Quando trabalhava na redação d'O Estado de S. Paulo, uma embarcação de turismo naufragou na Baía de Guanabara, matando 55 passageiros. Como eu era da editoria de Geral e pouca coisa de interessante acontecia no comecinho do ano, passei os primeiros dias de 1989 ocupando-me durante o expediente inteiro de um único assunto: preparar para publicação uma tonelada de notícias sobre a tragédia do Bateau Mouche. Foi dose cavalar, não aguentava mais. Peguei ojeriza eterna a tais acidentes.
Mas, por ter-me compadecido dos jogadores da Chapecoense e de um jornalista morto na queda do avião da Cucaracha Airlines, desta vez, excepcionalmente, andei passando os olhos pelo noticiário. Pelo que captei:
1) quem pilotava era um dos donos da companhia, o que dá uma boa ideia do gabarito da empresa;
2) tinha o combustível estritamente necessário, sem uma reserva para imprevistos;
3) um dos dirigentes do órgão que fiscaliza e autoriza voos na Bolívia é filho do falecido piloto;
4) uma funcionária boliviana estranhou o plano de voo não especificar um aeroporto para pouso de emergência, que é menção obrigatória, mas algum superior autorizou a viagem, jogando o regulamento no lixo;
LaMia é de Merida?! Tem letra sobrando.. |
5) o avião partiu de uma cidade diferente da especificada no plano de voo, isto foi percebido por autoridade colombiana, mas mesmo assim se permitiu sua entrada no país (e se fossem terroristas islâmicos com a missão de bombardearem o palácio presidencial?); e
6) o piloto, que já deixara de fazer uma parada para reabastecimento no aeroporto de Bogotá a fim de evitar uma despesa adicional de aproximadamente R$ 10 mil, refugou uma eternidade antes de comunicar à torre de controle que o combustível era insuficiente, por temer a multa pesada que lhe aplicariam e a suspensão de voos da empresa para a Colômbia até o caso ser analisado por uma comissão. Foi este o provável motivo de outro avião com problemas (existirá algum que não os tenha por lá?) haver ficado com a prioridade para pouso, retardando sua aterrissagem até que sofreu a pane seca.
Não sei por que, mas tenho a ligeira suspeita de que voos pague para entrar, reze para sair (como os da MamaMia!) ocorram amiúde nestes tristes trópicos; e de que controladores de voo iguais aos da Bolívia e Colômbia existam aos montes.
Enfim, aqueles tarados por adrenalina que praticam até roleta-russa, têm agora uma nova opção para satisfazer seu vício: embarcarem num avião-esquife desses.
Enfim, aqueles tarados por adrenalina que praticam até roleta-russa, têm agora uma nova opção para satisfazer seu vício: embarcarem num avião-esquife desses.
Se eu tivesse de escolher entre um e outra, preferiria a roleta-russa. A chance de sobrevivência é maior.
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