terça-feira, 2 de agosto de 2016

CONSCIÊNCIA SOCIAL, A ÚNICA FORMA EFICAZ DE COMBATE À BARBÁRIE CAPITALISTA.

"Não aceites o habitual como coisa natural, pois em tempos de desordem sangrenta,  de confusão organizada, de arbitrariedade consciente, de humanidade desumanizada, 
nada deve  deve parecer natural, nada deve parecer impossível de mudar" (Bertolt Brecht)
.
A sociologia, imbricada com a filosofia, explica que a escravidão é consensual, por mais coercitivas  e bárbaras que sejam as imposições do escravizador. O escravo somente é escravo porque se submete à escravidão, pois se todos os escravos se negassem a sê-lo, a própria tentativa de escravizá-lo se tornaria inócua, sendo abandonada. 

É claro que, quando a morte é a única opção à escravização, o ser humano tende a optar por esta última, uma resultante racional; mas, ainda assim, ela é fruto de um consentimento que lhe foi forçado, imposto, mas aceito. 

Se assim é, muito mais consensual se afigura a servidão voluntária, aquela em que o escravizado adere ao objeto teleológico do escravizador – que, como o próprio nome está a dizer, decorre de um ato consciente da vontade de agir, ainda que seja fruto de uma inconsciência sobre a essência e da existência da escravização. 

É o que ocorre com os indivíduos sociais submetidos à vida social mercantil, os quais aderiram à mediação social pela forma valor, do dinheiro e das mercadorias (não sem resistências nos seus momentos iniciais de introdução generalizada do trabalho abstrato como necessidade causada pela guerra). 


Sob o capital, todos os trabalhadores são servos voluntários; paradoxalmente, no atual estágio do desemprego estrutural, clamam desesperados (juntamente com seus sindicatos) por mais acesso à servidão voluntária, ou seja, clamam por mais escravização pelo trabalho abstrato. Vivemos socialmente na inconsciência da natureza da nossa própria relação social. 


Reproduzimos cotidianamente um modo de ser social sem termos noção da sua gênese constitutiva e sem termos a exata noção do que está subjacente aos efeitos deletérios desse mesmo modo de ser social. 

Acostumamo-nos a atribuir às mais diversas causas periféricas o quadro de barbárie social explicitado no caos da violência urbana e do sistema jurídico/prisional; no desastre do sistema de saúde, educacional e da cultura; nas míseras aposentadorias; no aumento da fome; na paralisia do trânsito e na precariedade do sistema de transporte coletivo urbano transporte; na falta de habitação e saneamento básico; nos crimes ecológicos; na ridicularização da virtude e em muitas outras mazelas sociais mais. 


Passamos batido pelo fato de que há uma causa fundamental, comum a todas elas. Vivemos numa eterna transferência de responsabilidade para os ombros daqueles em quem nós votamos, seja para os cargos executivos ou legislativos, e nos limitamos a reclamar da inépcia dos governantes e legisladores, sem conhecermos a natureza mesma daquilo que mais desejamos obter: o dinheiro. E o que é pior, pensamos conhecê-lo profundamente.
O bezerro de ouro é o verdadeiro deus do capitalismo
Se perguntarmos a qualquer transeunte porque cédulas de iguais tamanhos, mas com a impressão de números diferenciados (cédula de 2 reais e outra de 100 reais) emitidas pela cada da moeda, são por todos aceitas como valores diferenciados numa convenção social válida, ele dificilmente saberá explicar. 

Entretanto ele aceita esse critério como válido, mesmo sem conhecer a mecânica do controle monetário mercantil estatal e muito menos a natureza da negatividade intrínseca da relação social valor-trabalho expressa na moeda. Assim, desconhecemos a natureza do nosso maior objeto de desejo. Isso se chama
inconsciência social.    

Acordamos diariamente, todos nós, para produzir valor monetário (a mercadoria dinheiro) como único modo de satisfação das nossas necessidades de consumo. Elegemos o dinheiro como meta a ser alcançada (todos nós, uns mais e outros menos) e nos submetemos, como servidores voluntários, à dinâmica cega de sua reprodução, sem a conhecermos na sua essência constitutiva. Adoramos o que não conhecemos. 

Aliás, não poderia ser diferente. Nas escolas e academias nada nos ensinam sobre a verdadeira constituição, reprodução e dinâmica dessa relação, e muito menos sobre a sua negatividade (nem os professores o sabem). Ao contrário, somos condicionados a enaltecer o valor e o trabalho abstrato como se fossem dados ontológicos da existência humana; virtudes incontestáveis; fontes de dignidade humana; tão indispensáveis e essenciais como o ar que respiramos ou a água e o alimento que nos mantêm vivos. 

