sexta-feira, 28 de abril de 2017

DALTON ROSADO: "A DIAGNOSE DE UMA DOENÇA SOCIAL".

"Não se deixe seduzir pela ideia de que aquilo
que não gera lucro não tem valor"
(Arthur Miller, dramaturgo) 
.
Os computadores mais modernos, robotizados, são capazes de executar tarefas com maior produtividade, mais precisão e melhor percentual de acerto do que os homens, desde que programados e manipulados corretamente por poucos homens. 

Isto significa que o esforço humano de produção foi simplificado; e que, assim, em menos tempo podemos suprir todas as nossas necessidades de consumo, sejam elas para a obtenção de objetos necessários ao consumo humano ou serviços. 

Segundo dados da ONU, aproximadamente 85 mil robôs são introduzidos anualmente nas indústrias em todo o mundo. Estima-se que existam mais de 800 mil robôs exercendo o trabalho que poderia empregar aproximadamente 2 milhões de pessoas. Tal processo é motivado por diversos fatores, sendo um deles a maximização da produção, que, em determinados segmentos industriais, pode ser até quadruplicada mediante a utilização dos ditos cujos.

Ora, o valor (dinheiro e mercadorias) somente pode ser obtido a partir do esforço humano transformado em trabalho abstrato, assalariado (também uma mercadoria); e tendo tal trabalho se tornado em grande parte (e em partes cada vez maiores!) supérfluo, a conclusão lógica é que vivemos uma etapa da vida social na qual a forma-valor definha em termos de sua própria contabilização numérica. 

Ou seja, há uma diminuição em números globais, como resultado da dessubstancialização das unidades de valor das mercadorias.

Como sabemos, as máquinas não produzem valor (ainda que proporcionem lucros localizados para o empresário que as introduz no processo de produção de mercadorias visando reduzir custos laborais e ganhar espaço na concorrência de mercado), mas, ao contrário, reduzem a massa de valor advindo da dita produção; delas, ademais, não se pode extrair mais-valia.   

O valor está, assim, com os seus dias contados. Motivo: a mediação social que o tem como critério (somente se obtém dinheiro, valor, para nosso sustento com trabalho abstrato) se tornou impossível de ocorrer em larga escala, somente abrangendo o reduzido número dos apertadores de botões e prestadores de serviços; estes últimos contudo, não produzem valor novo e, portanto, não contribuem para a autorização saudável de emissão de moeda. 

Novamente se impõe a conclusão lógica de que este é o móvel do desemprego estrutural, problema que nenhuma reforma trabalhista e/ou previdenciária conseguirá resolver. 

Todas as medidas visando à retomada do pleno emprego somente demonstram quão inconscientes são os atores dessa ópera bufa. Não compreendem (ou não querem compreender) a própria natureza do que defendem. Tanto a direita quanto a esquerda agem como robôs, programados pelo fetichismo da mercadoria, contra o povo. Eles não o sabem, mas o fazem (Marx)!  

O que não se leva em conta é que a emissão de dinheiro dissociada da substancia valor, como vem fazendo os Bancos Centrais emissores de moedas mundialmente aceitas (dólar estadunidense e euro), significa que os Estados passaram a manipular a vida social ao seu bel-prazer e da forma mais absolutista que já se experimentou no sangrento itinerário da humanidade. 

Sob o critério do dinheiro sem valor é o Estado quem decide quem vai morrer ou quem pode viver. O mais déspota dos déspotas. Um absurdo que, por mais escravizador que seja, é incompreendido pela grande maioria do povo, vítima da vida mercantil e dos atores políticos, até porque estes últimos estão presos à dependência que têm do próprio Estado mantenedor do capital, do qual fazem parte. 

As contradições da forma-valor (capitalismo), detectadas por Marx ainda na metade do século 19, agora expõem sua carantonha. 

É que atingimos o estágio no qual a forma de mediação social deixou de adequar-se ao conteúdo social; e, como não se quer mudar a forma de tal mediação por inconsciência ou por interesse na preservação de privilégios (que cada dia mais são precarizados), é o próprio conteúdo da vida social que entra em parafuso. Instala-se a barbárie como resultante cruel de uma inviabilidade social.  

Entretanto, como os privilegiados resistem a deixarem de sê-lo, corremos o grave risco de que se instale a guerra como acomodação trágica de uma contradição cruelmente vivenciada, ao invés da superação das causas dessa mesma contradição. 

Assim é que antes mesmo de sobrevir a guerra total, mundial, com capacidade bélica para destruir a própria humanidade, vivemos a barbárie de uma anomia social instalada em muitos países periféricos do capitalismo graças à ingovernabilidade e inviabilidade de mediação social pelo dinheiro no interior desses mesmos países. 
Assim, os gigantes produtores de mercadorias têm os pés de barro. As suas riquezas abstratas contabilizadas em números fantásticos (tal como as suas dívidas, cuja insolvibilidade atesta serem podres os títulos que os credores mantêm em seus cofres bem guardados), na verdade nada significam além de números abstratos que no futuro virarão pó.

Não se trata de uma questão de querermos a volta ao passado, com formas de produção essencialmente manuais, físicas, nas quais as pessoas com seus salários pudessem dar uma sobrevida ao capitalismo. 

Tal fórmula, que substituiu sub-repticiamente o trabalho escravo direto pelo escravismo indireto do trabalho abstrato, produtor de valor, armou uma cilada para os defensores do capitalismo que exaltaram falaciosa e tendenciosamente o trabalho abstrato como fonte da dignidade humana (Adam Smith e David Ricardo, economistas clássicos do século XVIII).

O capital, na sua ânsia de modernização (que até o próprio Marx admitiu como detentor de um caráter civilizatório, modernizador), cavou a sua própria sepultura e quer nos levar de roldão na sua insensatez suicida.   

Esta é a diagnose essencial dos males sociais ora em curso e cada vez mais aviltantes sob a égide da forma-valor.

A superação dos problemas sociais passa pela superação da forma-valor como modo de mediação social, quer queiram ou não os acomodados e conservadores dirigentes (empresários e políticos de todos os matizes) de um modo de ser social que sempre foi ruim e agora se tornou obsoleto. (por Dalton Rosado)

Nenhum comentário:

Related Posts with Thumbnails