terça-feira, 6 de outubro de 2015

LUCIANA GENRO E A LEI DA MORDAÇA: É INCRÍVEL DILMA TER SANCIONADO UMA MEDIDA TÃO REACIONÁRIA!

Em 2012, encerrei a campanha para vereador de São Paulo com a certeza de que o sistema político brasileiro apodrecera em definitivo, tendo, portanto, a participação em processos eleitorais se tornado uma completa inutilidade para os revolucionários. Não há mais a mínima chance de anticandidaturas vingarem e as raras mensagens consequentes que consigamos inserir passam despercebidas em meio à enxurrada de mais do mesmo que inunda o horário do TSE. 

A esquerda que ainda pretende dar um fim à exploração do homem pelo homem, ao participar desse jogo com dados viciados, apenas coonesta uma democracia burguesa que hoje está mais burguesa e menos democrática do que nunca. É nas ruas que podemos mudar o Brasil, não na Praça dos Três Poderes.

Decidi, portanto, não participar ativamente de nenhuma agremiação que dispute eleições, pois considero que estão todas desperdiçando tempo e energias. Mantive a filiação ao PSOL por reconhecer nele um dos poucos partidos bem intencionados em meio à geleia geral e porque, afinal, não desertou das ruas, ao contrário de quase todos os outros. Ainda faz por merecer meu respeito, mesmo acreditando que, como o carimbador maluco do Raul Seixas, "não vai a lugar nenhum".  

E, no verdadeiro deserto de integridade, inteligência e talento que caracteriza o cenário político atual, a guerreira Luciana Genro é uma honrosa e raríssima exceção. Como romântico que sou, não conseguiria ficar indiferente às suas corajosas investidas contra os moinhos de vento. Sanchos Panças temos de sobra, precisaríamos de muitos Quixotes mais (como ela)!

Assim, reproduzo na íntegra o seu digno desabafo. Jamais poderia deixar de o fazer.

NENHUMA MORDAÇA 
CALARÁ NOSSA VOZ
Luciana Genro

Uma das conclusões mais evidentes das jornadas de junho de 2013 foi a falta de representatividade e credibilidade das instituições. Essa distância entre as ruas e as castas políticas só tem aumentado desde então. Recém-eleita, Dilma já tem 69% de reprovação nas pesquisas. O regime político, que já estava ruim, fica agora ainda pior.

Dilma sancionou a lei da mordaça, consagrando uma das mudanças mais antidemocráticas dos últimos tempos. Seu governo vai ficar marcado pela decisão de acabar com o último reduto de democracia real do processo eleitoral. Agora, só partidos com mais de nove deputados terão o direito assegurado à participação nos debates.

As eleições sempre foram um jogo de cartas marcadas pelo financiamento privado das campanhas, dinheiro que a Operação Lava Jato revelou não ser tão privado assim. Mesmo assim, sem os recursos das empreiteiras corruptas ou dos bancos, o PSOL conseguiu eleger cinco deputados federais em 2014.

Estamos acostumados a remar contra a maré. Mesmo que a lei mude e o financiamento privado termine, ninguém duvida que, na prática, o processo eleitoral vai seguir desigual. Seja pelo caixa dois, seja pela diferença abissal do tamanho do fundo partidário, do tempo de televisão e da cobertura da mídia. O PT, em 13 anos de governo, nada fez para mudar essa realidade.

Incrível mesmo é que uma medida reacionária como essa lei da mordaça seja sancionada pela presidenta Dilma Rousseff.

Seu partido tem bradado contra o crescimento da direita e tentado atrair o PSOL para uma frente "em defesa da democracia", mas ao mesmo tempo o governo fortalece a direita, negocia com Eduardo Cunha e aceita nossa exclusão dos debates eleitorais. Que democracia é essa que o governo Dilma defende?

Depois de polarizar com Aécio Neves no segundo turno das eleições, Dilma abraça o programa do PSDB e aplica um ajuste fiscal brutal contra o povo, cortando gastos da educação, saúde, moradia, e aumentando os juros pagos aos bancos, que lucram como nunca.

Também segue utilizando os mesmo métodos de fazer política, loteando cargos e colocando até mesmo o Ministério da Saúde no balaio das rifas partidárias, aceitando qualquer indicação do PMDB para uma das áreas mais importantes para a vida do povo.