A passividade e a impotência de superação das mazelas sociais e ecológicas que ora nos afligem residem na inconsciência sobre a verdadeira natureza negativa da relação social sob a forma valor, que tem o trabalho abstrato como sua substância primária, e as mercadorias como suas expressões materializadas. Ao invés de superá-la, somos induzidos a aperfeiçoá-la e, consequentemente, materializa-se de modo fetichista a inconsciência coletiva sobre a dinâmica subtrativa, destrutiva, autodestrutiva e escravista da lógica do valor. Assim, como cegos tateando no escuro "seguimos a todo vapor rumo ao abismo" (Robert Kurz).     
            
As revoluções armadas marxistas-leninistas que se dispunham a derrotar o capitalismo pelas armas, mais não fizeram do que alterar a forma política liberal da vida mercantil do capitalismo tradicional pela forma política do capitalismo de estado, e mal se entronizaram no poder, eis que o estado passou a ser o único explorador da mais-valia, conservando todas as categorias capitalistas que dizia combater (valor, trabalho abstrato, dinheiro, mercado, partido, controle monetário estatal, etc.), com governos mais ou menos despóticos, dependendo da vontade da direção governamental. 

A queda do muro de Berlim representou a necessidade da quebra de uma das últimas fronteiras da expansão capitalista, e não o seu apogeu. Isso significa que não é a força das armas o instrumento-mor da revolução social, até porque uma força armada significa necessidade de manutenção manu militari da nova ordem estabelecida e tida pretensamente como a melhor (que pressupõe o soldo militar, em dinheiro), e não a defesa da vontade coletiva consciente e livre. 

Bastaria que todos os trabalhadores ficassem em casa, sem dar nenhum tiro, conscientes do seu querer, e acabaríamos com todos os exércitos que sustentam a exploração capitalista no planeta. (por Dalton Rosado)

8 comentários:

Valmir disse...

dinheiro é mesmo um negocio horrível: imagina..tenho de ter dinheiro pra comprar um carro.
No paraíso socialista eu somente precisaria de ..dinheiro e da autorização do chefe do comitê revolucionário - como em cuba - de meu distrito, que pode perfeitamente ser um maniaco que não goste de mim pq cobiça minha mulher...pq será que prefiro o sistema onde somente o dinheiro importa????

SF disse...

Dalton,
Isto de o desemprego estrutural fazer o trabalhador implorar por trabalho é uma realidade.

Segui o caminho tradicional de formação e, ao final, estava desempregado.
Arranjei um estágio, mas só durou um ano e fali.
Foi a minha primeira falência.

Lembro o dia em que estava na lona absoluta e entendi que, afinal, tinha feito a minha parte e a sociedade é não me queria.
Naquele dia pensei que poderia ficar na beira da praia (ser um "zé catraia") e ir pescar nos recifes, quando a maré baixasse, ou no mangue pegar caranguejos e siris (só para comer).
Fazer uns bicos e viver até morrer.
Mas, foi só eu pensar assim e oportunidades surgiram. Arranjei trabalho bom e remunerado.

Comprei um violão com o primeiro salário...

A experiência da falência me permitiu sonhar um novo modo de estar no mundo.

Será que existirão outros jovens sem emprego, sem dinheiro e falidos, mas com boa formação, que imaginem outra maneira de estar no mundo?
Será que eles já estão fazendo algo no sentido de não precisar de emprego, dinheiro e toda a traquitana mercantil?

Espero que sim.







celsolungaretti disse...

POSTANDO A RESPOSTA QUE O DALTON ENVIOU:

Caro SF,

Você é um bom exemplo de pessoas que conseguem enxergar na crise a superação dela mesma a partir de soluções fora da lógica capitalista em fase de decomposição orgânica. A palavra crise, deriva do grego, e significa, entre outras coisas, a gestação do novo, e é assim que deve ser.

O desemprego estrutural está a mostrar para todos nós que o mecanismo do dinheiro, e da falta dele, advindo da relação valor-trabalho, uma vez colapsado, deve proporcionar alternativas fora de sua lógica, e com o uso do saber adquirido pela humanidade, nos proporcionar posturas alternativas que viabilizem a vida, e não o aprofundamento da barbárie como está a acontecer (vide ataques no Rio Grande do Norte, como um exemplo entre muitos outros ao nosso redor).

Um grande abraço, Dalton Rosado

Valmir disse...

(vide ataques no Rio Grande do Norte, como um exemplo entre muitos outros ao nosso redor).
grande Celso meu herói...então a turma que ta tocando o terror em Natal e no restante do estado do RGN são honestos trabalhadores desempregados cansados da fila do SINE, que, desesperados por não poderem por comida na mesa dos filhos se tornam "desperados" como Lampião e seu bando...quem diria hein???!!!

celsolungaretti disse...

