sábado, 1 de dezembro de 2018

PORQUE HOJE É SÁBADO, LOUVAREI O QUE BEM MERECE, DEIXANDO O RUIM DE LADO

As notícias sobre a montagem de um governo pré-iluminista no Brasil do século 21 me causam imenso desalento. Até quando veremos o presente em preto e branco e o futuro com a nuca? 

O presidente eleito quer nos levar de volta às trevas medievais. O que virá depois? Os bárbaros que rondavam o Império Romano e acabaram por destruí-lo? O homem das cavernas? Nosso passado de símios, que talvez aqueles que menos evoluíram desde então brevemente nos obriguem a negar em público?

Fico me indagando se não estaria certo Vinícius de Moraes, na sua superlativa poesia Dia da Criação. Principalmente neste trecho final, que ficou de fora do disco com o Dorival Caymmi (e que também corre o risco de ser incluído em algum extemporâneo index pela Inquisição Evangélica que se prenuncia): 
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"Mal procedeu o Senhor em não descansar durante os dois últimos dias
Trinta séculos lutou a humanidade pela semana inglesa
Descansasse o Senhor e simplesmente não existiríamos...

...Seria a indizível beleza e harmonia do plano verde das terras e das águas em núpcias
A paz e o poder maior das plantas e dos astros em colóquio
A pureza maior do instinto dos peixes, das aves e dos animais em cópula.
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Vinícius chegaria a recitar o poema inteiro
em 1977, num show no Canecão (vide aqui)
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Ao revés, precisamos ser lógicos, freqüentemente dogmáticos
Precisamos encarar o problema das colocações morais e estéticas
Ser sociais, cultivar hábitos, rir sem vontade e até praticar amor sem vontade
Tudo isso porque o Senhor cismou em não descansar no 6º dia e sim no 7º

E para não ficar com as vastas mãos abanando
Resolveu fazer o homem à sua imagem e semelhança
Possivelmente, isto é, muito provavelmente
Porque era sábado". 
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E é por hoje ser sábado e estarmos na contagem regressiva para o ano novo mais velho da nossa História, quando a civilização que penosamente vimos construindo nestes tristes trópicos começará a ser desconstruída pelos que nunca conseguiram compreendê-la nem alçar-se a ela, que vou seguir o conselho de outro de nossos grandes artistas. 
Gilberto Gil, num período igualmente sombrio, levantava nosso ânimo ao recomendar que louvássemos o que bem merece, deixando os palhaços sinistros de lado. Grande Gil!
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"Louvo a amizade do amigo
Que comigo há de morrer
Louvo a vida merecida
De quem morre pra viver
Louvo a luta repetida
Da vida pra não morrer

(...) Louvo a casa onde se mora
De junto da companheira
Louvo o jardim que se planta
Pra ver crescer a roseira
Louvo a canção que se canta
Pra chamar a primavera

Louvo quem canta e não canta
Porque não sabe cantar
Mas que cantará na certa
Quando enfim se apresentar
O dia certo e preciso
De toda a gente cantar"
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Sim, precisamos crer que os explorados ainda aprenderão a cantar, à medida que não estiverem mais sendo relegados ao abandono por uma esquerda que deles só queria os votos (depositados ou teclados em urnas que, mesmo sem fraudes eletrônicas, jamais lhes abrirão as portas do paraíso).

E há que se louvarem os esquerdistas que já despertaram de sua hibernação de décadas e começam a exigir o repúdio à atuação catastrófica recente e a retomada da luta sob perspectivas bem diferentes. São os que portam a esperança de futuro, os que poderão formar novas gerações de idealistas sem os vícios e a descaracterização responsáveis pelo fim de feira atual. 

Louvo os que estão decididos a se manterem íntegros e solidários durante a viagem pelo trem fantasma.

Louvo os jovens estudantes que se preparam para resistir às camisas-de-força de uma Escola sem Cérebro.

Louvo Lewis Hamilton, o negro que consegue ser gigante num esporte em que quase não há negros competindo. Ele acaba de se consagrar como o segundo maior piloto de F-1 em todos os tempos, com cinco títulos mundiais e 73 vitórias, atrás apenas de Michael Schumacher em ambos os quesitos. Dá nos racistas de hoje a mesma bofetada na cara que lhes aplicava o imortal Muhammad Ali.
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Veja a partir de 3'20": mesmo com seis jogadores do PSV
o rodeando, Messi conseguiu criar brecha para o chute (está 
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Louvo o argentino Lionel Messi, o maior craque do século 21, que continua personificando a arte no futebol e acrescentando novos gols à coleção de mais belos de todos os tempos, enquanto seus compatriotas são notícia mundial em função da selvageria de suas torcidas e os brasileiros cada vez mais trocam a grandeza do espetáculo pela obsessão liliputiana de conquistar taças a qualquer preço. 

Louvo, enfim, todos aqueles que preservam as melhores virtudes do ser humano em meio à escalada de desumanidade ora em curso. (por Celso Lungaretti)

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