quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

CARTA DE CESARE BATTISTI...

...AO CONARE, QUE, CEGO E SURDO, IGNOROU-A E TOMOU UMA DECISÃO INCOMPATÍVEL COM A TRADIÇÃO BRASILEIRA DE DAR ABRIGO AOS PERSEGUIDOS POLÍTICOS DE OUTRAS NAÇÕES:

"São muitos os anos de perseguição política que sofro. Confesso que estou cansado. Após minha fuga da Itália, a minha militância deu-se como escritor, usando o espaço que me deram as editoras francesas e italianas para criticas a época política italiana dos anos de chumbo.

"Fui membro do PAC, mas nunca pratiquei atos de violência. Me abriguei em solo francês, pois a doutrina Mitterand protegia os militantes que renunciassem à prática de atos de violência. A verdade é que eu já havia publicamente renunciado à luta armada quando da morte de Aldo Moro. Tão logo percebi o caminho pelo qual a esquerda radical italiana poderia estar indo, fui radicalmente contra e cheguei mesmo a dizer a meus companheiros minha discordância.

"Fugi para a França, e da França para o México, e do México para a França, e da França para o Brasil. A pé, de ônibus, de avião, de carro, enfim, da forma que fosse possível. Fugi cruzando territórios e fronteiras, que nem sempre eram a minha destinação original. Fugi muitas vezes pensando que nunca mais veria minhas duas filhas, meus amigos, minhas referências de vida.

"Hoje estou cansado. Se volto para a Itália sei que vou morrer. Embora nunca tenha matado ninguém, me acusaram de ter matado policiais com base em um depoimento de um "arrependido" por delação premiada, que jogou a culpa por muitos atos praticados por ele próprio em mim. Sei que será difícil convencer as pessoas da verdade, pois mentiras contra mim foram repetidas mais de mil vezes.

"Nunca pratiquei atos de violência contra quem quer que seja, e não há testemunha presencial que me acuse de tal prática.

"Sei que tenho condições de viver o fim de meus dias com dignidades nesta terra maravilhosa, como outros militantes políticos de esquerda da época o estão fazendo. Sei que posso continuar minha carreira de escritor e tradutor sem interferir em assuntos internos.

"Vim para o Brasil pois sabia do calor e do acolhimento que aqui receberia. Sabia também que o Brasil acolhe perseguidos políticos. Hoje tenho certeza que reúno condições de aqui trabalhar, de trazer minha família para perto, de estar ao lado de meus amigos que mesmo vivendo do outro lado do Atlântico nunca me deixaram só.

"Recebi com muita alegria a mudança de orientação do governo francês, que decidiu não mais extraditar Marina Petrella. Ela não merecia a morte, e Mitterand havia dado a todas nós a palavra de que não seriamos extraditados. Sarkozy procura o caminho dos grandes estadistas quando dá a mesma palavra para as FARCs e quando protege Marina da morte que seria certa. A verdade é que tudo isso me dá no mínimo o direito de sonhar que serei aceito como refugiado político nesta terra maravilhosa chamada Brasil e que um dia poderei ver a verdade restabelecida também na França e na Itália."

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