rui martins
MICHELLE BACHELET E OS ATAQUES
DE BOLSONARO AO JUDICIÁRIO
No seu último encontro com os jornalistas internacionais correspondentes na Organização das Nações Unidas, Michelle Bachelet, que concluiu 4ª feira (31) seu mandato como alta comissária de Direitos Humanos da ONU, mostrou preocupação com as eleições brasileiras.
Motivo: a insistência do presidente Jair Bolsonaro em rejeitar as urnas eletrônicas como confiáveis e atacar o Poder Judiciário, mantendo no ar a suspeita de estar preparando um clima de agitação e de não aceitação do resultado das urnas, caso seja derrotado.
O tema mais abordado nesse encontro em Genebra foi o esperado relatório sobre os abusos cometidos pelo governo chinês contra a minoria uygur, depois de sua comentada viagem à China.
Mas foi também a oportunidade de falar sobre o Brasil, já que Bolsonaro, desde sua eleição, tem sido um tema de preocupações para Bachelet, pelas suas reiteradas declarações favoráveis à tortura, pelo seu governo de extrema-direita e pelas atuais ameaças de não respeitar o resultado das eleições a pretexto de não serem confiáveis as urnas eletrônicas.
Ainda em setembro de 2019, em resposta às primeiras críticas feitas por Bachelet na ONU, Bolsonaro, numa provocação publicada com destaque pela imprensa europeia, glorificou o antigo ditador chileno Augusto Pinochet, responsável pela prisão, tortura e morte do pai de Michelle.
No seu relatório sobre aquele ano ainda incompleto do governo Bolsonaro, Bachelet já enfatizara que o espaço democrático no Brasil estava se reduzindo, a violência policial estava aumentando e os defensores dos direitos humanos estavam sob ameaça.
Entre janeiro e junho daquele ano, a polícia do Rio e São Paulo já havia assassinado 1.291 pessoas, dizia o relatório, enquanto se arrastavam as investigações sobre o assassinato da vereadora Marielle Franco e seu motorista.
Nesse seu primeiro relatório sobre o Brasil, Michelle Bachelet acentuava que a violência policial afetava desproporcionalmente os afro-descendentes e as pessoas vivendo nos bairros marginais. E alertou: Vemos um aumento significativo da violência policial.
Bachelet criticou também as reiteradas defesas do golpe militar de 1964 pelo Bolsonaro, acentuando que a negação dos crimes de Estado poderia levar à impunidade e reforçar a mensagem de que os agentes do Estado estão acima da lei.
Outros relatórios com esse mesmo tipo de denúncias foram apresentados à ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Bachellet se encontrou pessoalmente algumas vezes. Denúncias que infelizmente não surtiram nenhum efeito.
Bolsonaro reagiu ao seu estilo agressivo, mas nada fez para melhorar a imagem da nova política brasileira, posta a nu pela ONU.
Passados quase quatro anos, praticamente todos os países democráticos confirmaram as denúncias da ONU, catalogando Bolsonaro como líder de extrema-direita, tanto quanto o premiê Viktor Orbán, da Hungria.
Desta vez, Bachelet mostrou muita preocupação com a situação política brasileira e focou suas preocupações nos múltiplos ataques do Bolsonaro ao Judiciário.
Ela também faz parte, embora sem nomear claramente, dos que temem a ocorrência de uma tentativa de golpe no Brasil. Ela viveu o golpe de Pinochet e sabe como foi armado e articulado.
O presidente Bolsonaro intensificou seus ataques contra o sistema judiciário e o sistema de voto eletrônico, disse ela aos jornalistas. O que me parece o mais inquietante é o presidente apelar para seus seguidores protestarem contra as instituições judiciárias.
Por Rui Martins |
Para Bachelet, um presidente precisa respeitar os outros poderes da República. Pode-se não estar de acordo com as decisões tomadas pelo Judiciário e o Legislativo, pode-se também dizer isso, mas é preciso respeitá-las. Não se pode fazer coisas capazes de aumentar a violência e o ódio contra as instituições democráticas, que devem ser respeitadas e reforçadas. Não se deve tentar minar as instituições com discursos fortes.
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