terça-feira, 29 de março de 2011

LÍBIA: OS DESATINOS DE UMA INTERVENÇÃO

Na minha avaliação, a situação na Líbia justificava, sim, a intervenção da ONU, nos termos em que ela foi colocada.

Havia uma revolta popular contra um ditador que se mantém no poder há 42 anos intimidando e reprimindo sua gente.

Esta revolta tendia à deposição do tirano e à conquista do poder pelos revoltosos,  mas o quadro militar começou a ser alterado pela arma de que os rebeldes não dispunham, mas o déspota sim: a aviação.

Então, quando a reviravolta estava consumada e o desfecho, próximo, a ONU resolveu anular o único trunfo do autocrata.

Isto é o que foi resolvido e era só isto que deveria ter sido feito: evitar que os aviões de Gaddafi fossem o fiel da balança, impedindo a vitória da rebelião líbia. Mais nada.

Agora, constata-se que as potências ocidentais não só estão excedendo o que foi autorizado pela ONU, como parecem dispostas a desempenhar papel determinante na definição de como será a Líbia pós-Gaddafi.

Nem é preciso dizer que disto discordo totalmente. Os rebeldes deveriam vencer por seus próprios meios, suprimida a vantagem injusta de Gaddafi, e reorganizar o país eles mesmos, sem interferências e pressões de outras nações.

Alguns alegarão que raposas são más guardiãs de galinheiros e não se poderia esperar outra coisa da  "ajuda" ocidental.

Mas, entre dois cenários negativos, seria pior ainda se Gaddafi sufocasse a rebelião e punisse os rebeldes com sua bestialidade habitual, digna de um Vlad Dracul. Além do sacrifício de cidadãos valorosos, que enfim se colocaram de pé contra uma ditadura de quatro décadas, estar-se-ia mandando o recado errado para outros povos subjugados a tiranos sinistros como Gaddafi.

Ainda não foi desta vez que a
ONU se redimiu de seus pecados
Então, estou totalmente de acordo com a sensata coluna desta 3ª feira do veterano Jânio de Freitas, Direitos Mortais, cujos principais trechos reproduzo (os grifos são meus):
"Durou pouco a impressão de que se tornavam válidas as regras da ONU para regular situações de emergência violenta, como a irrompida na Líbia.

A situação líbia trouxe de volta a intervenção só efetivada depois de sua aprovação, por voto, pelo Conselho de Segurança.

Uma qualidade adicional desse retorno às regras foi observado, de passagem, pelo veterano jornalista Enrique Müller, chileno radicado na Alemanha: pela primeira vez, o Conselho de Segurança aprovara uma intervenção invocando a defesa de direitos humanos.

Tratava-se de proteger a população civil dos ataques de Gaddafi aos rebeldes. E assim ficou claro mesmo na imprecisa resolução do conselho, que autorizou, para tanto, a criação de uma zona de exclusão aérea sobre a Líbia e o embargo de armas para Gaddafi.

A queda do ditador pode justificar-se já por evitar a feroz represália que adviria de sua permanência. Mas, do modo como é buscada, invalidou a resolução do Conselho de Segurança. Franceses e ingleses, e em menor proporção os americanos, abrem a fogo o caminho para o avanço dos rebeldes.

Incluíram-se como partes da guerra, não mais agentes de inquietações humanitárias com a vitimação de civis.

(...) É impossível crer que a intervenção não tenha passado, ao exceder a resolução 1973, de protetora a causadora de mortes de civis, talvez tantas quanto fazem as tropas de Gaddafi. Nunca se saberá".

4 comentários:

Júlio disse...

Celso, não consigo chamar de “rebelde” aos que lutam apoiados pela CIA, pela OTAN e pelos imperialistas. Estes últimos só apóiam golpistas, foi assim no Brasil em 1964, no Chile de 1973 e não é diferente na Líbia.

Sempre me colocarei incondicionalmente contra o imperialismo e suas guerras. Lembremos que se ainda existem ditadores e tiranos, isto se deve em grande medida ao fato de ainda existir o imperialismo, nós latino-americanos sabemos muito bem disso, os árabes também.

O que a mídia golpista se esforça para esconder é que o ditador Kadafi ainda tem apoio popular em partes da Líbia. Aí fica a pergunta: o que os imperialistas farão com a população que apóia Kadafi?

Eu não tenho dúvidas. Os imperialistas despejarão suas bombas sobre qualquer um que se oponha à invasão, exatamente como já está ocorrendo, vide os bombardeios aos hospitais líbios. Além disso, já começam a surgir informações de que líbios pró-regime estão sendo executados em Benghazi pelos tais “rebeldes”.

Parafraseando Marx: a libertação dos trabalhadores líbios só pode ser obra dos mesmos. Qualquer coisa diferente disso redundará em mais sangue e opressão, ainda mais se patrocinada pelos imperialistas.

celsolungaretti disse...

Como uma besta humana dessas subjugaria seu povo durante 42 anos e não criaria rebeldes? As nações ocidentais defendem seus interesses, mas os revoltosos defendem suas vidas e seus irmãos.

Insisto: temos de ver as coisas pela ótica dos líbios oprimidos, não da sórdida geopolítica.

Quem olha as coisas de fora, dá mais importância à ojeriza que tem pelo imperialismo.

Eu me coloco no lugar do povo obrigado a viver debaixo das botas de um tirano homicida, assim como o povo brasileiro viveu 21 anos debaixo das botas dos gorilas boçais.

Júlio disse...

Celso,

Os tais “rebeldes” são chefiados por ex-militares, ex-ministros e ex-funcionários daquele que você chama de “besta humana”. Muito estranho. Eles demoraram 42 anos para perceber que integravam uma tirania. Aí se revoltaram e decidiram aceitar o apoio da CIA e da OTAN. Mais estranho ainda.

Outro detalhe. A Líbia experimentou uma expressiva melhoria de seus indicadores sociais nas últimas décadas. Estranhamente a mídia se cala sobre essa questão. Não significa que devemos (a esquerda) apoiar Kadafi. Mas faz pensar que boa parte da população o apóia. O que os imperialistas farão com essa parte da população não é difícil de imaginar, despejarão suas bombas em todos, como já estão fazendo.

Nós brasileiros vivemos 21 anos de baixo das botas dos gorilas boçais apoiados pela CIA e pelos imperialistas. Por tudo isso é preciso barrar a agressão imperialista à Líbia.

celsolungaretti disse...

Todos os ditadores têm quem os apoie. A popularidade de Hitler chegou a ser muito maior do que o Lula, coisa de 90% da população.

Então, encerrando esta discussão, pouco importa a melhora de indicadores sociais sob o tacão de um tirano.

Pouco importa quem a CIA, os imperialistas, os colonialistas, a KKK, o CCC ou o diabo que seja apoie.

Revolucionários existem para garantir ao povo justiça social e liberdade. São princípios INEGOCIÁVEIS.

Nunca podemos transigir com EXPLORADORES e com DITADORES. Em nenhuma hipótese. Jamais.

Sob pena de deixarmos de representar, aos olhos do povo, a esperança de uma sociedade redimida, passando apenas a ser vistos como mais da mesma podridão que está aí.

Ponto final.

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