Criar uma norma e não segui-la é tão ridículo quanto roubar na paciência, um jogo em que o sujeito disputa contra si mesmo.
Mas é exatamente o que o Brasil está fazendo em relação ao arcabouço de dispositivos que emprestavam alguma credibilidade às contas públicas.
Eram normas como a Lei de Responsabilidade Fiscal, a regra de ouro, o teto de gastos, boas práticas orçamentárias e, principalmente, o preceito que proibia políticos de promover gastanças às vésperas de eleições.
Embora vários desses mecanismos tenham sofrido golpes ao longo dos anos, o sistema sobrevivia. Não mais. O Senado aprovou, e a Câmara deve acompanhar, um escandaloso pacote de cerca de R$ 40 bilhões de gastos eleitoreiros, que só terão vigência até dezembro.
Ainda mais grotesco, a oposição aderiu em massa à farra, em vez de rejeitar a proposta ou pelo menos torná-la menos teratogênica.
Não se trata, por óbvio, de negar que haja uma questão social seriíssima a tratar. A inflação corrói os rendimentos das famílias e a fome, que vinha se tornando um problema cada vez mais restrito, voltou a crescer no país.
Essa situação, contudo, vem se desenhando pelo menos desde meados do ano passado. Não há nada que tenha acontecido nas últimas semanas que marque o surgimento de uma emergência que inexistia antes.
Meu ponto é que, com um mínimo de planejamento e competência, teria sido possível criar colchões sociais sem sacrificar todo o sistema de controle de gastos.
O fato de não terem feito isso cria dois problemas:
1. o mais imediato é uma bomba fiscal que começará a produzir efeitos em 2023, quando o mundo poderá estar vivendo uma recessão;
2. o mais estrutural é a dificuldade que será reconstruir um sistema minimamente crível de controle fiscal.
Basicamente, nós provamos para o mundo que somos uma república de bananas, incapazes de exercer a autonomia. (por Hélio Schwartsman)
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