quarta-feira, 20 de julho de 2022

ESTADÃO TAMBÉM BATE PESADO: "BOLSONARO DESONRA O BRASIL"

N
ão há palavras para qualificar a gravidade do que o presidente Jair Bolsonaro fez na 2ª feira passada, na reunião com embaixadores estrangeiros. Ele disse ao mundo que o Brasil não é uma democracia confiável. 

É um ato absolutamente inédito e insólito, que ofende as instituições nacionais, humilha o País perante a comunidade internacional e envergonha toda a população. 

O presidente da República – chefe de Estado e chefe de governo – pediu que as nações estrangeiras não acreditem no País e em suas instituições. Segundo Jair Bolsonaro, o sistema de votação brasileiro não é a referência internacional que, até agora, o mundo sempre reconheceu e admirou. Seria uma farsa que ele, sem nenhuma prova, munido apenas de desinformação, veio desvelar.

Com a reunião de 2ª feira, Jair Bolsonaro ratificou que não tem nenhum limite. Se chegar à conclusão de que avacalhar o País perante toda a comunidade internacional pode render-lhe algum benefício – eleitoral, golpista ou o que quer que seja –, ele o faz sem pestanejar. Não há razão pública, ou consideração sobre a imagem do País, capaz de detê-lo. Não há nem sequer resquício de vergonha pessoal. 

Se seus devaneios lhe ordenam que convoque embaixadores estrangeiros e lhes comunique que a eleição pela qual se elegeu foi uma fraude – e, por tabela, que a próxima também será –, Jair Bolsonaro cumpre sem pestanejar. Perante tal desfaçatez, é insuficiente afirmar que não há respeito ao cargo. Bolsonaro demonstra que, a despeito de bradar que o Brasil está acima de tudo, não tem o menor apreço pelo País.

Na reunião com embaixadores estrangeiros, Jair Bolsonaro traçou uma linha no chão. Não é possível ficar indiferente a tão explícito ato de desprezo pelo País. Não é possível alegar que são apenas maus modos, excessiva espontaneidade ou imponderável recusa a seguir protocolos. Há um presidente da República que ataca e desonra o próprio País. 

É assim que Jair Bolsonaro protege a soberania nacional? É assim que cria as condições para o desenvolvimento da economia nacional? É assim que defende os interesses nacionais perante a comunidade internacional?

Já na 2ª feira, a Justiça Eleitoral rebateu, uma a uma, todas as falsas alegações apresentadas por Jair Bolsonaro aos embaixadores. Segundo o serviço de notícias Bloomberg, os questionamentos do presidente Bolsonaro eram todos "velhas e refutadas teorias da conspiração". 

“É muito grave acusação de fraude, de má-fé, a uma instituição mais uma vez sem apresentar prova alguma”, disse o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Edson Fachin.

De fato, na fala de Jair Bolsonaro não houve nada de novo. Nada do que disse aos embaixadores era apto a levantar alguma suspeita sobre o sistema eleitoral brasileiro. 

No entanto, a absoluta falta de fundamento e credibilidade não retira a gravidade das palavras de Jair Bolsonaro, que merecem cabal reprovação. Afinal, ao difundir mundo afora falsidades sobre as urnas eletrônicas, Jair Bolsonaro questiona a legitimidade de todo o regime democrático brasileiro, bem como a de todos os eleitos, inclusive seus filhos.

Além de defender a segurança das urnas e a lisura do processo eleitoral, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, fez importante constatação sobre os questionamentos de Bolsonaro: "São ruins para o Brasil sob todos os aspectos". A atitude de Jair Bolsonaro contra as urnas – cada dia fica mais evidente que é uma campanha anti-Brasil – não gera nada de bom.

Inexplicavelmente, tendo em vista o seu cargo e, compreensivelmente, tendo em vista seu histórico público, o presidente da Câmara, Arthur Lira, preferiu o silêncio depois da reunião do dia 18. É com essa conivência que Jair Bolsonaro se sente seguro para continuar cometendo impunemente crimes de responsabilidade contra o exercício dos direitos políticos.

Mas, como falou Edson Fachin, "é hora de dar um basta à desinformação e ao populismo autoritário". Ministério Público, Judiciário, partidos políticos, parlamentares e sociedade civil podem e devem reagir. Ao contrário do que disse Bolsonaro, o Brasil não é uma republiqueta. (editorial d'O Estado de S. Paulo de 20/07/2022)

4 comentários:

SF disse...

Grande Celso!
Está nos devendo um "toque do editor" para deslindar este editorial.

Anônimo disse...

Não vi se este texto do Rui Martins foi reproduzido aqui, mas vale repetir
https://www.observatoriodaimprensa.com.br/conjuntura-politica/o-brasil-nao-e-um-pais-serio/

celsolungaretti disse...

Anônimo das 11h47, o mundo deu muitas voltas desde 3 de maio, quando saiu aquele artigo do Rui no OI. Datou.

Aquela situação está totalmente superada, já que o Bozo, hoje, não passa de um defunto político à espera do rabecão. Suas "tempestades de som e fúria", como diria o bardo, não significam mais nada.

Temos é de nos preparar para desenvolvermos uma boa atuação como oposição de esquerda ao governo reformista do Lula.

celsolungaretti disse...

Grande SF, é apenas o velho Estadão marcando diferença entre sua posição conservadora tradicional e a porraloquice ultradireitista da qual sempre discordou.

Vale lembrar sua firme resistência à ditadura getulista e sua tentativa de corrigir a vacilada de 1964 (acreditou que o golpe apenas botaria ordem na casa e alguns meses depois devolveria o poder aos civis) sendo o veículo da grande imprensa brasileira que mais confrontou os milicos a partir do AI-5.

Enquanto a Folha facilitava a captura dos seus jornalistas em pleno local de trabalho (a telefonista os chamava ao saguão de entrada para atenderem uma visita e quem os recebia era a equipe do DOI-Codi), o Estadão teve comportamento dos mais dignos.

Quando agentes da repressão foram lá prender um jornalista da casa, o diretor de redação (não me lembro de qual Mesquita era) avisou à segurança para não deixá-los entrar. Em seguida ligou para o governador, para o comandante do II Exército, e acabou conseguindo que os agentes recebessem uma contra-ordem: deveriam esperar a saída normal do jornalista e não invadir o jornal.

Aí esse mesmo diretor saiu do prédio com o jornalista no porta-malas do seu carrão e o abrigou no sítio que possuía. Parece coisa de cinema, mas é fato real.

E, quando o Vladimir Herzog foi assassinado, todos os jornalistas do Estadão investigados no mesmo inquérito só foram depor no DOI-Codi acompanhados por algum DIRETOR do jornal.

Então, o posicionamento atual com relação ao Bozo não me surpreende nem um pouco. É um jornalão conservador em economia, reacionário em política, mas que ainda cultiva os valores altaneiros da burguesia de outrora.

Quando havia arranca-rabos com os Frias, os Mesquitas sempre faziam questão de apresentarem-se como jornalistas íntegros, enquanto os adversários seriam, na sua visão, meros comerciantes prontos a venderem até a alma.

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