segunda-feira, 27 de agosto de 2018

BOLSONARO É "MUITO TOSCO", MAS A EXTREMA-DIREITA ACABARÁ ENCONTRANDO UM LÍDER MAIS APTO, ALERTA BORIS FAUSTO

"Estamos à beira do abismo, em uma situação muito complicada. Há uma crise institucional muito grave. Há uma incerteza com o resultado da eleição. E existem candidatos que são, ao menos um candidato notadamente [Jair Bolsonaro], muito preocupantes.

Ele vem de uma coisa inegável, que não chegamos a perceber, que foi o avanço da extrema-direita. O Bolsonaro vem nessa onda. Ele é, nitidamente, um candidato que hoje entrou no jogo, mas que também aceita regras fora do jogo democrático.

O que levou a isso [o fortalecimento da extrema-direita] foi a corrosão do jogo democrático. Corrupção, descrença nos candidatos e nos partidos, seja à esquerda ou à direita. Isso proporcionou o avanço da extrema-direita e o crescimento da ideia de um regime forte. 

Essa ideia vem sempre associada aos militares, porque, na cabeça de alguns, se alguém tiver de implantar um regime forte são eles, os militares. Tem também muita gente jovem que apoia o Bolsonaro e não conheceu a ditadura. 

E mais grave: gente que conheceu a ditadura e diz que é isso mesmo. É um eleitorado que diz que cansou dos políticos de centro, dos bem comportadinhos, dessa esquerda que é muito demagógica. 

Quando você vota por ódio ou por raiva, os riscos são muito altos. Se estoura tudo, o caos é instalado e as consequências tendem a ser autoritárias. 

Ainda assim, mesmo que chegue ao 2º turno, parece difícil que o Bolsonaro ganhe a eleição. Na França, as pessoas se assustaram quando Marine Le Pen [candidata ultradireitista ao governo francês] chegou ao 2º turno [em 2017] e se juntaram nas candidaturas enquadradas dentro da normalidade.

[sobre Bolsonaro ser ou não um fenômeno efêmero] Diria que Bolsonaro é uma má personificação, é muito caricatural. Isso pode agradar a um setor, mas, para articular um movimento, esse homem é muito tosco. 

Uma corrente de extrema-direita vai persistir, mas outro alguém vai encarnar essa corrente, alguém que não ensine uma criança de 5 anos a atirar.
O risco de intervenção militar, acho menor do que em 1964. Mas o risco de uma descida aos infernos por uma via autoritária que seja, até certo ponto, formalmente democrática tem chance de ocorrer como nunca.

[Sobre a possibilidade de a eleição pacificar o país] Vai continuar dividido e polarizado. Vamos dizer que o Bolsonaro seja eleito. Como se estabiliza isso, com as características desse homem? Quem vai governar, o Posto Ipiranga [o economista Paulo Guedes]? É crise mesmo. 

O Alckmin é o que tem mais condições de levar a política para frente, mas é muito a velha política. Não é nada muito animador."
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(trechos de entrevista do historiador e cientista político Boris Fausto à revista Exame; a
íntegra pode ser acessada aqui)

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