fez sua mea culpa em fevereiro de 2011,
quando comemorava o 90º aniversário.
Usou, contudo, o artifício de esconder tal admissão no meio de um quilométrico texto louvaminhas. Eu
e todo mundo teríamos passado batidos, se a ombudsman não houvesse levantado a
lebre em sua coluna dominical.
Alertado, fui atrás e encontrei a matéria em questão. Eis os trechos principais do artigo que escrevi em 27/02/2011:
Assim a FT noticiou a morte do 'Bacuri', bestialmente torturado durante 108 dias. |
Eu usaria outro adjetivo para qualificar a imagem maquilada que Calibã produziu de si mesmo para fins de efeméride, mas ombudsman que não doura a pílula deixa de ter seu mandato renovado pelo herdeirinho que manda e desmanda...
Sobre o caderno comemorativo, Singer diz algo interessante:
"É verdade que o especial de 90 anos da Folha teve (...) a coragem de explicar o apoio do jornal ao golpe militar e o alinhamento da Folha da Tarde à repressão contra a luta armada. Trouxe também críticas duras feitas pelos ex-ombudsmans. Mas foram apenas notas dissonantes [grifo meu]".
Sim, no meio da overdose de auê, passou despercebido o texto 90 anos em 9 atos, de Oscar Pilagallo, cuja principal função foi a de servir como uma espécie de álibi para quando alguém acusasse o jornal de não ter autocrítica.
Enfim, vale a pena conhecermos o que a Folha finalmente admite sobre seu passado -- embora, claro, não tenha admitido tudo, mas, tão somente, o que já havia sido inequivocamente estabelecido por seus críticos e não compensava continuar negando.
E, claro, devemos discutir -- e muito! -- a chocante revelação de que o Grupo Folha entregou um de seus jornais a porta-vozes de torturadores como alegada retaliação a um agrupamento de esquerda que teria se infiltrado na Redação.
E, claro, devemos discutir -- e muito! -- a chocante revelação de que o Grupo Folha entregou um de seus jornais a porta-vozes de torturadores como alegada retaliação a um agrupamento de esquerda que teria se infiltrado na Redação.
Mancheteando a Marcha da Família às vésperas do golpe |
"A Folha apoiou o golpe militar de 1964, como praticamente toda a grande imprensa brasileira. Não participou da conspiração contra o presidente João Goulart, como fez o 'Estado', mas apoiou editorialmente a ditadura, limitando-se a veicular críticas raras e pontuais.
...O jornal submeteu-se à censura, acatando as proibições, ao contrário do que fizeram o 'Estado', a revista 'Veja' e o carioca 'Jornal do Brasil', que não aceitaram a imposição e enfrentaram a censura prévia, denunciando com artifícios editoriais a ação dos censores.
...A partir de 1969, a 'Folha da Tarde' alinhou-se ao esquema de repressão à luta armada, publicando manchetes que exaltavam as operações militares.
A entrega da Redação da 'Folha da Tarde' a jornalistas entusiasmados com a linha dura militar (vários deles eram policiais) foi uma reação da empresa à atuação clandestina, na Redação, de militantes da ALN (Ação Libertadora Nacional), de Carlos Marighella...Em 1971, a ALN incendiou três veículos do jornal e ameaçou assassinar seus proprietários. Os atentados seriam uma reação ao apoio da 'Folha da Tarde' à repressão contra a luta armada.Segundo relato depois divulgado por militantes presos na época, caminhonetes de entrega do jornal teriam sido usados por agentes da repressão, para acompanhar sob disfarce a movimentação de guerrilheiros. A direção da Folha sempre negou ter conhecimento do uso de seus carros para tais fins".
Vale destacarmos, ainda, o reconhecimento de que foi por sugestão da própria ditadura que a Folha de S. Paulo, em meados dos anos 70, passou a posicionar-se com mais independência em relação à ditadura! Seria cômico, se não fosse trágico...
Diaféria escreveu: "O povo urina nos heróis de pedestal" |
"No início de 1974, Octavio Frias de Oliveira, publisher da Folha, foi procurado por Golbery do Couto e Silva, futuro chefe da Casa Civil do governo de Ernesto Geisel, prestes a tomar posse.
...Golbery deixou claro que ao futuro governo não interessava ter um único jornal forte em São Paulo [ou seja, o novo governo favoreceria quem disputasse leitores com O Estado de S. Paulo].
...uma ampla reforma editorial foi concebida e executada (...) por [Cláudio] Abramo, que trabalhava na Folha desde 1965. As páginas 2 e 3 se tornaram espaços de opinião crítica. Passaram a fazer parte da equipe editorial colunistas renomados, como Paulo Francis e, mais tarde, Janio de Freitas.
A trajetória teve um desvio em 1977, quando, por pressão da linha dura do governo, Abramo foi afastado de seu cargo... ".
Desvio? Foi, isto sim, um fim de linha. A primavera da Folha acabou no exato instante em que o jornal se vergou ao ultimato militar, quando do episódio Lourenço Diaféria x estátua do Caxias (leia a crônica que tanto irritou os militares aqui), afastando Cláudio Abramo da direção de redação e o despachando para Londres, demitindo vários colaboradores e impondo evidentes restrições aos que ficaram.
Durante cerca de três anos, a Folha teve a cara do Abramo. A partir de 1977, passou a ter a carranca do Boris Casoy. E, depois, a do Otávio Frias Filho.
Para quem conhece os três personagens, não é preciso dizer mais nada.
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