domingo, 6 de março de 2016

OLÍVIO DUTRA CONSTATA: O PT NÃO ESTÁ DIFERINDO EM NADA DAS TANTAS COISAS QUE CRITICAVA.

"O Estado não é propriedade privada de ninguém"
(trechos da entrevista que O Estado de S. Paulo publicou neste domingo, 
06/03, concedida pelo ex-governador gaúcho e ex-ministro das Cidades Olívio Dutra, ao repórter Luiz 
Maklouf Carvalho)

"A visão que marcou a criação do PT foi essa de que a coisa pública não é propriedade do governante, dos seus amigos, dos seus familiares, dos seus partidários. Essa visão não pode mudar assim, no bojo das situações e das circunstâncias. Isso é um ideário básico. Está nas razões da fundação do PT. São questões permanentes. 

"Um partido que nasceu para ser um contestador da política tradicional e fazer da política a construção do bem comum de repente está não sendo diferente de nada das tantas coisas que criticava, contra as quais nos colocávamos diametralmente opostos. O Estado não é propriedade privada ou pessoal de ninguém, nem do governante, nem dos grupos econômicos, nem da mídia. (...) Queríamos fazer a máquina do Estado funcionar com outra lógica.

"...o PT está envolvido num espaço de atuação em que perdeu a sua identidade e se misturou com a política mais tradicional. Quem mudou não foram os adversários. Nós é que mudamos –e, no meu entendimento, para pior. Há necessidade de resgatar essa discussão da política como a construção do bem comum.

"...O Lula não tem nada de ingênuo. É uma grande figura, de sensibilidade, com capacidade de prever as coisas, de ver longe. Eu acho que ele abriu um guarda-chuva enorme, e debaixo desse guarda-chuva veio um amigo daqui, um amigo dali, que criam situações. Agora, cabe a ele explicar, com toda a franqueza.
Sérgio Buarque de Holanda, Olívio Dutra e Lula na fundação do PT.

"[Sobre a criação do Instituto Lula, financiado pelas empreiteiras] O partido não inovou. Devia se confrontar com essas condutas e muitas vezes foi assimilando isso. Então, estamos no mesmo balaio. Essa é a questão. O Fernando Henrique Cardoso também tem um instituto. Agora, só porque ele tem, nós também temos que ter? O Sarney também tem, e aí tudo se justifica.

"Aí acontece o que eu chamo briga de bugio. Os bugios, quando se desentendem, fazem as fezes na mão e jogam uns contra os outros. É um processo evidente de degradação da política. (...) para governar, você faz um acerto aqui com esse, ali com aquele outro, e vai sendo engolido por um processo que era para ser transformado.

Tem que fazer uma autocrítica séria, o que não fizemos até agora. A maioria, que tem a direção do partido, não fez essa autocrítica séria. O partido não pode simplesmente achar que não cometeu erros. Figuras importantes, em cargos importantes dentro do governo, cometeram erros seriíssimos, agredindo inclusive o patrimônio ético moral do partido e da política. O Maluf, por exemplo. Eu nunca podia imaginar que um dia nós estivéssemos de braços dados com o Maluf. E por aí vai.

"Hoje eu sou oposição à direção nacional, mas eu sou PT e quero que o meu partido saia dessa inhaca em que se meteu por essa política do pragmatismo e da governabilidade a qualquer custo. (...) Nós temos estruturas que precisam ser mudadas. A estrutura política partidária que existe hoje é uma excrescência, para dizer o mínimo. Tu eleges um presidente da República, ou uma presidente, como é a Dilma, com um projeto. E o Congresso é composto majoritariamente por aqueles que defenderam outro projeto.
"Nunca imaginei que estaríamos de braços dados com o Maluf"

"E, no entanto, por serem maioria, eles vêm para dentro do governo. Isso cria uma contradição. Tudo vira um toma lá dá cá, um é dando que se recebe. E nós não mexemos nessa estrutura, não fizemos reforma política séria, nem reforma tributária, nem reforma agrária, nem reforma urbana, que ficou tudo no Judiciário. Continuam dando isenção tributária a grupos poderosos. Nós não mexemos nessas coisas. Fizemos muito, mas deixamos muito por fazer. E fizemos muita coisa errada também. A política não pode ser uma manobra dos mais espertos, dos mais atilados. Tem que ser a construção do bem comum com o protagonismo das pessoas."

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