segunda-feira, 1 de janeiro de 2018

"HOUVE UMA INSURREIÇÃO DE JOVENS PLANETÁRIA, NUMA ÉPOCA EM QUE NÃO EXISTIA INTERNET"

OS 50 ANOS DA PRIMAVERA DE PARIS
Zuenir Ventura: "Foi um ano mítico"
"Há 50 anos, esse ano não acaba de não acabar. O [filósofo francês] Edgar Morin, que acompanhou o movimento na França e no Brasil, dizia que vamos precisar de muitos e muitos anos para entender o que aconteceu. E 50 anos, na História, não são nada. Até hoje estamos discutindo o que aconteceu. Foi um ano mítico.

O maior mistério é que houve uma insurreição de jovens planetária, numa época em que não existia internet, a TV não tinha esse alcance de hoje. Jovens dos países comunistas, democráticos, autoritários, França, EUA, México, Japão, em um determinado momento, sem as conexões que existem hoje, ficaram com o mesmo corte de cabelo, ouvindo as mesmas músicas, pensando da mesma maneira, agindo do mesmo jeito.
O idealismo subsiste, só não está poder

Era uma geração carregada de ambições e sonhos, o que ficou disso, dessa aventura deles? Ficaram pelo menos quatro movimentos importantes, que ou nasceram ou se solidificaram em 68 —movimento feminista, gay, negro e ecológico. Esses movimentos estão mais atuantes do que nunca.

...idealizamos a herança de 68, como se fossem só personagens bons. Teve do bom e do pior. Teve gente como Vladimir Palmeira, um dos líderes do movimento, foi do PT, rompeu com o partido por divergências morais. E teve gente condenada, como Zé Dirceu.

À distância, temos a impressão de que havia uma geração unanimemente honesta, mas existem desvios. Ainda temos conosco a paixão pela coisa pública que movia muitos em 1968. Isso existe ainda, só não está no poder."

(trechos de entrevista publicada neste dia 1º pela Folha de S. Paulo, do
escritor e jornalista Zuenir Ventura, autor de 1968  o ano que não terminou)

4 comentários:

caldasjornalista disse...

Vejo razão na análise de Zuenir... Eu era uma criança e vi isso passar de relance diante de meus olhos, sem compreender nada do que via ou ouvia, visto que era uma criança criada numa cidade pequena, encravada no interior do ES, na serra do Caparaó...

celsolungaretti disse...

Caparaó?! Que interessante, meu caro Caldas.

Por curiosidade, a região guardou alguma lembrança da chamada "primeira guerrilha"? Digo isto porque sou da Mooca e o bairro parece ter apagado totalmente da memória a greve geral de 1917. Fui saber que ela tinha existido pelos jornais.

Meu pai entrou em 1930 na fábrica na qual ela começou, o cotonifício Crespi. Passou décadas trabalhando ali. Também jamais ouvira falar da grande greve. Curioso, não?

Valmir disse...

ou como disse Godard, à época...na batalha de Paris só os policiais eram proletários...estudantes eram burgueses ociosos e inúteis.

celsolungaretti disse...

Bem se dizia: os artistas são a antena da raça. Em seus filmes, Godard, por intuição e sensibilidade, captou muito do que estava para acontecer. Quando quis fazer uma avaliação racional daquele momento, no entanto, caiu nos velhos clichês da esquerda velha.

O maio francês foi, isto sim, o ensaio geral da construção de uma sociedade sem burgueses e proletários. Até porque o objetivo último do marxismo foi sempre a abolição das classes, não a ditadura do proletariado, um desvirtuamento das posições iniciais do Marx.

Mas, claro, fica bem para um artista de esquerda criticar a classe média da qual saiu. Não é o que muitos artistas daqui sempre fizeram? Manter a pose apropriada é uma das almas do negócio...

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