terça-feira, 23 de setembro de 2008

DECLARAÇÃO DE PRINCÍPIOS, SUSCITADA POR UMA DISCUSSÃO NO CMI

Até há uns 20 anos, digamos, tínhamos razoável certeza sobre como se dividiam as forças do espectro político e quem representava o quê em cada situação.

De lá para cá, a grande imprensa decaiu a um tal ponto que, tanto quanto a internet, está inundada de versões tendenciosas e manipulatórias.

Então, fica cada vez mais difícil sabermos qual é a verdade verdadeira.

Por exemplo: Daniel Dantas é um grande vilão, "o dono do Brasil", como diz Mino Carta, ou apenas um crapulazinho a mais?

Para mim, todos os banqueiros são crápulas, não apenas aqueles que transgridem as regras do próprio capitalismo. E, poder por poder, os banqueiros do Bradesco, Itaú, Santander, Unibanco, HSBC, etc., têm muito mais do que o Daniel Dantas.

Estará certa essa esquerda que dá a entender que todos os males do Brasil seriam resolvidos com o Daniel Dantas na cadeia?

Ou, pelo contrário, isto só reforçaria a crença nos valores do próprio capitalismo, que, aparentemente, estaria expurgando seus malfeitores?

Então, não tendo reais certezas sobre quem é quem nesse cipoal -- aliás, acredito que no sistema só existem bandidos, nenhum mocinho --, eu me recuso a seguir os ditâmes impostos pelos rolos compressores de lado a lado.

Não condeno incondicionalmente ninguém. Nem Daniel Dantas, nem Lula, nem Chávez, nem Uribe, nem Fidel, nem Mainardi, nem Nassif, nem a Veja, nem o Hora do Povo, nem Tarso, nem Protogenes, nem Jobim, nem Gilmar Mendes, nem De Sanctis. Ninguém.

Recuso-me a considerar que certas pessoas e instituições sejam sempre más e estejam sempre do lado errado. Isso é maniqueísmo. E eu não sou religioso, sou revolucionário, de formação marxista e orientação anarquista na atualidade. A dialética me ensinou a levar sempre em conta a contradição.

Então, avalio cada fato político em si próprio, tendo como parâmetro, sempre e unicamente, os princípios que defendo.

Para mim, p. ex., o direito de asilo político é importantíssimo, pois, eventualmente, salva a vida de combatentes da liberdade.

Então, quando o Lula o transgrediu para fazer um favor ao Fidel, não levei em conta o que acho do Lula, nem o que acho do Fidel, nem mesmo o que acho dos dois pugilistas cubanos (sujeitos oportunistas e sem caráter, foi como os julguei intimamente).

Só me interessava uma coisa: o desrespeito ao direito de asilo teria más consequências. E foi por isto que protestei contra a decisão do governo brasileiro, de deportar os atletas imediatamente, ao invés de colocá-los em contato com entidades como a Anistia Internacional, que deveriam tê-los aconselhado sobre qual a melhor opção para eles.

O que aconteceu? Ambos voltaram para Cuba e foram tratados como párias, impedidos de exercer sua profissão e obrigados a viver de biscates. Exatamente como eu previra.

Na ocasião, eu alertei: a rua é sempre de duas mãos. Por causa de dois indivíduos sem grande valor como seres humanos, talvez percamos, depois, companheiros muito mais valiosos.

Agora, o precedente aberto no caso dos pugilistas está sendo usado pela direita para exigir a mesma solução para o episódio do Cesare Battisti, que vale muito mais do que eles e significa muito mais para nós.

Então, considero que faz mesmo muito mais sentido defendermos princípios do que pessoas, governos, partidos e outros entes que, hoje em dia, estão nos surpreendendo desagradavelmente a cada instante.

É o que fiz no caso da expulsão do Vivanco, uma truculência aberrante e totalmente desnecessária. Se foi idêntica aos procedimentos adotados pelas ditaduras do passado, não havia motivo nenhum para eu deixar de ressaltar isto.

Afinal, uma ditadura me fez sofrer muito e causou a dor e a morte de companheiros queridos. Um de meus compromissos, como homem, é sempre lutar para que tais práticas jamais se repitam, partam de quem partirem.

Como eu coloquei na definição dos meus dois blogs, dedico-me à pregação dos ideais revolucionários, à defesa dos direitos humanos e ao exercício do pensamento crítico.

Acredito que ainda possamos criar uma esquerda que, em nome da revolução, nem incorra em práticas autoritárias (negando os direitos humanos), nem resvale para o sectarismo e o fanatismo (abdicando da liberdade de pensamento por força dos rolos compressores que tentam impor uma posição única, monolítica).

É para contribuir na formação dessa nova esquerda que eu ainda estou escrevendo. Como dizia uma música do grande Sérgio Ricardo, quando parecia inexistir esperança, "cada verso é uma semente/ no deserto do meu tempo".

Eu planto as sementes de uma esquerda libertária, capaz tanto de conviver com os valores civilizados, quanto de fazer a revolução.

Jamais aceitarei que uma coisa exclua a outra.

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