Há alguns anos eu venho sendo adversário do PT, não em função de um inverossímil desagrado com o que ele tem de esquerda, mas sim por, coerentemente, não me conformar com o quanto ele deixou de ser de esquerda.
Seus rolos compressores virtuais, contudo, sempre confundiram esta nuance, colocando todos os opositores no mesmo saco de inimigos das conquistas sociais, quinta-colunas a serviço da burguesia, coxinhas, etc. Praticam um terrorismo pior do que estalar bombinhas onde não tem ninguém à noite.
Então, é com muito prazer que vejo o inconformismo com a direitização do PT --pois, noves fora, se trata disto-- aflorar em todos os cantos. O embuste acabou. O PT hoje desagrada tanto à direita que quer tomar-lhe o poder, quanto à esquerda que gostaria que ele fizesse um uso mais digno e coerente do poder. E confundir maliciosamente os dois universos não engana mais ninguém.
De quantos agora estão vindo a público expressar seu desencanto, um dos melhores texto é este Por que odiar o PT, do ator e escritor Gregório Duvivier. Vale a pena reproduzi-lo na íntegra:
A primeira vez que me deparei com uma urna eletrônica foi para votar no Lula. E Lula se elegeu, depois de três tentativas malfadadas. Lágrimas grossas escorriam pelo meu rosto: com a prepotência característica dos 16 anos, tive a certeza de que era o meu voto que tinha feito toda a diferença.
A rua estava cheia de pessoas da minha idade que tinham essa mesma certeza. O Brasil tinha acabado de ganhar uma Copa do Mundo, mas a euforia agora era ainda maior: foi a gente que fez o gol da virada. Parecia que o Brasil tinha jeito, e o jeito era a gente –essa gente que nasceu de 1982 a 1986 e votava agora pela primeira vez.
Acabaram-se os problemas do Brasil –a gente chegou. Lembro das ruas cheias, das bandeiras do PT, lembro de abraçar desconhecidos na Cinelândia –Lula lá, brilha uma estrela.
Logo vi que não era o meu voto que tinha feito o Lula se eleger, nem o dos meus amigos, nem o da minha geração. Quem elegeu o Lula –isso logo ficou claro– foi o José Alencar, os Sarney, o Garotinho, foi aquela Carta aos Brasileiros e a promessa de que o Lulinha era Paz, Amor e Continuidade. Sobretudo continuidade.
Lula só alugou esse apartamento por quatro anos porque assinou um contrato de locação onde prometia entregar o imóvel i-gual-zi-nho. E Lula, por quatro anos, foi um inquilino dos sonhos –tanto é que renovou o contrato e ainda foi fiador da locatária seguinte. Fizeram algumas mudanças –as empregadas passaram a ganhar mais–, mas não fizeram o mais importante: uma desratização. Muito pelo contrário: os ratos de sempre fizeram a festa.
Caros amigos que odeiam o PT: podem ter certeza de que odeio o PT tanto quanto vocês –mas por razões diferentes. Odeio porque ele cumpriu a promessa de continuidade. Odeio porque ele não rompeu com os esquemas que o antecederam. Odeio por causa de Belo Monte e do total descompromisso com qualquer questão ambiental e indígena. Odeio porque nunca os bancos lucraram tanto. Odeio pela liberdade e pelos ministérios que ele deu ao PMDB. Odeio pelos incentivos à indústria automobilística e à indústria bélica. Odeio porque o Brasil hoje exporta armas para Iêmen, Paquistão, Israel e porque as revoltas do Oriente Médio foram sufocadas com armas brasileiras. Odeio porque acabaram de cortar 3/4 das bolsas da Capes.
O PT é indefensável –cavou esse abismo com seus pés. Mas assim como não fomos nós que elegemos Lula, engana-se quem vai às ruas e acha que está tirando Dilma do poder. Quem está movendo essa ação de despejo são os ratos que o PT não teve coragem de expulsar. (Gregorio Duvivier)
2 comentários:
Os "puristas" cometem um erro básico de avaliação política. O PT nunca foi um partido revolucionário. Teve correntes que diziam ser revolucionárias como a Convergência Socialista (que foi expulsa e virou PSTU) e outros grupos, na maioria, trotskistas. Mas, nunca lutou pelo revolução socialista. Sempre foi um partido social-democrata clássico no estilo europeu. Isso, antes dos sociais-democratas europeus não conseguirem resolver a crise do keynesianismo no anos 70, e serem jogados para a direita pela avalanche neoliberal, nos anos 80 e 90. O que o PT sempre quis e ainda quer é que o povo tenha emprego, possa fazer um churrasquinho e tomar uma cervejinha no fim de semana e colocar seus filhos na faculdade. Exatamente o que encaminhou a política petista no Planalto. Portanto, os "desencantados com o PT" cometem o mesmo erro da "esquerdinha" pseudo-radical que tanto o Darcy Ribeiro criticava. Acreditam que reformista é "lacaio" e a "prova" é fazer coalizão com partidos do campo da burguesia como PDT, PR e PMDB. Povão só poderia fazer 3 refeições por dia depois da revolução.
s "puristas", esses ingênuos, cometeram o erro crasso de levar o PT a sério, eacreditando que aquilo que estava escrito no manifesto de fundação era pra valer:
"As riquezas nacionais, que até hoje só têm servido aos interesses do grande capital nacional e internacional, deverão ser postas a serviço do bem estar da coletividade...
O PT lutará por todas as liberdades civis, pelas franquias que garantem, efetivamente, os direitos dos cidadãos e pela democratização da sociedade em todos os níveis...
...O PT buscará conquistar a liberdade para que o povo possa construir uma sociedade igualitária, onde não haja explorados nem exploradores. O PT manifesta sua solidariedade à luta de todas as massas oprimidas do mundo"
Social-democracia quer apenas arrancar umas migalhinhas dos capitalistas e botar na mesa do povo. Quem promete ajudar o povo a construir uma sociedade igualitária é revolucionário.
E se prometeu e não cumpriu, é um salafrário.
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