sábado, 1 de novembro de 2014

PROIBIR AS BALAS DE BORRACHA É SÓ O COMEÇO. A CIVILIZAÇÃO REQUER BEM MAIS.

Algumas vítimas da truculência dos agentes da ordem: o fotógrafo Alex Silveira...
No Brasil de hoje é assim: conseguem-se, quanto muito, ínfimos avanços no rumo da civilização --e isto mediante esforços hercúleos! 

Finalmente um juíz honrou sua toga e proibiu a utilização das famigeradas balas de borracha contra os manifestantes que confrontam os podres poderes nas ruas.

É pouco, muito pouco, quase nada. Afinal, o que deveria ser colocado em xeque, antes de mais nada, é a própria existência da PM, pois o policiamento militarizado não passa de mais um grotesco resquício ditatorial (vide aqui). Deveria ter sido extinto logo em 1985, junto com outros entulhos autoritários.
...a jornalista Giuliana Vallone...

Então, só me resta apoiar (como o faço ao reproduzir o artigo abaixo) quem luta por este tantinho de respeito aos direitos humanos, na esperança de que a sociedade, começando a impor limites à barbárie fardada, siga tal caminho até bem mais longe --passando, p. ex., a coibir verdadeiramente as torturas e abusos de poder, encarcerar os agentes que executam contraventores a sangue frio e depois montam cenários de resistência à prisão, etc. 

Até cair a ficha de que métodos e práticas característicos de exércitos só devem ser aplicados contra inimigos externos, não contra nosso próprio povo.

PELO FIM DOS OLHOS DE VIDRO

Rafael Custódio (*) e Rafael Lessa (**), na Folha de S. Paulo 

...e a estudante Dayane de Oliveira.
A liberdade de expressão e o direito de reunião são alguns dos pilares de uma sociedade democrática. Em um país em desenvolvimento como o Brasil, onde movimentos reivindicatórios são muitos e constantes, essas garantias adquirem contorno ainda mais fundamental.

O exercício desses direitos deve ser garantido pelo Estado. Há muito, porém, assistimos a cenas que explicitam que as forças policiais não lidam adequadamente com o direito de manifestação e com eventuais episódios de violência que sejam praticadas em tais contextos.

Durante os protestos de 2013, as cenas de violência desproporcional contra multidões, a pretexto de reprimir atos ilícitos de algumas pessoas, correram o mundo e geraram enorme preocupação sobre o que ocorreria quando da realização de grandes eventos como a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos.

Diante das inúmeras violações --constatadas em vídeos, fotos e testemunhos-- o Núcleo de Cidadania e Direitos Humanos da Defensoria Pública do Estado de São Paulo e a ONG Conectas Direitos Humanos apresentaram formalmente ao governo de São Paulo um documento com recomendações que tratavam do tema do uso da força em manifestações.

As propostas, calcadas em normas nacionais e internacionais sobre uso da força, foram ignoradas.

Diante disso, as entidades elaboraram, respectivamente, uma Ação Civil Pública e um amicus curiae (parecer técnico) e levaram o caso para a apreciação do Poder Judiciário, demandando, entre outras medidas, que o governo criasse uma política que discipline com rigor o uso da força policial em manifestações.

Em decisão alinhada à garantia da liberdade de expressão e do direito de reunião, o juiz Valentino Aparecido de Andrade concedeu em parte o pedido liminar e determinou a elaboração de plano de atuação que exclua o uso de balas de borracha pela polícia em manifestações.

A essência de tal entendimento está no fato de que arma de fogo, ainda que com 'bala de borracha', não deve ser usada contra multidões ou contra pessoas desarmadas, como tantas vezes já se assistiu em nosso contexto democrático.

Há 14 anos, o repórter-fotográfico Alex Silveira, que cobria uma manifestação de professores, foi atingido por uma bala de borracha no olho e perdeu 80% de sua visão. Recentemente, ele teve seu pleito de indenização rejeitado pelo Tribunal de Justiça do Estado. No entendimento deste, a culpa de ter perdido a visão teria sido do próprio fotógrafo, já que se colocara na situação de risco.

Fatos como esse apenas evidenciam que casos de uso desproporcional da 'bala de borracha', em regra, não são devidamente apurados e reparados pelo Estado. Em 2013, a jornalista Giuliana Vallone, da Folha, foi atingida por uma bala de borracha em seu olho esquerdo ao cobrir uma das manifestações.