Mas, saibam todos, nós não vamos desistir. Vamos lutar na Justiça contra a lei da mordaça, mas independentemente de estar ou não nos debates, o PSOL vai seguir incomodando e dizendo o que os de cima não querem ouvir.

Não seguimos o script dessa "democracia" formal, desenhada para manter sempre tudo como está. Seguiremos nas lutas, nas redes, nos processos eleitorais, oferecendo o PSOL como alternativa para todos aqueles que quiserem somar forças na luta contra este regime político distanciado das necessidades do povo e este modelo econômico que só serve ao 1% mais rico da sociedade.

Nenhuma mordaça calará a nossa voz, e nenhuma dificuldade engessará nossos pés. Seguiremos!

7 comentários:

SF disse...

Seu desencanto é bem compreensível, mas surpresa com o quadro político não. Vc deve ter lido o Mikhail Bakunin em "A Ilusão do Sufrágio Universal", que é um texto pequeno e eu pude ler e entender.
Bakunin deve ter conhecido os meandros do poder de sua época. E do que ele escreveu no texto destaco o trecho onde ele diz porque os mais promissores defensores do povo tornam-se seus carrascos: é só uma questão de perspectiva!
Parte do texto a que me refiro:
"Quem fala de poder político, fala de dominação. Quando existe dominação, uma grande parcela da sociedade é dominada e os que são dominados geralmente detestam os que dominam, enquanto estes não têm outra escolha, a não ser subjugar e oprimir aqueles que dominam. Esta é a eterna história do saber, desde que o poder surgiu no mundo. Isto é, o que também explica como e porque os democratas mais radicais, os rebeldes mais violentos se tornam os conservadores mais cautelosos assim que obtêm o poder. Tais retratações são geralmente consideradas atos de traição, mas isto é um erro. A causa principal é apenas a mudança de posição e, portanto, de perspectiva."

celsolungaretti disse...

Companheiro,

nem sempre é assim. P. ex., o governo de Salvador Allende se manteve revolucionário e teve de ser esmagado --bem diferente, portanto, do governo de Dilma, que já nem sequer sabe mais o significado da palavra "revolução", de tanto não utilizá-la, e está caindo de podre, melancolicamente.

Veja um comentário que fiz respondendo a um questionamento no post seguinte, sobre a esquerda antiga (que considerava mandatos eletivos, o de presidente incluso, como objetivos meramente táticos, que só valiam algo se fizessem avançar a revolução) e a atual (que fetichizou tais mandatos, passando a conferir-lhes importância desmesurada, mesmo quanto não estão servindo para nada de útil, como o atual da Dilma).

E, claro, quem encara conquistas eleitorais como meios e não como fins em si, continua atuando em outras frentes, pois sabe que a vitória real virá da conjugação de todas essas frentes de luta, não dos resultados das urnas.

Já a esquerda que se deixou mesmerizar pelo fascínio do poder, tende a sucumbir cada vez mais a ele, passando a defender seus aparatos e boquinhas como um cão defende seu osso. É mais ou menos o que estamos vendo agora, na lenta agonia de Dilma.

E. E. Maurício Murgel disse...

SO SE DESILUDE QUEM SE ILUDE...

SF disse...

