terça-feira, 6 de março de 2018

SEUS DIREITOS SÃO VIOLENTADOS E A DIREITA DE DOIS PAÍSES TUDO FAZ PARA LEVÁ-LO AO SUICÍDIO OU À LOUCURA

Mauricio Hernandez Norambuena, que se tornará sexagenário daqui a um mês, é um professor chileno que pegou em armas contra a bestial ditadura de Augusto Pinochet e foi depois preso no Brasil por comandar o sequestro do empresário Washington Olivetto.

Segundo seu advogado brasileiro, Antônio Fernando Moreira Norambuena está hoje num limbo jurídico (ou seria melhor dizer um pesadelo kafkiano?) que impede sua repatriação, além de sonegar-lhe vários direitos inerentes à sua condição de prisioneiro no Brasil:
"Estrangeiro, preso desde fevereiro de 2002, teve sua extradição autorizada para o seu país de origem em 2004. Extradição que nunca pôde ser efetivada, pois o Chile não comutou as penas de prisão perpétua [teria de reduzi-las ao máximo admitido pelas leis brasileiras, 30 anos]. 
No Brasil foi condenado à pena de 30 anos pelos crimes de extorsão mediante sequestro, tortura e quadrilha. 
Em 2007 foi determinada sua expulsão do País. Contudo, a efetivação da medida foi condicionada ao cumprimento da pena a que estiver sujeito no País ou à liberação pelo Poder Judiciário...  
Não pode receber refúgio no Brasil, pois a Lei 9.474 diz que ‘não se beneficiarão da condição de refugiado os indivíduos que (inciso III) tenham cometido crime hediondo’.  
O tratado de transferência de presos entre Brasil e Chile também não pode ser cumprido, por falta de compromisso do Chile em comutar a pena de prisão perpétua. 
Por último, foi negada sua progressão de regime sob o argumento que é estrangeiro expulso. 
Em suma: é extraditado, mas não pode ir para a nação requerente (sua pátria); é expulso mas não pode sair do País; não pode sair do País, mas também não pode progredir de regime pois não poderia trabalhar/residir no País.
Prisão de Mossoró: um detento foi achado morto em outubro
Apesar de o reclamante ter cumprido o requisito objetivo (um sexto da pena) há mais de uma década, sempre são exigidos novos requisitos contra si, como o fato de ele ser estrangeiro expulso.  
Sua situação de saúde também não é boa. A saúde mental está acabada, depois de cinco anos no odioso Regime Disciplinar Diferenciado (...), regime considerado por quase toda a comunidade jurídica – nacional e internacional – como pena cruel, desumana e degradante.
Apesar de não estar mais submetido a este covarde regime, ainda está custodiado em penitenciária federal, ficando em isolamento 22 horas por dia, com restrições de informação (censura de livros e revistas, proibição de assistir TV, ouvir rádio, etc.), violação de correspondências e recebendo visitas raramente.  
Sem dúvida, é irreparável o dano que vem sofrendo..."
No último dia 19 o juiz corregedor da Penitenciária Federal de Mossoró (RN), Walter Nunes da Silva Jr., autorizou por mais um ano a permanência de Norambuena naquele estabelecimento penal de segurança máxima, no qual os prisioneiros só deveriam permanecer em caráter excepcional e por prazo determinado de 360 dias, de tão devastadoras que são as consequências desse encarceramento desumano.

A lei, nº 11.671, de 2008, admite, contudo, que tal prazo seja "renovável excepcionalmente, quando solicitado motivadamente pelo juízo de origem".

E o corregedor Silva Jr., embora admitindo que "a inclusão do preso em presídio federal é uma excepcionalidade" e que "a renovação do prazo de permanência é a excepcionalidade da excepcionalidade", tomou uma decisão baseada unicamente no passado de Norambuena, embora o diretor do atual presídio tenha atestado seu bom comportamento carcerário. Eis a justificativa:
"...não há como manter [num presídio estadual] um condenado, reconhecido ex-guerrilheiro, dono de toda sorte de conhecimento sobre técnicas militares e de guerrilhas, hábil em persuadir e altamente capaz de liderar em prisão comum. 
Diante disso, constata-se que a permanência do preso no Sistema Penitenciário Federal é medida que se impõe para afastá-lo da proximidade diária com componentes de associações criminosas, de modo a desarticular qualquer tipo de ato ardiloso que seja nocivo à normalidade social".
Assim, a excepcionalidade da excepcionalidade, que dura desde julho de 2010 (antes, como foi dito, ele estava em condições piores ainda, se isto for possível, pois submetido ao RDA), se estenderá até 2019.

Enquanto isto, Mario Carroza, um eminente magistrado da Corte de Apelações  de Santiago, decidiu no último mês de julho iniciar a prescrição gradual das penas que Norambuena ainda tem pendentes no Chile, o que atenderia ao requisito de nossa justiça para que ele pudesse ser enviado para seu país de origem.
O apelo de Esquivel caiu em ouvidos moucos. Afinal, ele é Prêmio Nobel da Paz...
No entanto, a direita chilena conseguiu reverter a decisão de Carroza com um recurso. Impossibilitou, assim,  que Norambuena cumprisse sua pena sem estar submetido a rigores extremos e passasse a receber o carinho de parentes, amigos e correligionários. Por lá, voltou tudo à estaca zero.

E é a mão da direita brasileira que está por trás de seus tormentos em nosso país, segundo a análise que ele fez no livro Un paso al frente (Ceibo Ediciones, 2016, 252 p.):
"A razão de tamanho rigor, creio, seria a operação que realizamos no Brasil. A pessoa que sequestramos é muito influente aqui e seus sócios em nível empresarial, de São Paulo, são bem poderosos, têm influência em todas as instâncias do país, tanto as jurídicas quanto as políticas. 
Tais empresários comentaram que, enquanto eu estivesse no Brasil, fariam todos os esforços necessários para que eu cumprisse minha pena nas piores condições possíveis".
Mesmo quem, como eu, faz restrições a Norambuena ter efetuado no Chile e no Brasil redemocratizados ações que só seriam aceitáveis durante a resistência às ditaduras a que foram submetidos os dois países, não pode fechar os olhos à perseguição rancorosa que os direitistas de lá e de cá movem contra ele, marcadas por gritantes arbitrariedades e um chocante desrespeito a seus direitos como prisioneiro.

Quem não move uma palha para evitar que, idoso e alquebrado, ele continue sendo submetido a rigores extremos, como se por um passe de mágica ele pudesse se transformar no homem que era 16 anos atrás, perde o direito de se considerar um defensor dos ideais de esquerda e dos direitos humanos.

O que se pede não é sua liberdade, mas, apenas, que se permita a Norambuena cumprir sua pena como um detento do século 21, não como um farrapo humano numa masmorra medieval. (por Celso Lungaretti)   

Um comentário:

Vitorio Malatesta disse...

Michelle Bachelett, presidente do Chile por por dois mandatos, cujo pai morreu nas masmorras de Pinochet, no seu segundo mandato 2014/2017 não deu, não interessou-se, em dar passos a resolver, na ordem jurídica de seu país, esse drama de Norambuena.
Aliás, antes de tomar posse no segundo mandato ia nomear para ministérios estratégicos, políticos, homens de direita, comprometidos com reacionarismo. Recuou, devido pressão popular. Seus dois mandatos não foram sequer sombra esmaecida do governo de Salvador Allende.

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