Valmir, este seu papo é com o Dalton, não comigo. Cada um na sua.

celsolungaretti disse...

EIS A RESPOSTA QUE O DALTON PEDIU PARA EU POSTAR:

Caro Valmir,

Primeiramente quero agradecer a sua constante leitura dos meus artigos. Parece que você agora os está lendo integralmente, e isso deve ajudar no seu entendimento gradual sobre as questões que levanto.

Os países socialistas, como vai afirmado nos meus artigos, praticaram o capitalismo de estado, pois não aboliram as categorias capitalistas fundamentais, como por exemplo o dinheiro, e as demais (valor, mercadorias, trabalho abstrato, mercado, controle monetário estatal, estado forte, política, direito civil mercantil, etc.). Nesse sentido a sua crítica aos socialistas vai ao encontro do que eu tenho defendido.

A nossa divergência é que você quer a preservação do dinheiro sob a forma política do capitalismo liberal, justamente no momento do seu definhamento, e eu quero a sua superação completa, juntamente com a política, e antes que ele se torne mercadoria podre (como o dólar, que é por todos aceito por ignorância ou conveniência, e somente até o dia em que se evidenciar a sua inconsistência como representação do valor e fazer voar pelos ares toda a economia mundial) e nos leve a todos de roldão.

É sempre bom para quem escreve saber que tem leitores, e nesse sentido eu agradeço a sua participação, inclusive porque as suas manifestações permitem que eu esclareça temas incompreendidos.

Quanto à questão da criminalidade e a sua opinião sobre o combate aos bandidos quero dizer que:

- primeiramente não considero que o crime seja desculpável, mas deve ser compreendido nas suas causas originárias para que possamos combatê-lo com eficacia. A barbárie não é saída para nenhum problema social e deve ser tratada com seriedade em todos os seus aspectos e sem escamoteamento da realidade na qual está inserida;

- em segundo lugar, que dizer que em todos os estados brasileiros, vem ocorrendo um vertiginoso aumento da criminalidade, o que demonstra que não é o caso de má administração na questão da segurança pública desse ou daquele governo, apenas, mas um fenômeno social, que a meu ver ocorre pela conjugação de vários fatores, sendo o principal deles a completa exclusão social de segmentos empobrecidos, principalmente dos jovens, que formam o grande contingente da periferia, considerada como párias sociais, e que é composto pela geração "nem, nem", que não estuda e não trabalha, por inadaptação à produção tecnológica e pelo desemprego estrutural (vide os mais de 11 milhões de brasileiros desempregados, aí incluídos até muita gente bem formada). São os supérfluos do capitalismo, e o Estado não tem mais como processar e prender tanta gente que infelizmente entra para senda do crime, pois a prisão de um criminoso é muito cara para o Estado. Acresce-se a isso a questão do consumo e tráfico de drogas, mercadorias cobiçadas pelo mercado clandestino do crime, que é o estímulo da falsa e ilusória oportunidade de ganho para muitos jovens da periferia sem oportunidades (você leu o meu artigo sobre as drogas e armas como mercadoria?).

Um grande abraço, Dalton Rosado.

Valmir disse...

ok..celso
Devo dizer a seu favor que em minhas manifestações em seu blog sempre fui tratado com consideração e respeito apesar de ser sempre dissidente de suas opiniões. Mas admiro muito quem, como vc, tem convicções e coerência...coisa quase inexistente nos que se dizem de esquerda em nosso país. Alias, de certo modo vc me decepciona quando não me censura como fazem todos os outros blogs de esquerda - eu disse TODOS - aí eu poderia te por no mesmo mesmo saco dos sacripantas, toscos proto-stalinistas a soldo do sistema de poder que pululam como praga na internet. Mesmo me manifestando como sempre faço, de modo respeitoso e com argumentos fundamentados sempre me censuram ao discordar de sua cantilena a favor. Enfim queria destacar que minha interação com seu espaço se deve a isso. Boa fé e coerência de sua parte. Grato;

celsolungaretti disse...

Valmir,

quando coloquei como um dos propósitos do blogue a prática do pensamento crítico, não era retórica bonita para enfeitar a página inicial.

Eu acolho exatamente quem, do outro lado, tem coisas inteligentes para dizer e o faz de forma respeitosa, sem achincalhes.

Não vejo motivo para colocar no ar quem simplesmente efetua o recorte-e-cola, ou seja, copia textos de autores direitistas conhecidos e vem apresentá-los como se fossem comentários de sua própria autoria; nem em aprovar baixarias furibundas.

Você, enquanto discutir civilizadamente, terá sempre guarida por aqui.

E o Dalton, mesmo quando incomodado por seu comentário, tem respondido a tudo. Não somos adeptos da postura arrogante de ignorar quem nos contesta.

Abs.

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