Celso,
O exemplo que você citou do Salvador (olha o nome!) não se refere a uma relação de dominação, mas a um confronto no qual a parte melhor preparada ganhou.
O erro do Allende foi não estar preparado para este tipo de confronto e foi fragorosamente derrotado.
Imagino que na base desse erro em um indivíduo tão inteligente estava o ego, ele acreditou no personagem e morreu por isto.
Li uma vez um livreto da coleção Primeiros Passos entitulado "O que é Ideologia", de Marilena Chauí, no qual ela explica o que é uma relação [dialética] e um confronto entre adversários. Além de apontar como a ideologia faz parte da dominação e imobiliza o dominado.
No livro mais complicado e de frases quilométricas que já li (Pedagogia do Oprimido) o Paulo Freire demonstra que é ponto pacífico que ao opressor não interessa mudar nada cabendo ao oprimida começar algum tipo de mudança.
Ao meu ver, isto leva necessariamente a entender a ideologia que está implantada na cabeça do oprimido e levá-lo a ações de confronto contra o sistema que o oprime.
Não mais uma reflexão dialética, mas o confronto que exige estatégia e planejamento.
Primeiro a conscientização, depois a ação.
Neste ponto, divirjo completamente das abordagens de luta que você propõe: a luta armada ou a astúcia política. Não dá para ganhar do opressor nesses campos e, mesmo se ganhasse, perderia, pois a estratégia e as táticas utilizadas na "vitória" são provenientes e condicionam a opressão.
Vejo que as mais bem sucedidas experiências de gestão coletiva impõe a igualdade, a fraternidade e a cooperação e são utópicas neste momento evolutivo da espécie, portanto caberia a cada um ações libertárias individuais, as quais confesso não tenho a preparação suficientes para elaborar.
Minha cultura é pouca e tenho pouco acesso a informação relevante, mas lembro do filme Gandhi e a questão do sal, onde milhões individualmente foram a praia e fizeram sal, o que era proibido = desobediência civil.
Ou quando os negros da Africa do Sul ficaram 3 meses sem comprar uma caixa de fósforo.
Ou as pequenas ecovillas que estão pipocando na Grécia e na europa.
Taticamente há muito mais vantagens, e é melhor para, se todos forem sóbrios e céticos. A sobriedade talvez seja a melhor forma de confrontar o sistema opressor. O ceticismo pode ser o melhor discurso.
Ou aplicativos onde há escambo de horas de trabalho. Aliás, Chico Xavier propõe isto no livro Nosso Lar: que uma hora de trabalho, seja de quem for, tem o mesmo valor. E temos como fazer isto, mas algo nos impede.
Na minha opinião este "algo" é o ego, porém este é um conhecimento sutil.
Acredito que chegaremos a harmonia - ad augusta per angustia - pela dor.

A seleção natural não para de agir, só os mais adaptados sobreviverão e deixarão descendentes viáveis, seja em que ambiente for. Extinções fazem parte, especiações acontecem a partir delas.
Carpe diem!

celsolungaretti disse...

Salvador Allende foi derrubado por uma das mais terríveis articulações golpistas da História, envolvendo bilhões de dólares, sabotagem explícita e alarmismo insuflado ao extremo. Se você desconhece este aspecto, recomendo uma obra-prima do cinema chileno:
http://naufrago-da-utopia.blogspot.com.br/2013/10/assistam-ao-filme-definitivo-sobre-o.html

SF disse...

Vi o filme. Tristíssimo. Tocante.
Imagino, só imagino, o quanto lhe diz, vc q viveu todo esse movimento.
Acho entendi um pouco o que lhe move.

Qto ao filme cumpriu seu papel de contar a história romanceada. Achei difícil acompanhar os lapsos temporais no início, mas é devido a dislexia.

De minha parte acredito q não refutou o que eu disse quanto a não estarem preparados para o confronto com os militares. Perderam.

Quanto a um movimento popular tentar jogar o jogo político, ficou claro o jogo é muito sujo e para vencê-lo tem que jogar sujo ao preço de compurcar-se. Jogaram limpo, perderam de novo.

No entanto, deve ter sido ótimo o interegno. E só pela festa, antes do amargo fim, pode ter valido muito a pena.

Não é o que eu faria, mas aplaudo os que tem coragem de viver seus ideais.

celsolungaretti disse...

Companheiro,

quando o capitalismo se dispôs a apelar para aquele nível de bestialidade a fim de perpetuar sua dominação, não havia como os movimentos populares estarem melhor preparados. Mas, o governo de Allende foi um exemplo positivo de coerência com os ideais socialistas, tanto quanto o governo de Dilma Rousseff é um exemplo negativo.

Creio não existir dúvida nenhuma de que hoje a reação não responderia a um governo como o de Allende com um banho de sangue. Esta fase parece ter ficado para trás; quanto muito tentaria um "golpe paraguaio".

Mas, é muito triste para mim ver aquela que participou da resistência na mesma organização guerrilheira que eu hoje colocar o conselho de um banqueiro acima dos da esquerda do seu partido (refiro-me ao momento em que Dilma parecia finalmente disposta a exonerar o Levy mas, após uma reunião com o presidente do Bradesco, mudou de ideia, manteve o neoliberal trapalhão e resolveu fazer nova tentativa de ativar o ajuste fiscal, apenas para colher novo e retumbante fracasso).

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