sábado, 30 de novembro de 2019

COMO SUPERARMOS A VISÃO UNILATERAL QUE NOS CONDICIONA À RESIGNAÇÃO COM O ABUSO E À SUBMISSÃO AO CAPITALISMO? – 1

dalton rosado
POR UMA VISÃO OMNILATERAL DA VIDA
As relações sociais sob o capital são unilaterais, que é o antônimo das relações sociais omnilaterais

Enquanto nas relações unilaterais o ser humano é regido por uma determinação fora de si, que o enquadra previamente num comportamento de competitividade autofágica, nas relações omnilaterais o ser humano está aberto para as múltiplas potencialidades que a sua racionalidade pode oferecer.

A diferenciação entre um conceito e outro pode ser entendida como sendo a circunstância devido à qual o ser humano se torna unilateralmente inimigo do seu semelhante, tangido pela competitividade que a ambos infelicita e desgraça, enquanto na omnilateralidade o ser humano é contributivamente solidário com o seu semelhante. 

A visão unilateral da vida é esquizofrênica,  já que imposta por uma lógica fetichista, reificada, fora de si, que limita as potencialidades do ser humano e o enquadra num universo previamente estabelecido por uma necessidade vital de consumo (a qual somente pode ser suprida dentro de um universo acanhado de atividade determinada pela escravidão indireta do trabalho abstrato, assalariado, sem o qual ele não sobrevive). 
Mas, contraditoriamente, é essa mesma visão unilateral que hoje retira da sociedade a possibilidade de oferecimento do próprio trabalho abstrato escravista, por força do desemprego estrutural; isto demonstra quão acanhada é sua dinâmica social perversa e restritiva.

Ao contrário, a visão omnilateral admite e estimula a diversidade das capacidades e a pluralidade de comportamentos individuais que não afetem destrutivamente os comportamentos individuais e coletivos, principalmente aqueles referentes às discriminações raciais e de gênero.

Quando se vê restrições ao conteúdo educacional mais abrangente e, ao mesmo tempo, a imposição de conceitos conservadores culturalmente positivados que a cada dia se evidenciam como obsoletos, estamos diante de uma visão unilateral pelo simples fato de que a verdade a ser cultuada e introjetada nas mentes humanas não pode ser contestada.

Quando se abre a perspectiva do debate e se aceita a reflexão sobre conceitos diferentes daqueles que estão cristalizados e positivados equivocadamente como corretos e virtuosos, descortinam-se outros conceitos que a própria dinâmica da vida social em evolução demonstra serem mais adequados à realidade e à busca da realização do ideal de justiça.

O conceito de escola sem partido, p. ex., na verdade aponta para uma escola com partido, desde que o partido seja aquele de quem deseja manter incontestada uma visão unilateral de vida previa e historicamente positivada, como se isso fosse um conceito hipoteticamente virtuoso. 

A visão unilateral abomina o debate, justamente porque do confronto da tese com a antítese surge a síntese capaz de promover mudanças benfazejas. A visão ditatorial de mundo, na qual alguém manda e os outros obedecem, corresponde a aversão ao contraditório que oportuniza visões diferentes daquelas que se quer impor pela força e sem argumentos.

Tal comportamento obedece ao adágio popular segundo o qual manda quem pode, obedece quem tem juízo. No caso, obviamente, o juízo corresponde a evitar-se uma punição por desobediência. 
É que a visão unilateral nos conduz à submissão, enquanto a visão omnilateral nos faz altivos.  

Quando se diz, p. ex., que o trabalho dignifica o homem, como conceito pétreo, imutável, sem esclarecer que a indispensável interação metabólica do ser humano com a natureza não pode ser confundida com a categoria econômica capitalista trabalho (entendido como produtor de valor monetário); sendo ele dimensionado como tal, a  unilateralidade compromete irremediavelmente a mensagem, pois digno, na verdade, seria emancipar o homem do trabalho alienado.

Sob a relação social capitalista, unilateral por excelência, não se admite outro modo de produção social que não aquele que produz valor, ele mesmo sendo valor, e que assim é transformado em mercadoria graças ao caráter onívoro e unilateral de própria existência dessa categoria econômica fetichista, como se tal comportamento fosse um dado ontológico e, consequentemente, imutável da vida. (por Dalton Rosado)
(continua neste post)

2 comentários:

Anônimo disse...

***
Estou sempre aprendendo palavras novas com você, Dalton.
Agora vem "omnilateralidade" que, agora entendo, não significa uma visão multilateral (mas sem convergência) e sim uma visão compartilhada e virtuosa do que seja o estar no mundo. Aparentemente, omnilateral procede do multilateral, mas o elimina pacificamente.
***
Os conceitos que você expõe a respeito da mercadoria e do mundo dela derivado surpreende até os esquerdistas que, quando honestos, se sentem excitados a entendê-los melhor.
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Percebi que o que chama atenção deles é destacar o aspecto final do processo com a seguinte frase: sociedades capitalistas são aquelas onde existem etiquetas de preço.
Esse resumo do resumo do que é capitalismo, e sua indissociável esquizofrenia, pega os caras sem respostas para um enunciado tão simples e axiomático.
Não tem como contradizer, mesmo sabendo que não é só isso.
É como aquela história do matuto que vê a água encanada e compra uma torneira, para descobrir que não é ela quem faz a água jorrar controladamente, mas encanta e intriga.
Por que em tudo existe preço?!
***
Não sei como externar a gratidão por ter esclarecido tão bem esse aspecto da teoria marxista.
.

celsolungaretti disse...

Caro leitor anônimo,

todo dia aprendo com o que escrevo, pois me exercito e sou induzido satisfatoriamente a ler em maior proporção em relação àquilo que escrevo.

A partir desta constatação, fico feliz por tê-lo como leitor do blog e, mais que isto, por se tratar de alguém que está aberto a aceitar proposições e delas duvidar (a dúvida é sempre virtuosa) para que possamos promover a constante superação daquilo que nos oprime e prosseguir com um norte libertário.

Um abração, Dalton Rosado.

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