sexta-feira, 24 de junho de 2016

INGLATERRA FORA DO REINO UNIDO É UMA REGRESSÃO AO NACIONALISMO ARCAICO DO COMEÇO DA EXPANSÃO CAPITALISTA

Por Dalton Rosado
"Olho por olho e o mundo 
acabará cego" (Mahatma Gandhi)
Qual é a moral das relações sociais mundo afora? A correta resposta a esta indagação pode ser definidora do que somos. E não pode haver outra, se não: 
"Sem que o queiramos ou entendamos, somos indivíduos sociais, ao mesmo tempo submetidos e construtores da submissão a/de uma moral de relação social segregacionista e desumana".      
Evidentemente que tal postura só podia mesmo ter uma trajetória e um final infeliz, que agora chegou, seja sob o ponto de vista da nossa subsistência material; dos nossos conceitos morais e éticos; do que sejam virtudes humanas; e da nossa própria existência física, ora sob as ameaças nucleares e ecológicas.      

Numa sociedade onde a moral básica se resume ao levar vantagem, ou seja, na subtração pelo capital do volume de valor produzido num determinado espaço de tempo (um roubo original) como modo de existência da própria forma de relação social, qual seja a forma-valor), tudo o mais está contaminado. 

Assim sendo, a ética da emissão da moeda, que deve expressar o valor ali quantificado, é consentânea com a moral que a orienta, não podendo, portanto, ter um conteúdo virtuoso do ponto de vista ético-moral. 
Comemoração de eleitores do Brexit 

E não tem. A questão cambial é a mais nova forma de guerra silenciosa, e diz respeito à manipulação da representação materializada do valor expressa na mercadoria dinheiro (o equivalente geral)  e quantificada num padrão monetário qualquer – a moeda (a outra representação se expressa nas mercadorias consumíveis).

Anteriormente, o padrão monetário, para ser acreditado, era lastreado pelo padrão ouro, ou seja, toda moeda poderia, teoricamente, ser convertida em ouro, metal tido como expressão do valor. Tal conceito já era equivocado, porque o que representa a substância do valor, riqueza abstrata, é a quantidade de trabalho abstrato (representado pelo próprio valor) coagulado nas mercadorias, que autorizam a emissão de moeda, e não a mercadoria ouro em si. 

Mas, como o ouro é uma mercadoria rara e imperecível, as moedas tinham, pelo menos, credibilidade, como se representassem valor-trabalho. Isso, porém, não invalidava a possibilidade de emissão de moeda sem o lastro ouro, o que de fato ocorria, graças à incompatibilidade da expansão monetária com a própria existência física do ouro. Havia certa hipocrisia quanto a essa questão, pois dificilmente se obedecia a tal critério rigorosamente.

A partir de julho de 1944, no final da guerra, o dólar passou a ser moeda internacional, supostamente lastreada em ouro, até que em 1971, a farsa se desfez, passando-se a adotar o critério da mera credibilidade fiduciária para a aceitação da moeda. 
Fim de uma época: o que era ruim deverá ficar pior.

Aí abriram-se as portas do inferno. O que se observa, hoje, é a emissão de dinheiro sem valor, principalmente do dólar americano, pois o meio circulante internacional em dólar não tem correspondência com o PIB estadunidense (vide o livro Gold and the dolar crisis, de Robert Triffin, que gerou o chamado dilema Triffin).   

Assim, como se acreditar no valor válido das moedas? O mundo capitalista, que mantém reservas cambiais em dólar, fica calado diante da perspectiva de um crash do dólar, pois teme o cataclismo que seria (e que vai ser) a evidência da total ausência de substância daquilo que têm nas contabilidades dos seus tesouros nacionais e nos cofres dos seus bancos centrais, bem como no sistema financeiro. 

A chamada guerra cambial, que se processa no mundo e que se constitui no mais novo sintoma do esgotamento de um modelo kafkiano (dada a surreal contradição de suas práticas), juntamente com as muitas guerras convencionais em curso, nada mais é/são do que a manipulação de preços numa guerra de mercado em fim de feira, literalmente, síntese do nosso atual negativo e exaurido modo de vida social. 

Nesse contexto, a Inglaterra, dentro da sua tradição histórica colonialista e como país promotor da primeira revolução industrial, quis manter-se fora da moeda da União Europeia temendo o seu fracasso, e agora optou por se colocar fora do mercado comum europeu, acreditando que pode se salvar da débâcle europeia. 
Big Ben, tão antigo (é de 1859) quanto  as ideias do Brexit. 

Tal decisão, além de representar uma regressão ao nacionalismo arcaico do começo da expansão capitalista, não encontra ressonância nos demais países do Reino Unido, podendo representar uma ruptura historicamente almejada por muitos dos habitantes da Escócia e Irlanda do Norte, principalmente; e não tem o condão de resolver o problema de base, qual seja a inviabilidade de um modo de produção por ela instituído no século XIX, que lhe deu bons frutos mas agora se tornou obsoleto. 

O que se observa na União Europeia não é uma situação diferente de todas as demais regiões do mundo. A criação do euro como moeda continental de países que pretenderam (e ainda pretendem) se constituir como capitalistas dominantes, tentando superar suas antigas e fratricidas desavenças por hegemonia mercantil e se fortalecerem como bloco fazendo frente ao dólar americano, deu com os burros n’agua

Isto porque apesar, ou em razão, de seus altos níveis de produtividade de mercadorias, além de serem desiguais internamente (Portugal e outros países europeus não têm o mesmo nível de produtividade da Alemanha, daí a impossibilidade de competirem em igualdade de condições no mercado comum europeu), não podem fazer frente aos baixos salários na produção de mercadorias dos países emergentes (Índia e China, especialmente) e patinam na estagnação, não obstante os estímulos da emissão de euro sem lastro. 
O leão tem tudo para virar gatinho
A renitente paralisia da economia do euro gerou níveis de desemprego preocupantes, principalmente entre os jovens que chegam ao mercado. Muitos desses jovens, alguns filhos de imigrantes das periferias, induzidos pela desesperança e discriminação, estão infelizmente sendo cooptados por fundamentalistas islâmicos bárbaros.

Tanto a criação de blocos econômicos visando à manutenção de mercados internos e fortalecimento econômico para enfrentamento da guerra de mercado, numa postura inversa ao nacionalismo do capitalismo emergente, quanto a manipulação das moedas, a chamada guerra cambial, como forma de busca da vitória de uns sobre os outros, já não podem dar respostas eficazes à desejada retomada do crescimento econômico. 

Apenas demonstram quão pode ser negativa a ética inerente à moral das relações sociais mercantis internacionais em seu estágio falimentar, surreal e bárbaro.

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