Um ótimo livro sobre o Eduardo |
Deve tê-lo mudado porque era mais um apelido; um tanto gordo, ele lembrava mesmo um porquinho. E, claro, assim o nome de guerra descumpria a finalidade de dificultar a identificação do companheiro que o utilizava.
Eu era um secundarista de 18 anos, um tanto deslumbrado por ter sido repentinamente admitido no círculo dos revolucionários mais procurados do Brasil. Olhava a todos e a tudo com muita atenção, fazia minhas avaliações, queria entrosar-me o quanto antes com os novos companheiros.
O Basílio não parecia o combatente da pesada que depois fiquei sabendo ser. Nem de longe. Fiquei surpreso quando o Moisés (José Raimundo da Costa) me contou algo de sua história.
Estava com o cabelo curto e um farto bigode, que o deixava com um jeitão de português, além de envelhecê-lo um pouco. Nunca adivinharia que ele tinha só 23 anos.
Era simples, afável, simpático. Quando se alterava, gaguejava um pouco. Foi o que aconteceu ao comunicar que deixaria a Organização.
Minhas recordações, quatro décadas e meia depois, são nebulosas. Lembro-me de que ficou muito emocionado, talvez tenha até chorado.
Notícia de sua morte num jornal alinhado com a repressão |
Montou uma pequena organização, a Rede, que se manteve bem próxima da VPR, sendo nossa parceira em várias ações.
Quando o Moisés e eu vimo-nos ameaçados de expulsão da VAR-Palmares, no curso da luta interna que desembocaria na recriação da VPR, ele consultou o Basílio a respeito do nosso ingresso na Rede, recebendo sinal verde.
Bem ao seu estilo -- conservava sempre uma carta escondida na manga --, o Moisés só me falou dessa sondagem quando o racha estava consumado e nós, os precursores, reabilitados.
É minha última reminiscência envolvendo o Basílio, até ficar sabendo de sua prisão e martírio -- um dos episódios mais chocantes dos anos de chumbo. "Nenhum tormento conseguiu arrancar qualquer informação do Bacuri", garante Jacob Gorander.
Até hoje não me passa pela garganta que a vítima de tão terríveis e prolongados suplícios tenha sido aquele gordinho boa gente que batia bola comigo na praia de Mongaguá, durante os intervalos do congresso da VPR. As duas imagens não casam.
Até hoje não me passa pela garganta que a vítima de tão terríveis e prolongados suplícios tenha sido aquele gordinho boa gente que batia bola comigo na praia de Mongaguá, durante os intervalos do congresso da VPR. As duas imagens não casam.
O destino foi cruel demais com ele.
Obs. - ainda sobre o Eduardo Collen Leite, leia aqui (clique p/ abrir) a descrição do seu martírio no relatório final da Comissão Nacional da Verdade.
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