O mesmo ocorreu com Sergio Silva, fotógrafo que cobria protestos em 2013 e que perdeu o olho esquerdo. Também no mesmo ano, Dayane [de Oliveira], de 17 anos, que passava próximo a uma festa na comunidade de Paraisópolis, foi atingida por uma bala de borracha em razão de operação policial que buscava dispersar a aglomeração de pessoas.

O uso de armas de fogo menos letais por parte das forças de segurança tem sido desproporcional, abusivo e violador dos direitos de reunião e manifestação. O mínimo esperado é que, se o cidadão decidir se expressar nas ruas, não volte para casa com um olho de vidro.

* Rafael Custódio é coordenador do Programa de Justiça da ONG Conectas Direitos Humanos.
** Rafael Lessa integra o Núcleo de Cidadania e DH da Defensoria Pública do Estado de SP.

6 comentários:

Eduardo Rodrigues Vianna disse...

A ESQUERDA EM GERAL NÃO ESTÁ NEM UM POUCO INOCENTE EM RELAÇÃO A ESTE ASSUNTO!

Em 2013, abriu-se a possibilidade de encamparmos, todos nós, a séria mobilização em favor da PEC 51, isto é, pelo fim da polícia militar, E A ESQUERDA EM PESO SIMPLESMENTE RECUSOU-SE A FAZÊ-LO!

O PSTU, o PSOL, o PCB e o PCO ignoraram solenemente a PEC 51, idealizada pelo seriíssimo L. Eduardo Soares, por haver sido apresentada ao Senado por um sujeito do PT, o desprestigiado L. Farias.

Quanto ao PT, aquilo ali tornou-se um negócio tão pífio sob todos os pontos de vista, que eles mesmos não tomaram para si a bandeira, tampouco o PC do B - e como isto seria possível, com o ministro da Justiça solidarizando-se a todo momento com Alckmin e sua Polícia Militar, o tempo todo oferecendo "ajuda" ao governo de São Paulo, contra a "força oponente" que éramos àquela altura?

Quando promovermos o renascimento da esquerda no Brasil, e tenho CERTEZA de que o faremos, a autocrítica da nossa parte precisará ser grande. Eu mesmo, com todas as minhas deficiências e sem o adequado perfil de um dirigente político, procurei aprofundar a questão da PEC 51 em meus locais de atuação, sem conseguir nem mesmo estabelecer o assunto. Dos militantes organizados com quem tentei conversar a sério, a maioria pertencia ao PSU/CSP-Conlutas e ao PSOL, e quão revelador foi para mim o fato de se negarem a discutir o assunto! Um dirigente da CSP-Conlutas em minha cidade recomendou-me deixar de me masturbar em termos ideológicos, então afastei-me dessa gente: antes só do que acompanhado de mentecaptos.

O verdadeiro estado policial em que vivemos há de se tornar cada vez mais violento a partir de agora, certamente em São Paulo e em muitos outros lugares. E a CULPA, é bem esse o nome que a coisa tem, É NOSSA!

celsolungaretti disse...

Os direitos humanos há muito deixaram de ser prioritários para essa esquerda que está aí.

Infelizmente, parecem interessar-lhe só quando é vítima de uma ditadura. Aí, corre a pedir ajuda a cardeais e juristas.

Passada a tempestade, o autoritarismo não a incomoda mais.

Uma das minhas muitas desavenças com os blogueiros amestrados foi quando precisávamos muito da Anistia Internacional na nossa luta para salvarmos o Battisti e eles só se preocupavam em desqualificá-la em função da posição que assumia com relação a "ditadores amigos".

O que nós, brasileiros, opinamos em termos de política internacional nunca mudou os rumos da dita cuja.

Já a luta pela liberdade do Cesare tínhamos condições de vencer --e acabamos mesmo vencendo, apesar da correlação de forças nos ser inteiramente desfavorável e de sermos atrapalhados pela miopia política desses companheiros "muy amigos".

Eduardo Rodrigues Vianna disse...

Escrevi errado: eu taquei lá PSU/Conlutas, quando o correto é PSTU/Conlutas.

