.
Ainda nesta semana me encontrei com um companheiro de antigas lutas, que permanece no Partido dos Trabalhadores e ora assessora um parlamentar petista. Ele me indagou sobre o que eu achava das últimas Propostas de Emendas à Constituição envidadas pelo governo do Bozo à apreciação parlamentar.
Antes de responder, quis saber o que ele entendia que deveria ser feito. Respondeu sem titubear, mostrando ter a mais absoluta certeza de que deveríamos lutar e pressionar os parlamentares para que as desaprovem por completo (proposta fadada ao fracasso, por absoluta impossibilidade de reprodução da cena bíblica de David contra Golias).
Contrapus que as contas públicas estão no vermelho e aumentando a cada ano graças à depressão econômica do capital internacional (que fustiga com intensidade ainda maior os países da periferia capitalista à qual estamos atrelados), então, perguntei, como o PT pensa em lidar com esse déficit?
Aí, finalmente, voltei à pergunta inicial por ele feita, dizendo que, no meu entender, a questão não é aprovar ou desaprovar as PEC's, mas sim superar a própria Constituição!
"Você está pensando como o Eduardo Bolsonaro, que quer rasgar a Constituição e instalar uma ditadura?" – foi sua réplica, desqualificação no lugar de argumento.
Respondi-lhe que a ditadura pretendida pelo clã Bolsonaro não quer apenas rasgar a Constituição atual, mas substituí-la por outra, de características absolutistas, como fizeram os governos militares que eles tanto elogiam (impunidade para assassinos e torturadores de presos indefesos inclusa).
Nós, os emancipacionistas, ao contrário, queremos uma ordem legal descentralizada na qual sejam garantidas as liberdades individuais e se estabeleçam modos de produção e organização sociais horizontalizadas, que possam superar comodamente os impasses sob os quais vivemos (impossíveis de serem solucionados a partir dos parâmetros capitalistas ora estabelecidos, travados que estão pela contradição insuperável entre forma e conteúdo desse modo de relação social).
Meu interlocutor, antevendo que a minha proposta incluía, implicitamente, a extinção não apenas do seu partido, como também de seu emprego de assessor parlamentar e do próprio mandato daquele a quem assessora, além do parlamento, das prefeituras e dos Estados membros que o seu partido administra, encerrou a conversa com um ar de quem me considerava um tanto fora de órbita.
Senti que cada vez mais estamos em campos verdadeiramente opostos.
O que está emprestando alguma credibilidade ao socialmente perverso Plano mais Brasil – a transformação do Estado do Paulo Guedes são as opções conservadoras ou reformistas que tomam os superficiais adversários políticos de direita e esquerda, irmanados em posições cosmeticamente diferenciadas mas sob um mesmo espectro imanente.
Estão ambos presos numa armadilha, tal qual as vítimas nos assaltos à mão armada: é melhor entregar tudo e preservar a vida (mesmo sendo uma sôfrega sobrevida?).
O que estamos vivendo no Brasil é a mais clara explicitação da afirmação que vimos fazendo ao longo desses anos todos de crescentes e estimulantes aumentos de acessos ao blog Náufrago da Utopia: as sociedades mercantis, a política e os políticos, sem soberania de vontade, são subordinados à vontade soberana do capital do qual tiram o seu sustento.
Eles não estão apenas entregando aquilo que prometeram aos seus incautos eleitores, mas ainda continuam tentando nos demonstrar que o nosso sacrifício é o melhor remédio para a superação da nossa miséria.
Algo assim como querer que um toxicômano, ao invés de superar o uso das drogas, compreenda que o uso da dita cuja é o único modo de aliviar o seu sofrimento pela abstinência.
Assim, a nós cabe a imensa tarefa de superar tanto ao senhor absolutista que nos dá ordens draconianas (o capital) como aos seus subordinados, a estrutura institucional político-econômica-jurídica que rege a manutenção de uma relação social em rumo falimentar. (por Dalton Rosado)
(continua neste post)
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