terça-feira, 3 de novembro de 2009

AUTOCRÍTICA DE STÉDILE: DESTRUIÇÃO DOS LARANJAIS FOI "EQUÍVOCO"

Como dizia Lênin, às vezes temos de dar um passo atrás para podermos dar dois passos adiante.

Foi o que fez o coordenador do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem terra, João Pedro Stédile: entrevistado pela TV Brasil, admitiu que a destruição dos laranjais da Cutrale foi "um equívoco" e "uma atitude desesperada".

Segundo ele, os militantes do MST encontravam-se acampados na região de Iaras (interior paulista) há seis anos, sem atendimento de suas demandas, e perderam a cabeça ao serem informados, pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, de que a terra ocupada pela Cutrale era grilada:
"Foi uma atitude desesperada das famílias que ocupavam a fazenda. Com a notícia do próprio Incra de que a área é da União desde 1910, naquele clima de indignação, alguns dos companheiros pegaram o trator e destruíram os laranjais".
Stedile admite que tal descontrole acabou fornecendo um trunfo poderoso para a propaganda adversa:
"Evidentemente que foi um equívoco, porque a direita e os órgãos de comunicação deste país, que servem aos interesses da burguesia brasileira, se utilizaram daquelas imagens, que foram gravadas pelo serviço de inteligência da PM de São Paulo, com o uso de helicóptero, e nos execraram na opinião pública".
Também denuncia que os danos constatados nas casas dos trabalhadores foram produzidos depois da saída dos militantes, no intervalo entre a desocupação e a chegada da imprensa, quando "ficou a polícia sozinha com a Cutrale dentro da fazenda por uma hora".

O certo é que há muito deveria ter caído esta ficha para os companheiros do MST: como atuam na contramão dos interesses dominantes, todos os trunfos que fornecerem aos inimigos serão magnificados e explorados ao máximo pela indústria cultural.

A lição já poderia ter sido aprendida quando da depredação dos pedágios, da incursão na Câmara Federal ou da invasão do centro de pesquisas da Aracruz: ações desse tipo vão sempre aparecer com destaque no Jornal Nacional, nas manchetes de jornais e nas capas de revistas, servindo como estopim de campanhas reacionárias contra o MST.

É puerilidade alegar-se que a mídia estará sempre crucificando o MST, faça o que fizer. Denúncias descabidas não causam maiores estragos, pois o público já deixou de confiar cegamente nos veículos de comunicação.

Agora, quando se fornecem imagens tão chocantes como as da destruição dos laranjais, o inimigo é competente para extrair delas total proveito. Como agora, ao conseguir a convocação de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito.

CORAÇÕES E MENTES

A maior vitória conquistada nas últimas décadas contra o sistema, em países desenvolvidos, foi o repúdio à intervenção estadunidense no Sudeste Asiático: o país mais poderoso do mundo foi obrigado a se retirar de uma guerra que seus jovens não queriam travar.

A conquista dos corações e mentes teve importância fundamental: aos poucos, a população foi convencida de que nada justificava aquele morticínio, até que o complexo industrial-militar teve de curvar-se à vontade da maioria.

Isto foi possível porque os contestadores geralmente atuaram com criatividade e discernimento: sabiam que o objetivo último de suas demonstrações era sensibilizar os neutros, os indecisos, os indiferentes e os antagonistas não muito convictos.

Então, não era fácil para a imprensa passar, deles, uma imagem tão negativa quanto gostaria.

Cabe ao MST incutir nos militantes a noção de que suas manifestações públicas devem também priorizar a conquista dos corações e mentes, angariando simpatia para a causa ao invés de acentuar as rejeições.

Stedile fez, com muita propriedade, a autocrítica que se impunha. Falta o MST fazer a autocrítica na prática, passando a conviver de forma menos amadoresca com a tendenciosidade da indústria cultural.

Um comentário:

Anônimo disse...

O MST tem dezenas de milhares de integrantes. As ações são decididas localmente. Não há como ter controle sobre tudo (e nem deve haver controle centralizado).
Mas se pensarmos que entre centenas de ações do MST só uma ou outra que acabam revertendo negativamente, o saldo ainda é muito positivo. Estranho seria se nunca tivesse havido equívoco nas avaliações locais.
De toda forma, não se até que ponto o saldo foi tão negativo assim. A ação expôs um problema e a Cutrale.
No caso da Aracruz acabou sendo divulgado pra muita gente que até então nunca tinha ouvido falar dos 'dsertos verdes'.

Related Posts with Thumbnails