Quanto ao mais, Celsão, se a esquerda não dá a mínima para a questão dos direitos humanos, então também não dá a mínima para a questão republicana, e para todo o assunto em torno à Democracia. Criar um falatório insuportavelmente irritante por causa de alguma piadinha idiota dos Danilo Gentili da vida é para pequenos, o negócio é questionar com todas as letras e com toda a razão a existência da PM em primeiro lugar, para vencer a batalha, e quem tinha as condições de fazer isso recusou-se a fazê-lo, pelos mais mesquinhos motivos. Tou me referindo a luta de gente grande, mas o pessoal aí prefere se mobilizar com internetaços e beijaços toda vez que o Levy Fidélix tiver a oportunidade de promover o seu cirquinho.

Tenho a impressão de que até agora não nos demos conta do que significou perder a "vaga aberta", vamos dizer assim, pela existência de alguma coisa como a PEC 51. Os ditos revolucionários ignoraram-na para não dar prestígio ao PT, na pessoa do L. Farias, figura nem um pouco simpática aos nosso olhos, mas e daí? Os assuntos da vida concreta que se vive em sociedade não deveriam ser mais relevantes que aqueles vermelhíssimos umbigos de quem quer que seja?

Quem quer que vá militar nesse meio verá que é um melhor que o outro, embora a maioria ali fuja sem muita vergonha da polícia como eu já tive a infeliz oportunidade de testemunhar, desde que eles mesmos não estejam "dirigindo a luta". Agitam, batem no peito, e saem correndo de bandeira em punho se o bicho pegar na rua. Aparecem na frente da mobilização para saírem bem nas fotos que serão postadas depois no Facebook, mas não sobrará nenhum deles se se formar o tal Caldeirão de Hamburgo: eu VI isso, não foi ninguém que me contou. Novamente quanto à PEC 51, teríamos tido todas as condições, meses atrás, de unir o melhor da juventude em torno a uma pauta muito concreta e urgente, mas preferimos perder o bonde, como sempre.

Eu vejo esses partidos da esquerda, os quatro que citei, constatando com muita clareza que se movem de um modo ou de outro conforme aquilo que lhes convém, de um modo muitas vezes fantasioso, e cabe a cada um decidir se ri, se chora ou se procura compreender a coisa com uma dose maior de boa vontade. É exatamente isso que o melhor da juventude, de luta e sempre disposta ao combate ainda que de modo francamente errado como no caso dos "black blocs", não está mais disposta a tolerar.

E, obviamente, a tática "black bloc" também não serve para nada de positivo em minha opinião. Nós precisamos é criar uma forte imprensa alternativa (assunto permanente de toda a esquerda no mundo inteiro), com todos os desafios da época, encarar de frente toda a questão republicana do Brasil de ontem e hoje, necessariamente contra as vitoriosas oligarquias, e pôr em pauta os destinos do Brasil frente às tão complexas demandas dos trabalhadores e do povo diante da sociedade atual, dita "do conhecimento".

Faremos isso tudo, mas não será amanhã, nem na semana que vem.

Jose A. de Souza Jr. disse...

Polícia militarizada é uma excrecência autoritária a ser combatida em todos os foros democráticos. Mais ainda quando se trata de polícia militar institucionalizada, como ainda é o caso da brasileira. Outra coisa a ser combatida são esses programas policiais (fascitizantes) na televisão, que só servem para glorificar essa instituição espúria ao regime democrático. Foi uma imposição do imperialismo americano no contexto da guerra fria que sobreviveu à redemocratização e acabou por se transformar no que é hoje um verdadeiro Estado paralelo.

william disse...

Vou colocar a nova proporção: Entre PMs e PCs 101 policiais MORTOS no estado de São Paulo esta ano. Vejam como estão as viúvas e órfãos. Acabem com a PM, não se poderá sair na rua. Hoje a cada 72 horas um inocente é morto em assalto no estado. Parem de Brincadeira, acordem.

celsolungaretti disse...

Puxa, William, quer dizer que o policiamento civil, que serve para todos os países civilizados, não serve para nós?

Precisamos tratar nossos conterrâneos como se fossem inimigos externos?

Somos piores do que feras? Selvagens bestiais?

Só conseguimos conter a criminalidade apelando para a lei das selvas?

Você é que tem de acordar. Tomarmos a toda hora pitos da ONU por manter um policiamento anacrônico, que extermina covardemente os bandidos rendidos e depois maquila os episódios como resistência à prisão, é um motivo de vergonha e opróbrio para o Brasil.

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