quarta-feira, 1 de julho de 2015

ELIO GASPARI, SOBRE DILMA E OS DELATORES: "O PT ENFIOU-SE NESSE MUNDO DE PIXULECOS PORQUE QUIS".

Na mesma linha do meu artigo ¿Por qué no te callas, Dilma?, o jornalista e historiador Elio Gaspari fulmina uma das declarações mais infelizes da presidenta Dilma Rousseff, neste momento em que ela se mostra visivelmente transtornada com a queda vertiginosa de sua popularidade. A qual, contudo, não será revertida com destempero emocional e rompantes demagógicos. Urge recobrar a serenidade.

DILMA E OS DELATORES
Elio Gaspari
Um dos enigmas do comportamento político de Dilma Rousseff está na sua capacidade de viver numa realidade própria. É a essa característica que se deve atribuir parte do descrédito que acompanha sua administração. Diz uma coisa, faz outra e vai em frente. Recuando quase meio século na história do país para manipular os desdobramentos da Operação Lava Jato, a doutora afirmou o seguinte:
"Eu não respeito delator, até porque estive presa na ditadura militar e sei o que é. Tentaram me transformar numa delatora. A ditadura fazia isso com as pessoas presas e garanto a vocês que resisti bravamente."
Mistificando o presente, associou o comportamento de quem passa pela carceragem de Curitiba com o dos presos do DOI durante a ditadura.

"Nenhum deles pensava em aumentar seu patrimônio"
Seu paralelo ofende o Ministério Público, o Judiciário e o Supremo Tribunal Federal, que homologa cada um dos acordos onde estão as confissões.

Nenhum preso da Lava Jato passou por qualquer constrangimento físico. Até agora, todos os atos praticados pelos investigadores respeitaram o devido processo legal.

Deixando-se essa questão de lado, o que não é pouca coisa, vai-se ao coração da fala: "Eu não respeito delator". Num lance de autoexaltação, lembrou que "resisti bravamente". Ela sabe que o comportamento de um preso sob tortura nada tem a ver com sua bravura. Relaciona-se apenas com o caráter do torturador e do regime a que ele serve. 

Quem fala sob tortura não é delator, é apenas um cidadão torturado e a doutora respeita muitos deles. Dilma Rousseff, a "Wanda" do Comando de Libertação Nacional, sabe que o "Kleber" não foi um delator. Em 1969, depois de ter sido torturado por vários dias, ele indicou para a polícia o endereço de um aparelho da rua Atacarambu, em Belo Horizonte, onde estavam sete de seus companheiros. 

Dos milhares de presos torturados durante a ditadura, talvez não tenham chegado a uma dezena aqueles que, livres, continuaram colaborando com os agentes da repressão. Se os acusados que estão colaborando com a Lava Jato são mentirosos, não merecem respeito e seus acordos devem ser cancelados. Insultá-los leva a lugar nenhum.
"Os empreiteiros buscavam o enriquecimento pessoal"

Misturar empreiteiros milionários com militantes torturados é um truque que desmerece o estado de Direito e o regime democrático de hoje. Nas palavras de um ministro do governo Médici, referindo-se aos presos de seu tempo, "a delação, para eles, é o supremo opróbrio".

Outro hierarca elaborou o lance seguinte: Os presos, tendo delatado, justificavam-se inventando que haviam sido torturados. Donde, não havia tortura, mas delatores. No paralelo de Dilma não haveria roubalheiras, mas delatores que não merecem respeito.

Há ainda outra diferença entre os presos que eram torturados nos DOI e os que passam pela Lava Jato. Uns sequestravam diplomatas, assaltavam bancos e roubaram o cofre onde a namorada de um ex-governador de São Paulo guardava dois milhões de dólares, parte dos quais vindos de empreiteiras. Seus alvos faziam parte do arco de interesses que todos, inclusive a doutora, pretendiam destruir. Nenhum deles pensava em aumentar seu patrimônio. Os empreiteiros da Lava Jato buscavam o enriquecimento pessoal e o PT enfiou-se nesse mundo de pixulecos porque quis.

8 comentários:

Sonia disse...

Parabéns, novamente.Agora citando textualmente um aspone do Golbery.

celsolungaretti disse...

Não sou religioso, portanto passo longe de desqualificações, satanizações, pecados capitais, etc. É coisa de pessoas inseguras, incapazes de se defrontar com a reflexão que os autores propõem. Mais fácil botá-los no index, como a Igreja fazia na Idade Média.

O Golbery ofereceu ao Gaspari os extensos arquivos do Geisel, verdadeiro tesouro para um historiador. Em si, nada havia de errado: afinal, ficar conhecendo o que rolou nos bastidores dos grandes acontecimentos ajuda-nos a interpretar e entender a história deste país.

O xis da questão é: foi exigida alguma contrapartida do Gaspari? Se houve algo assim, podemos criticá-lo. Caso contrário, não.

O que não se pode é IMPUGNAR o que ele escreve sem DISCUTIR o que ele escreve.

E, no caso, o que ele escreveu é muito bom. Defendeu a dignidade da resistência à ditadura, contra o oportunismo da Dilma, que apela para a demagogia mais rasteira na tentativa de desacreditar um acusador.

