Há exatos quatro meses atrás, neste artigo, eu já cravava o fim do governo Bolsonaro.
Mostrava o quanto duas tendências confluíam para azucrinar a vida do mandatário neofascista: de um lado, as investigações sobre seu filho; e, do outro, a absoluta incompetência política do presidente e de seu entorno. Destaco a seguinte passagem do que escrevi:
Mostrava o quanto duas tendências confluíam para azucrinar a vida do mandatário neofascista: de um lado, as investigações sobre seu filho; e, do outro, a absoluta incompetência política do presidente e de seu entorno. Destaco a seguinte passagem do que escrevi:
"O governo Bolsonaro, portanto, parece uma balbúrdia generalizada, sem ninguém saber direito quem manda ou o que se quer. Enquanto o objetivo era chegar ao poder, o discurso antipetista conseguiu manter uma certa unidade em suas hostes e camuflou, até certo ponto, o vazio político e programático de Bolsonaro e sua trupe. Porém, tendo agora de agir, a inocuidade vem à tona de modo escancarado".
Usei balbúrdia bem antes do pseudo ministro da Educação se apropriar do termo para destilar seu ressentimento contra as universidades.
Na verdade, o diagnóstico feito por mim em tal artigo era o mesmo que tinha feito à época das eleições e um pouco após estas. Bolsonaro e seu grupelho não poderiam nunca dar certo simplesmente porque não possuem a mínima coesão ou objetivo.
Conforme destaquei em dois outros textos — neste e neste — Bolsonaro nunca teve qualquer destaque positivo em sua longa trajetória política. Nunca liderou nada, articulou nada ou foi importante para o desfecho de coisa alguma.
Durante toda sua carreira limitara-se a ser um parlamentar dorminhoco que de vez em quando fazia discursos chocantes ou se comportava de forma truculenta.
Entender como foi possível sua vitória, creio não ser o mais complicado. A falência generalizada do sistema político brasileiro, com a implosão dos partidos — da esquerda à direita — abriu o caminho para a ascensão da figura que soube aparentar ser o antípoda de tudo que estava aí.
No entanto, se não é tão difícil entender como foi possível sua vitória, mais complicado é entender porque, afinal, Bolsonaro resolveu se lançar candidato. Talvez ele não acreditasse no sucesso e buscasse apenas ampliar seu raio de influência. Fica a investigação para biógrafos e historiadores profissionais.
Fato é que a chegada à presidência foi um tremendo passo para uma diminuta perna. O medíocre histórico político da figura juntou-se ao vazio programático para parir o caos.
Bastava ter dado uma corrida de olhos no programa do então candidato, ou o ouvido falar, para se ter a certeza de quem seria a pior escolha possível.
E digo isso não por uma avaliação ideológica, como se Bolsonaro estivesse apresentando propostas ruins para o país. Na verdade, não existiam propostas. Existia apenas um inapreensível gruído quase primitivo de puro ressentimento e ódio.
Era um puro espírito de aversão a qualquer conquista social dos últimos anos, mas não expresso de forma racional, discursiva, e sim de modo instintivo e raivoso.
Carregando o mito estavam não partidos, movimentos, sindicatos ou qualquer organização sólida, mas uma horda de alucinados predominantemente masculina, branca e rica.
No meio da bagunça, oportunistas de farda, toga e paletó viram o momento certo para levar adiante seus projetos pessoais, corporativos ou de classe. O idiota sem rumo seria domado por eles e ficaria relegado a fazer arminha com a mão e assinar papéis não lidos, enquanto o trabalho sério seria feito bem longe de sua influência.
Mas o turbilhão raivoso de Bolsonaro mostrou-se mais forte do que qualquer cálculo e logo engoliu a tudo. Sem saber o que fazer com o poder lhe dado pelas urnas, lançou-se a expelir sua bílis acumulada, comprando briga com quem havia dado as costas para ele. O monstro não pôde ser colocado sob controle.
Quando não há mais matéria para ser tragada, ele começa a definhar, pois a sua existência, caracteristicamente negativa, só é possível enquanto destruição.
Bolsonaro também: sua essência é negativa e não há nada positivo que possa estabelecer. Não tem proposta ou base parlamentar porque são construções positivas, absolutamente alheias à sua personalidade.
Nem mesmo uma ditadura é seu sonho maior. Seu sonho real, autêntico, já foi por ele revelado em sua famosa entrevista à TV Câmara: uma guerra civil onde morram uns 30 mil, pelo menos.
De positivo e estável só importa seu patrimônio pessoal e o poder de sua família. Trata-se do espirito do saqueador: rouba e destrói. Seu niilismo é orientado para anular o mundo enquanto aumenta seu próprio poder.
Bolsonaro não cairá porque seu governo derreteu. Cairá porque ele é insustentável por essência. Sempre o foi. A presidência, a vida institucional, a construção de políticas públicas, o jogo de alianças e negociações, nada disso entra na perspectiva bolsonarista.
Nela, só cabe o poder familiar masculino. Fora dele, há apenas o nada. O vício é de origem e não de desvio de rota.
É hora de ser bisado este célebre editorial de capa? |
Quanto mais o país persistir com essa figura no poder, mais se afundará e mais atiçará o desejo destrutivo perverso do presidente neofascista. Ele se alimenta da negatividade.
Nesta altura, o basta! é um ato de vida. (por David Emanuel de Souza Coelho)
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