Assisti a alguns episódios de Servo do Povo, a série cômica ucraniana estrelada por Volodimir Zelenski que, num jogo de paródia da paródia, o levou a ser eleito para a Presidência do país na vida real.
Estão disponíveis no YouTube (vide janelinha abaixo), com legendas em inglês. Não morri de rir nem diria que a série é uma obra-prima, mas ela é interessante e tem alguns bons momentos.
Muita gente, especialmente aqueles que dão razão total ou parcial a Vladimir Putin, gosta de qualificar o presidente ucraniano como comediante, com o intuito de diminuí-lo. O próprio Jair Bolsonaro foi nessa toada.
Não chego a defender que escolhamos nossos líderes exclusivamente entre comediantes, mas creio que a sociedade subestima os vínculos virtuosos entre humor e política. O humor pode ser profundamente subversivo e tiranos o temem com razão.
As piadas que se contavam sobre as agruras do socialismo no Leste Europeu foram importantes para a derrocada desses regimes. É que elas permitiam às pessoas que revelassem umas às outras suas desconfianças em relação ao sistema sem se expor demais.
Como todo mundo contava essas anedotas, ou, pelo menos, ria delas, todos sabiam que ninguém era fã incondicional do regime.
Assim, quando surgiram as condições para que ele fosse contestado, os indivíduos puderam engrossar o coro já sabendo que não estariam sozinhos. O humor ajudou a resolver o problema da coordenação de expectativas, que é sempre um desafio para a ação coletiva.
Quer você considere a posição de Zelenski de estimular os ucranianos a enfrentar as tropas russas heroica ou irresponsável, não dá para negar a um país invadido o direito de tentar resistir. Fazê-lo tornaria as invasões um crime perfeito.
O tempo dirá se os ucranianos fizeram bem em eleger um líder que surgiu para o país como comediante.
Certamente não erraram tanto quanto os brasileiros, que elegeram um parvo. (por Hélio Schwartsman)
Dois primeiros episódios da série Servo do Povo
2 comentários:
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Assisti.
No mundo da pós-verdade e do metaverso há que se ver as estruturas.
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Primeiro os algoritmos encontram os perfis de candidatos e as narrativas que impressionariam os perfis psicológicos dos eleitores ucranianos.
Depois, de maneira subliminar, eles contaram a estória do que queriam que acontecesse.
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E deu certo!
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Nós adoramos estórias e, atente-se, o personagem era professor de história.
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Aqui tivemos o Moro com um discurso perfeitamente escrito quando de sua filiação ao Podemos, com bandeira tremulando ao fundo e tudo mais.
Ocorre que ele não conseguiu segurar o personagem e alimentar o meme positivo.
Já o comediante...
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Estão fazendo isso constantemente.
É o novo nível da propaganda.
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Mas veja, como Hitchcock, eles não se esquivaram de aparecer no filme quando citam a rede social e o finaciamento coletivo.
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Scientia potentia est.
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Até gostaria de ter visto. Mas, desde ginasiano eu tenho bronca de precisar saber algum idioma estrangeiro em meu país. O único palatável para mim é o espanhol, pois não precisei aprender. Comecei a ler um livro para um trabalho escolar de História e percebi que entendia tudo.
Já o inglês, além de ser o idioma da dominação econômica, política e cultural que sofremos, ainda me lembra um trauma de jornalista. Eu era copidesque de Economia no finado Jornal da Tarde e havia um editor otimista, que sempre acreditava que as notícias pautadas renderiam matérias.
Aí, faltando menos de uma hora para o fechamento, ele chegava para mim: "Olha, a matéria sobre o ministro caiu, então pega este artigo do The Economist, corta 20 linhas e prepara para publicação".
Era uma agonia. Não sendo fluente em inglês, eu era obrigado a não só verter para o português, como a deletar parte dele sem torná-lo irreconhecível (afinal, sairia com o nome do autor estadunidense e tudo).
Cada vez que entregava aquilo com o fechamento mordendo meus calcanhares, detestava mais o inglês.
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