Os anos 60 foram os anos Godard. Seu cinema autoral, anárquico e irônico, foi tão curtido, discutido e imitado que poucos de nós quisemos saber dele depois.
Marcou tanto aquela época que, quando ela passou, ficou nos parecendo a quintessência do datado. Devo ter visto Pierrot Le Fou (1965) umas dez vezes, mas nenhuma delas a partir da década de 1980.
De qualquer forma, é inegável que Jean-Luc tinha enorme talento, além do mérito de haver feito a coisa certíssima na hora certa: liderou o abandono do Festival de Cannes de 1968, afirmando que o verdadeiro cinema estava sendo feito nas barricadas.
E era dado também a grandes lampejos. Num de seus filmes menos conhecidos, Masculino, Feminino (1966), Godard coloca o protagonista (Jean-Pierre Léaud), entre os muitos empregos que assume e descarta, tentando ganhar a vida como pesquisador de mercado.
Ele acaba concluindo que se trata de um jogo de cartas marcadas, nos quais entrevistador e entrevistado são cúmplices em apenas reiterar, dando-lhes aparência de respeitabilidade, os consensos que a engrenagem de comunicação impinge.
Foi o que me ocorreu ao ler sobre a recuperação do prestígio da presidente Dilma Rousseff, que despencou quando a mídia lhe foi momentaneamente adversa durante os protestos dos indignados brasileiros, mas está voltando a ter índices aceitáveis sem que nada realmente se resolvesse ou melhorasse desde então.
Nem merecia cair tanto e tão repentinamente, pois não piorou da noite para o dia e o que nela reprovavam estava mais do que evidenciado há muito tempo; nem está agora fazendo por merecer a subida, cujo verdadeiro motivo é o de que, em momentos de calmaria, os meios de comunicação, intrinsecamente favoráveis a quem detém o poder, mesmerizam os videotas.
No fundo, os consultados são apenas espelhos que refletem a imbecilização do homem pela indústria cultural. E tais pesquisas, exatamente o que Godard afirmou pela boca do seu personagem: jogos de cartas marcadas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário