terça-feira, 20 de novembro de 2018

PARA QUANDO UMA NOVA INQUISIÇÃO?

joão pereira coutinho
LIÇÕES DE HISTÓRIA
Adeus, Colombo. Esta despedida não é uma citação erudita do livro homônimo de Philip Roth. É um adeus sincero à estátua em bronze do navegador, que era possível admirar no Grand Park, em Los Angeles.

Não mais. Organizações indígenas opuseram-se ao ultraje e a cidade agiu em conformidade, removendo a maléfica estátua. Colombo não tem uma biografia imaculada; e os descendentes dos descendentes dos indígenas americanos não esquecem a violência que os descobridores europeus cometeram sobre os antepassados. 

O caso não é novo. Regularmente, lá encontramos mais uma notícia sobre uma estátua que os contemporâneos não suportam. Se a biografia não permite canonizar o personagem, fogueira com ela.

Tudo isso me provoca um pasmo imenso. Por dois motivos. O primeiro é a ingenuidade dos meus contemporâneos. Eles partem sempre do pressuposto de que a história se divide em opressores e oprimidos, uma caricatura da caricatura marxista original.

A história, e as evidências que ficaram dela, mostra o contrário: não há inocentes. Todo o processo histórico é uma lista de barbáries entre povos —e, óbvio, no seio de uma mesma sociedade. Será que por detrás de uma grande riqueza há um crime, como escrevia Balzac?

Verdade. Só que essa máxima não se aplica apenas a uma civilização em particular. Aplica-se a todas elas em algum momento da sua evolução —e evolução é a palavra, até no sentido darwinista do termo.  

A ideia de que os descobridores europeus desembarcaram em solo sagrado, onde não havia maldade ou cobiça, não é só de um paternalismo fantasioso. É um grosseiro erro histórico.

Mas existe outro: a redução de um fenômeno tão complexo como os descobrimentos dos séculos 15 e 16 à sua dimensão mais cruel. Que os descobrimentos tenham permitido também uma revolução tecnológica e científica que praticamente forjou o mundo moderno, eis uma heresia que poucos se atrevem a sussurrar.

Não admira que, perante esse clima de censura e autocensura, o mundo acadêmico se prepare para receber, no próximo ano, o periódico The Journal of Controversial Ideas.

O projeto tem no seu conselho editorial nomes como Peter Singer e Jeff McMahan. O objetivo é meritório: publicar, anonimamente, autores que temem pelas suas carreiras se os seus estudos não se ajustarem ao cânone politicamente correto. 

É o paradoxo do nosso tempo: tão progressistas na aparência e tão medievais nos procedimentos. Para quando uma nova inquisição?
(por João Pereira Coutinho)

"Viva Cristóvão Colombo / Que para nossa alegria / 
Veio com três caravelas / A Pinta, a Niña e a Santa Maria"

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