terça-feira, 13 de novembro de 2018

CONHEÇA O FILME DE DESPEDIDA DE JOHN WAYNE, QUE ACABOU ANTECIPANDO AS CIRCUNSTÂNCIAS DE SUA MORTE...

Mesmo não simpatizando com o indivíduo Marion Robert Morrison nem vendo John Wayne (seu nome artístico) como um grande ator, considero excelente a sua fita de despedida, O último pistoleiro, de 1976, que tenho muita satisfação em incluir na relação dos filmes para ver no blogue.

Ele começou em 1926, com três papéis tão secundários que não lhe foram creditados, e foi fazendo sucessivas pontas até 1929, quando seu nome finalmente apareceu nos letreiros iniciais de Letra e Música (dirigido por James Tiling), uma comédia musical. Era sua 15ª atuação em Hollywood, tendo ficado incógnito nas 14 primeiras e também nas seis seguintes. 

Apesar de um início de carreira tão pouco promissor, a sorte lhe sorriu em 1930, quando, sem escala intermediária, passou de coadjuvante nem sequer mencionado a protagonista com nome em destaque nos cartazes, começando por um filme sobre caravana de pioneiros em território selvagem, A grande jornada (d. Raoul Walsh). 

A partir daí foi deslanchando sua carreira de meio século e 177 aparições nas telas, com ênfase nos bangue-bangues – ainda mais depois de interpretar Johnny Ringo no clássico de John Ford que praticamente definiu as características do gênero western: No tempo das diligências (1939).

Não fui com a cara dele desde as matinês do cine Aliança, pulgueiro de minha meninice no bairro da Mooca. Por nenhum motivo específico. Simplesmente preferia mocinhos mais caladões e feiosos, como o Randolph Scott. 
Wayne e James Stewart estavam chegando aos 70 anos
Só bem depois fui me dando conta de que motivos para eu não gostar dele existiam mesmo. Wayne era um reacionário empedernido, anticomunista histérico, símbolo das fantasias heroicas  sobre si mesmos em que os estadunidenses tanto querem acreditar e tanto esforçam-se para fazer com que acreditemos.

E foi responsável por um filme simplesmente repulsivo, Os boinas verdes (1968), criticadíssimo na época, peça de propaganda para tentar tornar simpática a guerra suja que os EUA travavam no Vietnã. Foi um empreendimento familiar, com seu filho mais velho produzindo e ele co-dirigindo, além de atuar como ator principal. 

Traíra por convicção, ficou contra seus colegas de Hollywood perseguidos pelo marcartismo. Então, quando Fred Zinneman realizou o mais digno western estadunidense de todos os tempos (Matar ou morrer, em 1952), fez questão de marcar posição contrária.

Filme-desabafo, com extraordinária atuação de Gary Cooper, Matar ou morrer mostra o estimado xerife Will Kane, prestes a entregar o cargo após a cerimônia de seu casamento, recebendo a notícia de que um bandidão fora libertado da prisão e vinha num trem para vingar-se dele, juntamente com três capangas que aguardavam sua chegada na estação.
Um adversário ilustre no duelo final: Richard Boone

O sentimento de dever obriga Kane a permanecer com a estrela e enfrentar o quarteto. Toda a cidade, sob os mais cínicos pretextos, o abandona à própria sorte. No final, desistindo de buscar auxílio, decide encarar a batalha sozinho. 

Vence e vai imediatamente embora com sua esposa, enojado, atirando a estrela no chão. Era como os artistas perseguidos pelo macartismo sentiam-se, num momento ídolos, no momento seguinte párias. 

Wayne, sem sequer a sinceridade de assumir sua discordância ideológica com os realizadores e atores de Matar ou morrer, questionou publicamente o detalhe de o mocinho não se comportar como o machão típico que se vira sozinho, dispensando ajuda. 

E, mais tarde, fez questão de destacar nas entrevistas que Onde termina o inferno (no qual atuou em 1959, sob a batuta de Howard Hawks) é que era fiel ao que se esperava de um mocinho em tais situações.

Feita esta longa ressalva, falta dizer que, de qualquer maneira, Wayne ajudou a consagrar filmes superlativos como Rastros de ódio (d. John Ford, 1956) e O homem que matou o facínora (d. John Ford, 1962). É justo lhe reconhecermos este mérito.
Um anti-Matar ou morrer? Menos...

E que chega a ser comovente ele, após difícil e vitoriosa luta contra um câncer de pulmão, ter personificado um lendário homem-da-lei canceroso neste O último pistoleiro, do grande diretor Don Siegel. 

Informado de que lhe resta pouco tempo de vida, resolve passá-lo na cidade onde foi consultar o médico (o saudoso James Stewart), hospedando-se na pensão de uma viúva (Lauren Bacall); acaba por se tornar um herói para o jovem filho dela, experimentando, pela primeira vez, a sensação da paternidade. 

Quando percebe que está nas últimas, desafia três bons atiradores a juntos enfrentarem-no num duelo mortal, na esperança de ter um final de vida mais condizente com a existência que levara, ao invés de amargar até o fim uma agonia de enfermo.

Por ironia do destino, em 1979 Wayne morreria como consequência de um tumor diferente, dessa vez no estômago. Estava com 72 anos.

Recentemente ele foi mostrado de forma muito negativa em Trumbo - lista negra (d. Jay Roach, 2015), como o ator fortão que quase agride o franzino roteirista Dalton Trumbo por estar distribuindo panfletos num evento de Hollywood.

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