Morreram muitos companheiros valorosos na luta contra a ditadura. Só dos que eu conhecia pessoalmente, foram uns 20. É algo que não deve ser misturado com esse mar de lama. Os petistas que tentem salvar-se de outra maneira, não envolvendo o que foi muito maior do que essa chanchada histórica de hoje em dia.

Eduardo Rodrigues Vianna disse...

Que confusão imensa estamos vivendo.
E quão pobres parecem as possibilidades para uma mudança de rumos.
Não sei dizer com clareza o que penso da situação atual.
Parece-me um momento em que o Brasil se revela em seu aspecto mais desgraçado.

Vitório Malatesta disse...

César Benjamin, que esteve preso com Lula no DOPS disse numa entrevista que "nunca tivemos massas humanas tão grandes, tão concentradas e tão carentes de participação, consciência e representação".

Uma coisa terrível. Esta é herança maldita deixado pelo lulismo. A grande massa dos trabalhadores está despolitizada, com a guarda baixada, momento propício para o ataque da burguesia no desmantelamento das suadas conquistas.

Nesta semana a mídia noticia que em 13 anos e meio de governo petista só as Organizações Globo receberam mais de R$ 6 bilhões de verbas publicitárias; mais de US 2 bilhões. A VEJA também recebeu uma bolada significativa.

Será que esqueceram o caso PROCONSULT na eleição de 1982 quando as mãos da família Marinho esteve por trás da tentativa de fraudar a eleição de Brizola para governador?

No primeiro de maio último, Lula vangloriou-se que a mídia golpista estava pré falida e salvou-se no seu governo [com a irrigação das verbas publicitárias]. Ante esse pronunciamento não houve uma crítica dentro das hostes servis petistas.

Isto é, alimentaram, municiaram a tropa inimiga durante anos e desmobilizaram os trabalhadores.
Querem o quê ante o desastre político/econômico, com o esfarelamento acelerado do PT dado a corrupção e recessão?

Sonham com o soerguimento do moribundo PT. Lula, principalmente, o maior responsável pelo desastre do partido.


celsolungaretti disse...

O que mais me chateia é a absoluta falta de lideranças na esquerda. Parece que ninguém vai fazer nada para mudar o enredo que se delineia: a direita ganhará terreno dia a dia, até livrar da Dilma com um piparote. Ela cairá "não com estrondo, mas com um suspiro". E nós sairemos tão desgastados dessa brincadeira que precisaremos pelo menos de uma década para nos reerguer.

O Vargas, pelo menos, teve colhões para sair por cima, com o suicídio e a carta. A Dilma vai espernear, espernear, mas não renunciará (o melhor que ela ainda poderia fazer). Sairá pela porta dos fundos e depois a direita vai predominar durante um bom tempo. Quando se abrirem novamente possibilidades para a esquerda, terei o quê, 80 anos? Sobrará algum pique? Vejo meus sonhos cada dia mais distantes.

Estou um desânimo só.

celsolungaretti disse...

Prezado Vitório,

em termos práticos a coisa é como você diz, mas eu acrescentaria uma pequena ressalva: o Lula jamais teria chegado aonde chegou se a esquerda não houvesse levantado sua bola.

Estava na cara de que o Lula não era um estadista nem um marxista. Mas, o Zé Dirceu & cia. queriam aproveitar seu prestígio popular, contando que poderiam mantê-lo indefinidamente sob controle.

Com o escândalo do mensalão, contudo, o Lula se livrou dos "tutores" e passou a governar conforme lhe dava na telha.

Sem ter uma formação nem ideologia de esquerda, o que ele fez? Guiou-se pelo pragmatismo e pela tradição política absorvida desde criança. Atualizou o coronelismo e o "é dando que se recebe". Não organizou as massas, preferiu garantir a governabilidade mediante acordos podres com os poderosos.

O resultado está aí. E a culpa é principalmente nossa, pois enxergávamos claramente as limitações do Lula, mas preferimos trilhar o caminho mais fácil, ao invés de construirmos uma liderança de verdade.

Anônimo disse...

Uma liderança de verdade que não é você com suas análises descoladas da realidade. Aliás, realidade é o que não entra em suas divagações.

ArturTaveira disse...

A esquerda de então ... intelectuais das diversas Universidades ... principalmente da USP, viram no retirante esperto, ladino e falante, oriundo de um Nordeste empobrecido pelos Coronéis, que mamaram nas tetas da Sudene, durante décadas e nada fizeram por aqueles miseráveis a não ser tomar os seus "sitios" secos e improdutivos ... que eles mesmos abandonaram por não trazer-lhes mais a simples sobrevivência. Nada melhor do que esse boneco falante, que só queria se dar bem desde o início ... nada mais justo!
Mas o boneco falante, síntese de um vasto segmento social da nossa gente, ganhou vida, tal qual o Pinóquio do Velho Gepeto e a partir daí saiu do controle dos intelectuais que por falta de coragem ... não tiveram outra alternativa a não ser conviver ... Esse retirante se deu bem ... bem mais do que ele proprio talvez imaginasse ... Esse retirante chega agora ao seu ocaso ... até porque o Brasil não é uma Republiqueta Sul Americana ... é um País continental ... tudo o que se seguiu a esse retirante são e foram consequencias que vão passar ... Os velhos coronéis e as suas criaturas estão desaparecendo ... e nos havemos de sair dessa ...

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