quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

O CINE BELAS ARTES FOI SALVO. PENA QUE TANTOS OUTROS MORRERAM!

Depois de uma luta de três anos, o movimento de apoiadores do Belas Artes conquistou uma grande vitória: o cinema será reaberto, com apoio da Caixa Econômica Federal, até o próximo mês de maio.

Localizado na valorizadíssima esquina da rua Consolação com a avenida Paulista, o espaço era muito cobiçado pelos servos da grana que "destrói coisas belas", como bem definiu o Caetano Veloso.

Para evitar mais esta destruição, os defensores das coisas belas recorreram à abertura de processos de tombamento (conseguindo que a fechada, pelo menos, fosse tombada pelo patrimônio histórico estadual) e de uma CPI na Câmara Municipal, a audiências na Assembleia Legislativa e a propostas para o Plano Diretor Estratégico da cidade, além dos costumeiros abaixo-assinados

Com a posse de Fernando Haddad como prefeito de São Paulo em 2013, tudo ficou mais fácil. Os detalhes da devolução do cinema à cidade serão anunciados no próximo sábado (25), aniversário de São Paulo.

Como bom cinéfilo, meus sentimentos são de gratidão para com o movimento que salvou o Belas Artes.

Espremido e jogado fora: o fim do patrocínio
de um banco quase matou o Belas Artes.
Mas, não seria o caso de a cidadania se mobilizar contra a desumanidade capitalista em toda e qualquer circunstância, não apenas em situações específicas?

Cada cinema fechado nas últimas décadas significava algo para muitas pessoas. Nada se fez para os salvar. Então, houve um certo ranço elitista nesta mobilização única.

Cada vez que passo pelo prédio que abrigou o cine Aliança das minhas matinês longínquas, sinto um aperto no coração. Ninguém lutou por ele na Mooca. Os frequentadores não eram intelectuais, mas sim pessoas comuns da baixa classe média. Seus sonhos e sua nostalgia não mereciam respeito?

De resto, vale esclarecer que, embora seja um cinema que marca a memória cultural da cidade, o Belas Artes não funcionava desde 1943, como alguns apressados afirmaram.

Houve uma confusão com o cinema ao lado, que era Astúrias entre 1931 e 1943, passando então a chamar-se Ritz, enquanto o cine Trianon, verdadeiro antecessor do Belas Artes, só seria aberto em 1956.

A Sociedade Amigos da Cinemateca, constituída em 1962, inicialmente exibia suas pérolas cinematográficas numa pequena sala da rua Aurora, constrangedoramente próxima de uma zona de meretrício. Lembro-me de nela ter assistido, p. ex., a O Homem do Prego (1964, d. Sidney Lumet).

Prestes a ser inaugurado, em 1967.
Surgiu uma oportunidade de se transferir para um local mais apropriado e a SAC não bobeou, assumindo o espaço do ex-Trianon e nele instalando o Belas Artes, que logo se tornou o principal cinema de arte de Sampa, eclipsando o Bijou, o Marachá Augusta, o Cosmos 70, etc.

A atração inaugural, em julho/1967, foi Os russos estão chegando! Os russos estão chegando! (1966, d. Norman Jewison).

Enfim, o cultuado cinema que agora terá uma sobrevida, remonta a 1967 -não a 1931, 1943 ou 1956.

E viveu seu grande momento nos idos de 1968, exibindo fitas como A Chinesa (1967, d. Jean-Luc Godard), esmiuçada à exaustão pelas rodas de estudantes, contestadores e  outsiders  em geral que se aglomeravam no bar em frente.

Para quem não sabe, esclareço: trata-se de um filme que entrou em evidência com a chamada  Primavera de Paris, por parecer tê-la antecipado.

Mostra jovens que se isolam durante algum tempo para aprofundarem sua opção revolucionária, entre leituras, discussões, relacionamentos pessoais/amorosos e esboços de uma existência mais livre. Termina com o fim do aprendizado, quando cada um, aclaradas suas dúvidas, direciona-se para a forma de vida e de atuação que lhe é mais afim.

Quanto ao título, não se referia a uma mulher asiática, mas sim à linha chinesa, de Mao Tsé-Tung e seu livrinho vermelho, que então eram tidos como o contraponto ao  revisionismo  soviético...

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