quinta-feira, 29 de junho de 2017

O CAPITALISMO DE ESTADO À BRASILEIRA ISOLOU NOSSO PAÍS DO MUNDO E NOS TORNOU UMA ATRASADA AUTARQUIA

Toque do editor
Não há quem aguente escrever dia após dia sobre a entropia brasileira — o atoleiro em que estamos nos debatendo desde 2015, com as forças políticas anulando-se mutuamente e o país não saindo do lugar, aparentemente condenado a aguardar a eleição presidencial de outubro de 2018 para que seja rompido o impasse, pois ora inexiste consenso para viabilizar qualquer opção melhor (o que há são emendas piores do que o soneto, como o estado policial que se vislumbra no ativismo justiceiro de certos jacobinos togados).

Então, buscando algo diferente, encontrei um interessante artigo do economista e cientista Marcos Troyjo, discorrendo sobre as diferenças entre o capitalismo de estado no Brasil e na China. 
Comida de tigre de papel em plena China?!

Como os leitores devem lembrar-se, a sugestão de seguirmos os passos chineses foi apresentada por uma articulação parlamentar de cunho nacionalista, que tenta fazer do senador Roberto Requião o vice de Lula na eleição de 2018. 

As propostas econômicas dessa tal frente foram imediatamente rechaçadas pelo Dalton Rosado, neste post. E eu creio que valha a pena aprofundarmos a discussão, até porque o Estado é um verdadeiro fetiche da esquerda brasileira desde o tempo em que o Partido Comunista era sua força hegemônica e seguia fielmente os ditames stalinistas. 

O texto de Troyjo, Notas sobre o capitalismo de estado, cujos trechos mais pertinentes reproduzo a seguir, é um adendo a tal discussão. E, certamente, o Dalton terá algo mais a dizer sobre o assunto, nos próximos dias.
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Por Marcos Troyjo
"...tanto a própria noção de capitalismo como a ideia de capitalismo de Estado representam conceitos demasiado amplos. Comportam realidades tão diferentes como China ou Cingapura, Brasil ou Rússia...

É possível (...) vislumbrar dois submodelos majoritários de aplicação de ferramentas Estado-capitalistas, sobretudo em termos de estratégia econômica. Os dois países que ofereceram os elementos mais facilmente identificáveis em tempos recentes são justamente o Brasil e a China.

O Brasil, que buscou consolidar o modelo em diferentes momentos históricos, jamais porém o implementou com tanto afinco como nos anos Lula-Dilma. E o fez num contexto de pujante sociedade civil, imprensa vigilante e livre, pleno direito à crítica e sufrágio universal. O capitalismo de Estado brasileiro que disso resultou foi consumista, orientado para dentro e curto-prazista.

Na China, o capitalismo de Estado se deu sobre estruturas de imobilismo político e (forçada) coesão. O projeto nacional chinês de poder, prosperidade e prestígio é mais importante do que a livre movimentação e expressão política dos atores sociais. Disso resultaram ênfase em poupança e investimentos, economia voltada para fora e perspectiva de longo prazo.
Mao (com Nixon) em 1972: onde foi parar seu livro vermelho?

O capitalismo de Estado chinês foi marcado –por certo tempo– pela administração artificial do câmbio e da remuneração do fator trabalho, acesso favorecido aos principais mercados compradores do mundo, grande capacidade de acúmulo de poupança e investimento nas mãos do Estado, parcerias público-privadas voltadas à infraestrutura e logística de comércio exterior, e uma combativa diplomacia empresarial.

O capitalismo de Estado no Brasil desenhado no período Lula-Dilma foi erigido sobre protecionismo comercial, fortalecimento das megacorporações de economia mista que atuam em commodities agrícolas e minerais, política industrial defensiva e, por último, remuneração do capital financeiro em níveis bem superiores às taxas praticadas ao redor do mundo - de modo a compensar os esquálidos níveis de poupança e investimento internos, ambos inferiores a 20% do PIB.
Trabalhadores chineses já não são os mais explorados. Há piores!
Tanto o modelo chinês como o brasileiro conferiram caráter sacrossanto à noção de conteúdo local. No caso chinês, muito se especulou quanto ao conteúdo local como imperativo para manter-se empregada – a baixos níveis de remuneração –a imensa população de jovens que a cada ano chega ao mercado de trabalho.

Contudo, esse que foi o principal estereótipo da competitividade chinesa –mão de obra abundante a baixo custo– já está caduco. Economias como Índia, Paquistão, Vietnã ou mesmo países africanos já oferecem mais atrativos neste particular do que a China.

O que marca a ênfase que o capitalismo de Estado na China contemporânea atribui ao conteúdo local se manifesta na robusta capacidade de realizar compras governamentais ou celebrar contratos internacionais exigindo, como contrapartida do parceiro estrangeiro, a instalação de unidades produtivas em território chinês.

Neste sentido, aparentemente é grande a coincidência com o modelo brasileiro de busca de conteúdo local, que concentra o poder do Estado, suas autarquias e das grandes empresas de economia mista e em favor da atração de investimentos estrangeiros diretos.
No entanto, o capitalismo de Estado no Brasil e sua filosofia local-conteudista promoveram tão somente substituição de importações. Na China, tais ferramentas foram instrumentalizadas à promoção de exportações.

A vertente chinesa promoveu internacionalização e competitividade e, no limite, acabou por auxiliar na emergência do país como principal nação-comerciante. Em contraste, o modelo brasileiro tão somente serviu para isolar o país do mundo, reforçando suas feições de atrasada autarquia"

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