Professor Macedo: Vejo a recepção de Lula a Maduro sob dois prismas: primeiro é o da necessidade de integração da América do Sul. Este é um subcontinente vasto e riquíssimo em reservas naturais, mas com um povo miserável, como se fosse uma condição imanente. A exploração das metrópoles e do imperialismo nos legou à eterna condenação.
Lula, como figura global (que de fato o é), faz muito bem em tentar unir o continente, sem olhar os governantes de turno. A Venezuela é um país importante e, para o bem do seu povo e do próprio continente, precisa entrar no concerto das nações. Nesse sentido, o protagonismo de Lula é fundamental... Trata-se de um gesto político para ser aplaudido de pé!
O segundo é da necessidade de dourar a imagem de Maduro. Maduro é um autocrata e, como tal, tem que ser tratado. Ninguém nasce com a predestinação de ser o Presidente eterno de um país. Faz mais de duas décadas que a Venezuela não experimenta outro governante, que não seja Chaves e Maduro. Isso, por si só, é uma anomalia. Ironicamente, Lula, ao dar de ombros com essas escaramuças, confere ao venezuelano a ideia de perpetuação no poder. Logo ele que sempre propôs, no Brasil, a devida alternância de mandatários, conforme as regras eleitorais. O Presidente brasileiro tem autoridade moral para censurar o ímpeto caudilhesco de Maduro. Não precisa arrastar esse cambão.
No mais, está certíssimo em tentar aliviar o país vizinho desse garrote aplicado pelos EUA, que sufoca sua população, como bem provam essas miríades de nativos a pedirem nos sinais. Claro que também por culpa de Maduro. Se o sujeito não negocia, se é radical, a ponto de ver o mundo com uma trave no olho, não entre para a política. Que fique como eu, apenas com o legítimo direito de opinar.
Dalton Rosado: a política institucional é justamente isto: convivência própria a um tipo de poder vertical e decrépito que dá sustentação jurídica e militar a uma relação social escravista e segregacionista.
Lula e Maduro são líderes políticos originários da classe trabalhadora (o segundo foi motorista de ônibus) que mantêm a relação capital/trabalho como ela é: lados de uma mesma moeda, e não têm nenhum interesse de superar tal relação.
Que os políticos pratiquem a hipocrisia de salão habitual é compreensível, mas não posso considerar tal cominho, historicamente ineficaz, como conceito válido. Os reformistas tentam humanizar o desumano; os revolucionários colocam todo dia uma cunha neste dique de contenção e aos poucos vão juntando a vontade e a teoria com a realidade, e assim, criam as condições para a ruptura com o escravismo.
É neste sentido (sem falar nas graves violações dos direitos humanos) que acho um pouco demais o incenso a Maduro feito por Lula.
A esquerda reformista, com concessões cosméticas e populistas, se descredencia perante o povo por conta de uma falsa dicotomia com a essência conservadora.
É como vejo o tapete vermelho socialdemocrata na visita de um autocrata vestido de um falso vermelho.
Abração com as desculpas pela contundência que sei será entendida pelo dileto amigo na divergência fraternal neste ponto.
Professor Macêdo: Não há nada a desculpar, meu caro Dalton! Nossas discordâncias (quando existem) são muito cordiais!... Nunca esqueço que você é o criador do Pedruca (protagonista do seu livro Era uma vez o Brasil – 1928/1968), uma voz gentil, nos argumentos.
Apenas pontuar que vejo uma concertação global que está acima da ideologia e da vontade de qualquer governante. Contra ela, Lula não pode fazer nada, pois o sistema está posto, com suas leis, com suas regras. Se para o Lula é difícil estabelecer o seu governo, com alguns benefícios sociais, porque existe uma patrulha capitalista interna, será que ele poderia interferir numa governança global e anular o sistema vigente?
Outro dia, ouvi do ator Benvindo Siqueira, que mora em Portugal (comunista inclusive) que não se tenha preocupação com governantes de extrema direita em alguns países europeus, pois todos têm de se submeter às regras da União Europeia. Bruxelas é quem manda, dá o tom...
