quarta-feira, 22 de julho de 2009

O OUTRO LADO E O BENEFÍCIO DA DÚVIDA

No final de 1968, procurando emprego na Folha de S. Paulo, fiquei conhecendo um senhor que estava à espera de ser chamado para sua reunião: o diretor do jornal santista do Grupo Folha, a Cidade de Santos. Batemos um papo e ele até me ofereceu uma vaga na sua redação, caso eu estivesse disposto a morar no litoral.

Seu nome: Antonio Aggio Jr.

Na década seguinte, ele se tornou diretor da Folha da Tarde, cuja redação, dizia-se, mantinha ligações perigosas com a repressão política.

Trabalhando em assessorias de imprensa, eu escutava alusões a isto. Mas, o jornalista apontado como aliado dos órgãos de segurança era o encarregado de cobrir a área militar, Carlos Dias Torres. Não me lembro de ter ouvido citarem o nome do Aggio nessas conversas.

Corta para 2004. Desempregado e em situação de extrema penúria, eu estava travando luta pública, principalmente via internet, para que a Comissão de Anistia do Ministério da Justiça cumprisse seus próprios critérios quanto à ordem de prioridade dos julgamentos.

Tais critérios, que me beneficiariam, estavam sendo desrespeitados. E a reparação da União era minha última esperança de dar a volta por cima e reconstruir a vida.

Expedindo e-mails em todas as direções, a partir de listagens encontradas aqui e ali, enviei mensagem a um site chamado O Jornal. Para minha surpresa, quem respondeu foi o Aggio. O site era (e é) dele.

Passou a colocar no ar tudo que lhe mandava. E, num e-mail, revelou que, embora nunca tivesse simpatizado com os ideais revolucionários, respeitava e tentara ajudar jornalistas que resistiam à ditadura, principalmente sua amiga Lenita Miranda de Figueiredo (do PCB), a quem teria salvado de ser assassinada nos porões do regime.

Quando soube das acusações que a historiadora Beatriz Kushnir lhe fazia, de que a Folha da Tarde noticiara na véspera a morte do militante Joaquim Seixas (do MRT, pai de Ivan Seixas), pedi-lhe explicações.

O Aggio desmentiu, garantindo que os principais jornais paulistas, disponíveis no Arquivo do Estado, comprovam que o óbito foi noticiado simultaneamente por todos eles.

Enfim, sabendo como se passavam as coisas no tempo da ditadura, a minha impressão é de que o Aggio equilibrou-se, como a maioria dos jornalistas em redações importantes, na corda bamba.

Algum tipo de concessão todos acabavam fazendo. Mas, até por saberem que o mundo dá muitas voltas, eram poucos o que se comprometiam com os excessos mais gritantes e que poderiam mais tarde ser-lhes cobrados.

Concedo-lhe o benefício da dúvida em relação a essa terrível acusação que a Kushnir lhe lançou. Se existem os jornais daqueles dias, são eles que darão a palavra final sobre quem está com a razão. É simples assim.

E, como sempre segui o princípio jornalístico de ouvir os dois lados de uma questão, aconselhei o Aggio a escrever também um livro, oferecendo aos leitores do presente e do futuro um contraponto à versão da Kushnir. Assim, os pratos da balança ficarão equilibrados.

Tudo isto vem a respeito de um digno editorial que o Aggio colocou no ar em seus dois sites: Caso Battisti: Estado de Direito ou insanidade ditatorial? (ver aqui)

Além de publicar o excelente artigo do Rui Martins que caracteriza o procedimento do Supremo Tribunal Federal como uma "vergonha internacional", Aggio o complementou com um candente protesto de sua própria lavra. Vale a pena citar alguns trechos:
"[O refúgio é] ato unilateral que, dentro do nosso ordenamento jurídico, depende tão somente de decisão do Poder Executivo, isto é, do presidente da República e seu ministro da Justiça. E, além do mais, está conforme a tradição política brasileira quanto a tais casos.

"Mas, o 'asilado' continua preso, à espera da palavra final do Supremo Tribunal Federal – STF, uma aberração que agride a mente de qualquer cidadão dotado de senso comum, principalmente num País que garante liberdade aos piores assassinos enquanto aguardam o trânsito em julgado. E também concede indenizações e pensões a pessoas acusadas, no passado, da prática de crimes idênticos aos atribuídos pela Itália a Battisti.

"Também é muito estranho que, enquanto se perde em decidir até questiúnculas entre vizinhos devido à presença de animais de estimação em condomínios, o STF – a mais alta corte brasileira – procrastina um caso grave com o réu preso, da mesma forma que ignora a desesperadora situação dos milhares de desvalidos à espera (inútil) do pagamento de precatórios pelos municípios, Estados e União.

"Não morro de amores por Cesare Battisti, ou melhor, pelo que ele pode ou não ter feito na Itália. Essa é outra questão, algo subjetiva por sinal. Mas, daí a tolerar que alguém, seja lá quem for, ignore a Constituição Cidadã para atrair os holofotes da mídia, enquanto mantém um ser humano padecendo no cárcere... Isso não se faz nem com os bichos.

"Quando se intenta interpretar um texto de maneira contrária ao que nele está expresso, ocorrem aberrações. E, no caso de Battisti, o julgador parece colocar-se acima da letra da Constituição e da lei. A coisa toda está malcheirosa! Ou Battisti é um asilado político ou um reles homicida estrangeiro. Quanto a sua primeira situação, não resta dúvida, como também com relação ao fato de que, em tal condição, ninguém jamais deveria permanecer encarcerado nem por um dia, enquanto um grupinho de iluminados pelos holofotes da mídia fatura a torto e a direito sobre a sua desgraça. A quem interessa isso? À Nação? Ao povo brasileiro?"

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