Alfred Bauer seguia as diretrizes... |
rui martins
BERLINALE LIMPA SEU
PASSADO AOS 70 ANOS
Enquanto no Brasil o presidente Bolsonaro não esconde seu namoro com o nazifascismo, a Alemanha de Angela Merkel faz questão de mostrar seu repúdio a qualquer tentativa de restauração da ideologia nacional-socialista de extrema-direita.
Foi o caso da anulação das eleições na Turíngia, onde seu partido, CDU, tinha vencido com os votos dos ultradireitistas do partido Alternativa para a Alemanha.
Foi também o caso, num âmbito artístico cultural de repercussão mundial, da anulação do Urso de Prata com o nome de Alfred Bauer, concedido há 33 anos pelo Festival Internacional de Cinema de Berlim.
Seria muita ingenuidade imaginar não ter havido ninguém, nestes 75 anos depois do término da 2ª Guerra Mundial, que conhecesse o passado nazista de Alfred Bauer, homem de confiança de Goebbels no setor da propaganda e cinema.
Havia, sim, muita gente bem informada sobre o passado de Bauer – tanto que, em 1951, ao ser criado o festival de cinema em Berlim, houve protestos, tendo em vista seu trabalho no Reichsfilmkammer.
Ironias da vida: foi um oficial estadunidense judeu, Oscar Martay, quem convenceu as autoridades militares dos EUA a criar um festival internacional de cinema. E foi também por influência dos estadunidenses (começava a época da guerra fria entre EUA e URSS) que se ignoraram as acusações levantadas contra Bauer, de ter participado do regime nazista.
...do chefão da propaganda do Reich... |
Novas acusações contra Bauer surgiram em 1973, levantadas pelo historiador Wolfgang Becker, segundo as quais Bauer trabalhara na Diretoria de Cinema do Reich. E o assunto voltou à tona pelas vozes de Hans Blumenberg, em 1983; Felix Moeller, em 1998; e Tereza Dvorakova, mais recentemente, em 2008.
Foram ignoradas pela imprensa nacional e internacional: não havia interesse político em se provocar uma crise na Berlinale, que o tempo transformara num festival de esquerda.
Com o ressurgimento da ideologia nazista, as novas revelações do jornal Die Zeit chegaram, desta vez, num momento politicamente adequado.
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HISTÓRIA MAL CONTADA — Como nunca ninguém soube do passado nazista de personalidade artística tão eminente? Foi um segredo bem guardado ou houve pessoas que preferiram não contar? Trata-se de uma história digna de um filme de espionagem.
O criador e primeiro diretor do Festival Internacional de Cinema de Berlim, Alfred Bauer, tinha sido homenageado com a criação de um Urso de Prata com seu nome, destinado a um filme inovador. Isto em 1987.
Houve, portanto, 32 Ursos de Prata com o nome de Alfred Bauer até o ano passado. Doloroso foi descobrir que ele mantinha estreitas relações com o regime nazista de Hitler antes do fim da 2ª Guerra.
O impressionante é isto só ter sido descoberto em janeiro deste ano por investigações do jornal alemão Die Zeit, ou seja, 33 anos depois da morte de Alfred Bauer e 75 anos depois do fim da 2ª Guerra.
...e a Alemanha quer mais é esquecer seu infame passado. |
Em janeiro, a nova direção do Festival escreveu a todos que ganharam o prêmio com o nome de Bauer explicando a situação. Não se sabe se algum dos contemplados devolveu a honraria e se o Festival pretende manter o prêmio de inovação no cinema, mas com outro nome.
Ele foi entregue a conhecidos cineastas, como o polonês Andrzej Wajda, o chinês Zhang Yimou, os franceses Leos Carax e Alain Resnais, além do realizador português Miguel Gomes, em 2012. (por Rui Martins)
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