Os schoolars subirão nas paredes mas ouso dizer que O nome da rosa (d. Jean-Jacques Anaud, 1986) funciona muito melhor como filme do que como livro.
A obra de Umberto Eco é uma das mais intragáveis exibições de erudição maçante que eu conheço. Parece coisa de catedrático enveredando por um gênero tido como menos respeitável e que fica o tempo todo enxertando doutas lições à guisa de álibi por, no fundo, ter apelado para as fórmulas da novela policial a fim de conquistar leitores fora do ambiente acadêmico.
Quando o li, pulando trechos e mais trechos desnecessários, fiquei pensando que um copy desk competente reduziria aquela maçaroca de mais de 500 intermináveis páginas a empolgantes 200. Foi exatamente o que o bom roteirista Andrew Birkin fez, para alívio dos espectadores, que puderam assistir em 130 minutos o que exigiria uns 400 se fosse mantido o formato original.
Eco nada mais fez do que uma pernóstica transposição dos enredos de Conan Doyle para a Idade Média. Para que ninguém o acusasse de plagiário, deu ao personagem principal o nome de William de Baskerville, assim todos nós, obtusos mortais, ficaríamos sabendo que a semelhança com Sherlock Holmes era intencional e assumida, não uma tentativa de enganar incautos.
Só que, na minha humilde opinião, expôs-se a uma comparação extremamente desfavorável para ele: O cão dos Baskervilles é um livro muito melhor do que O nome da rosa. O primeiro tem a centelha do gênio que desbrava novos caminhos, o segundo aquele jeitão de reciclagem de muita coisa que já havíamos lido (assim como, p. ex., Stephen King sempre nos faz lembrar Poe, Lovecraft, Stoker, Shelley, Le Fanu, Stevenson e que tais...).
O filme vale exatamente por não ter pretensões exageradas, daí eu ter decidido inclui-lo no cineminha cá do blogue. Mostra um monge dado ao raciocínio lógico e com bons conhecimentos científicos (Sean Connery, magistral!) investigando uma sucessão de crimes num monastério italiano. O parceiro ingênuo para quem ele explica tintim por tintim como chegou a suas brilhantes conclusões não é um médico bonachão, mas sim o noviço que o acompanha na condição de discípulo e serviçal (Christian Slater, bem no início da carreira). E, como contraponto às suas deduções racionais, há um feroz inquisidor (F. Murray Abraham) sentindo cheiro de enxofre em tudo.
Reduzida ao que realmente importa (mérito também do bom diretor Annaud, de Preto e branco em cores e A guerra do fogo), trata-se de um filme agradável, que prende a atenção e dá uma boa ideia de quão nocivos eram o fanatismo e obscurantismo religiosos. Minhas únicas ressalvas são estas:
- é verossímil que alguém tivesse personalidade similar à de Sherlock Holmes em 1327?
- tudo bem que o caçador de bruxas fosse histérico e sanguinário, mas precisava ser composto de forma tão caricata? Lembrou-me aqueles bangue-bangues antigos nos quais o vilão se vestia de preto e ficava alisando a ponta do bigode antes de fazer suas maldades...
2 comentários:
Lungaretti: sou grande admirador da obra do Conan Doyle. Acho que o grande mérito dele é que ele não fazia as obras do personagem Sherlock Holmes serem enfadonhas e sim de puro entretenimento. O curioso é que o próprio Doyle não era muito fã das obras do Sherlock, preferia os romances históricos que nunca fizeram o mesmo sucesso.
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