Lula vai jogar o jogo do mundo, jogo duro, na canela... Se jogar bem, pode mudar um pouco a vida de muitas pessoas; se jogar mal, revisitará o desastre de Sarney, Collor, Bolsonaro, ou da Venezuela, Argentina...
Isso, claro, pensando num mundo possível, se os milênios da civilização apontam nessa direção, nada autoriza a pensar numa quebra de paradigma.
Talvez nem o Lula goste disso, mas a engrenagem gira à sua revelia... Se ele propusesse qualquer coisa como a anulação da propriedade privada, seria detonado pelos próprios eleitores...
O sapo não pula por boniteza, mas, porém, por precisão (Guimarães Rosa).
Dalton Rosado: Oi, professor Macedo, como é bom poder dialogar sobre o que fazer? com pessoas bem-intencionadas e fora do poder. Independentes dele, como você, coisa que os políticos não podem fazer, por dependência político-econômica institucional.
Ajoelhou, tem que rezar, diz o ditado, e é por isto que os detentores de mandato eletivo têm que jurar a constituição burguesa como se fosse o graal da consciência coletiva ali resumida.
Há um problema grave na ordem burguesa one world: o limite interno de expansão sem a qual ela implode. Este limite está presente, como vaticinou Karl Marx.
Não é papel da esquerda consequente, emancipatória, administrar a falência do capitalismo, mas denunciá-la.
O sujeito da revolução é agora interno (a contradição dos próprios fundamentos da reprodução do capital) e cabe aos teóricos e coletividade dar seus pulos por necessidade, tal qual o sapo do Guimarães Rosa. Neste sentido vai haver um embate entre os emancipacionistas com a direita fascista e os reformistas quando o pêndulo da ineficácia desses dois últimos modelos clamar por alternativa irrecusável.Vai ser a hora da ruptura milenar com o escravismo e estamos apenas no início dela.
Chagaremos lá, se a hecatombe nuclear ou ecológica não nos impedir.
Abração.
Professor Macedo: Pura verdade! Temos duas hecatombes à vista: a climática, a longo prazo; a atômica, em breve. Talvez o império (ou os Impérios) prefiram isso, antes de morrerem.
Dalton Rosado: a ordem capitalista é socialmente destrutiva, mas é, também, autodestrutiva, e quer nos levar par o abismo, daí a necessidade der superação dela e não de sua impossível humanização.
Professor Macêdo: É uma engrenagem gigantesca... É um remover de Montanha, a começar pela conscientização dos pobres. Eu vivo rodeado de pobres de direita, capitalistas, neoliberais... Um horror!
Outro dia, numa imobiliária, referi-me à taxa de juros, os corretores (que precisam vender imóveis financiados) foram unânimes em repreender-me para adular um patrão bolsonarista.Dalton Rosado: o fetichismo da mercadoria ilude os explorados e escravizados, e é por isso que temos que eliminar a mediação social por meio deste mecanismo social tenebroso e ilusório. Ele ilude a todos e tem político de esquerda que quer a retomada do desenvolvimento, ou seja, mais produção de mercadorias e exploração. É mole?!
3 comentários:
Resenha: Marx no Antropoceno de Kohei Saito
https://www-socialistparty-ie.translate.goog/2023/04/review-marx-in-the-anthropocene-by-kohei-saito/?_x_tr_sl=en&_x_tr_tl=pt&_x_tr_hl=pt
mas nao so uma narrativa dos inimigos que maduro é um ditador sanguinário??
Valmir, não há dúvida nenhuma de que o Maduro seja um desprezível autocrata, que governa em nome de uma nomenklatura fardada. De um verdadeiro homem de esquerda ele só pode receber máximo desprezo.
Mas, enquanto o palhaço genocida não estiver cumprindo prisão perpétua ou internado definitivamente num hospício (por ser o responsável último pela morte de uns 400 mil brasileiros que teriam sobrevivido à pandemia sob um presidente mentalmente são) não podemos criticar Maduro nenhum. Pior do que o Bozo só Átila, Gengis Khan, Vlad Dracul, Hitler, Stalin e mais umas poucas outras abominações na história da humanidade.
Maduro é fichinha perto dessa turma.
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