Notícia do dia: "Após acordo entre governo e oposição, a CPI do Cachoeira engavetou pedidos para investigar tanto a empreiteira Delta como governadores e parlamentares acusados de envolvimento com Carlinhos Cachoeira."
O teatrólogo Luís Alberto de Abreu, meu amigo há quatro décadas, diz que os participantes da política oficial fazem pôse de direitistas, centristas ou esquerdistas, mas isto é meramente para consumo externo. Entre eles, estão sempre unidos na defesa dos seus privilégios imorais e maracutaias escandalosas. Sua verdadeira prioridade é manterem-se no lugar. Seus verdadeiros inimigos são os que tentam tomar-lhes o lugar.
Foi o que pensei num dia destes, quando ocorreu-me de estar esperando a chegada de um companheiro à Assembléia Legislativa; sem coisa melhor para fazer, fui matar tempo assistindo à sessão.
Meia dúzia de deputados presentes, numa tarde de dia útil.
Vem um direitista qualquer e pede ao presidente que inclua nas atas uma relação de vítimas da esquerda. Acaba o pronunciamento e some.
Vem um esquerdista e pede ao presidente que inclua nas atas uma relação de vítimas da direita. Depois fala sobre outras coisas.
Ninguém pede aparte, ninguém mostra desagrado, ninguém liga. Nada além de um ritual burocraticamente cumprido, sem a mínima emoção. Já vi enterros mais animados.
Ambos terão serviço para mostrar a seus eleitores, na próxima temporada de caça ao voto: "Olha as verdades que atirei na cara do inimigo!".
Como a coisa se avacalhou tanto, com os Poderes da Nação sendo reduzidos ao espetáculo grotesco que hoje nos oferecem o Executivo, Legislativo e Judiciário?
Marcuse explica: com a imposição avassaladora do poder econômico sobre os três. Estão satelizados. Foram domesticados.
Daí minha irrisão cada vez que se fala em CPI para apurar algum dos infinitos esquemas de corrupção existentes.
Num bom filme que pouca gente notou, Proezas de Satanás na Vila do Leva-e-Traz (d. Paulo Gil Soares, 1967) a prosperidade fajuta que a descoberta do petróleo trouxe a um vilarejo longínquo não ilude a um menino. Em pleno banquete, ele não consegue mastigar a comida, vistosa mas falsa. E grita: "É tudo mentira! É tudo mentira!". Num átimo, toda a riqueza recente desaparece e os cidadãos se descobrem vestidos com as roupas velhas, tão miseráveis como antes.
Único espectador da sessão do Legislativo paulista --havia uns dez alunos do ensino médio que estavam pagando mico e abriram largos sorrisos quando puderam ir embora--, também tive vontade de gritar: "É tudo mentira! É tudo mentira!".
Seria inútil, pois vaias e protestos não mais chegam a seus ouvidos. A platéia foi isolada do palco por um enorme vidro, deixando a trupe mambembe totalmente a salvo da insatisfação do público.
E, como peixes num aquário, eles continuam executando movimentos totalmente vãos para todos, exceto para eles mesmos.
O teatrólogo Luís Alberto de Abreu, meu amigo há quatro décadas, diz que os participantes da política oficial fazem pôse de direitistas, centristas ou esquerdistas, mas isto é meramente para consumo externo. Entre eles, estão sempre unidos na defesa dos seus privilégios imorais e maracutaias escandalosas. Sua verdadeira prioridade é manterem-se no lugar. Seus verdadeiros inimigos são os que tentam tomar-lhes o lugar.
Foi o que pensei num dia destes, quando ocorreu-me de estar esperando a chegada de um companheiro à Assembléia Legislativa; sem coisa melhor para fazer, fui matar tempo assistindo à sessão.
Meia dúzia de deputados presentes, numa tarde de dia útil.
Vem um direitista qualquer e pede ao presidente que inclua nas atas uma relação de vítimas da esquerda. Acaba o pronunciamento e some.
Vem um esquerdista e pede ao presidente que inclua nas atas uma relação de vítimas da direita. Depois fala sobre outras coisas.
Ambos terão serviço para mostrar a seus eleitores, na próxima temporada de caça ao voto: "Olha as verdades que atirei na cara do inimigo!".
Como a coisa se avacalhou tanto, com os Poderes da Nação sendo reduzidos ao espetáculo grotesco que hoje nos oferecem o Executivo, Legislativo e Judiciário?
Marcuse explica: com a imposição avassaladora do poder econômico sobre os três. Estão satelizados. Foram domesticados.
Daí minha irrisão cada vez que se fala em CPI para apurar algum dos infinitos esquemas de corrupção existentes.
Num bom filme que pouca gente notou, Proezas de Satanás na Vila do Leva-e-Traz (d. Paulo Gil Soares, 1967) a prosperidade fajuta que a descoberta do petróleo trouxe a um vilarejo longínquo não ilude a um menino. Em pleno banquete, ele não consegue mastigar a comida, vistosa mas falsa. E grita: "É tudo mentira! É tudo mentira!". Num átimo, toda a riqueza recente desaparece e os cidadãos se descobrem vestidos com as roupas velhas, tão miseráveis como antes.
Único espectador da sessão do Legislativo paulista --havia uns dez alunos do ensino médio que estavam pagando mico e abriram largos sorrisos quando puderam ir embora--, também tive vontade de gritar: "É tudo mentira! É tudo mentira!".
Seria inútil, pois vaias e protestos não mais chegam a seus ouvidos. A platéia foi isolada do palco por um enorme vidro, deixando a trupe mambembe totalmente a salvo da insatisfação do público.
E, como peixes num aquário, eles continuam executando movimentos totalmente vãos para todos, exceto para eles mesmos.
Um comentário:
Então: sabemos que CPIs têm que ter fato determinado. Não pode ser uma espécie de lavagem geral de roupa, ou vira palhaçada. Uma guerrinha de acusações recíprocas não tem como levar a nada. O foco inicial da CPI era examinar as relações de um único parlamentar (Demóstenes Torres) com esse intermediador de negócios, o tal de Carlinhos Cachoeira. Daí vira 'joga m ....' no governo, 'joga m..... no Cabral', etc. Vira tribunal político.
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